Centenas de viticultores durienses são esperados nesta quarta-feira, dia 2 de julho, na manifestação no Peso da Régua convocada pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e pela Associação dos Viticultores e da Agricultura Familiar Douriense - Avadouriense, e que pretende ser uma “chamada de atenção para a grave crise instalada no Douro”. Em causa estão os excedentes de vinho nas adegas, que levam comerciantes e exportadores a anunciarem não terem condições para comprar todas as uvas aos seus fornecedores habituais na próxima vindima. Mas há uma proposta consensualizada entre a produção e comércio, no Conselho Interprofissional do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP), e que foi já apresentada ao ministro da Agricultura. Custa 14 milhões de euros e o setor aguarda pela resposta de José Manuel Fernandes. “A produção apresentou uma medida excecional, única, e especialmente aplicável este ano, que é uma variante da vindima em verde [o corte dos cachos antes da maturação, de modo a reduzir a produção total]. Na prática, os agricultores que não conseguirem vender as suas uvas para DOC Douro, podem inscrever-se para uma medida de apoio, que se propõe que seja de 375 euros a pipa. Essas uvas serão enviadas para vinificação, sob controlo do IVDP, e posterior destilação. Com isto consegue-se que, seja qual for a quantidade de dinheiro disponível, ele seja colocado diretamente no bolso do agricultor”, refere António Filipe, líder da Associação das Empresas de Vinho do Porto (AEVP). Rui Paredes, presidente da Casa do Douro, explica que a proposta foi trabalhada e consensualizada no interprofissional e que tem como contrapartida “medidas mais estruturais, que estão em cima da mesa, no sentido de ajustar a oferta e a procura”, mas remete mais pormenores para quando houver luz verde da tutela. Estes dois responsáveis e o presidente do IVDP reuniram, remotamente, com José Manuel Fernandes na passada sexta-feira à tarde e, de acordo com as projeções do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto, este apoio aos viticultores custará 14 milhões de euros aos cofres do Estado. O DN tentou, sem sucesso, obter uma resposta do Ministério sobre a situação no Douro. O presidente da Casa do Douro promete juntar-se aos manifestantes. “Não queremos andar aqui de ‘chapéu na mão’, mas precisamos que [os poderes públicos] olhem para a viticultura, que é sustento da região, porque vê-se já muito desespero e muita gente que já nem sequer está a fazer os tratamentos da vinha, o que leva ao abandono”, diz Rui Paredes. O presidente da AEVP “rejeita que a responsabilidade da situação possa ser assacada às empresas” do setor. “Há vários anos que temos vindo a alertar para todos estes problemas [de excedentes crónicos] e da necessidade de adequação da oferta à procura. Este ano, e antecipando novamente uma vindima difícil, alertamos o Ministério, a partir de fevereiro, para a necessidade de medidas específicas para a Região Demarcada do Douro, antevendo neste crise”, diz António Filipe. Que acrescenta: “Empenhamo-nos de tal forma que fizemos uma coisa inédita, que foi conseguir, em março, dos nossos associados as suas intenções de compra para a próxima vindima, algo que normal só se pede no final de junho. O objetivo era que, conhecendo-se as intenções de vendas e havendo um mecanismo de vindima em verde, os agricultores pudessem decidir o que queriam fazer. Mas, apesar de todas as insistências, nada aconteceu e agora estamos no domínio da emergência”, frisa, reconhecendo que a situação acabou por ser “muito prejudicada” pelo momento eleitoral.Questionado sobre a abertura da tutela para a proposta agora apresentada, António Filipe recusa entrar em pormenores sobre o que foi dito na reunião. “O que sabemos é que temos um ministro da Agricultura que está consciente da situação, que está preocupado e que, não tenho dúvidas, irá procurar uma solução”, sustenta.Sobre a manifestação, António Filipe diz que compreende “o desespero dos agricultores durienses”, mas reitera que a culpa não é dos exportadores. “Estamos a falar de empresas sérias e responsáveis para com os seus trabalhadores e fornecedores, mas também com os seus acionistas, e que têm negócios para gerir de forma responsável”. Das várias medidas que a Confederação Nacional da Agricultura reclama para ajudar a ultrapassar a crise no Douro, está a compra pelo Estado dos stocks excedentários das adegas cooperativas, a dotação da Casa do Douro de “capacidade legal e operacional para a estabilização de stocks”, o escoamento das uvas a “preços justos”, bem como a proibição da compra de uvas “abaixo dos custos de produção”. A confederação reclama, ainda, um aperto da malha na fiscalização na entrada de mostos e de vinhos de fora da região e o aumento do quantitativo de benefício, ou seja, que a produção autorizada de vinho do Porto cresça este ano. Entre 2023 e 2024, o quantitativo caiu em 26 mil pipas, o que significa menos 26 milhões de euros no bolso dos viticultores. E as negociações em sede de interprofissional não têm corrido bem, porque a produção reclama, pelo menos, a manutenção do benefício nas 90 mil pipas que foram autorizadas em 2024, enquanto o comércio alega que não pode ir além das 70 mil pipas. A decisão final será conhecida a 18 de julho, na próxima reunião do Conselho Interprofissional.Questionado sobre o facto de muitas destas medidas colidirem com as regras da União Europeia, Vítor Rodrigues, dirigente da CNA, diz que as regras da UE “são um bocadinho como o vento”. O importante, garante, é “não baixar os braços, ou estaremos a fazer o caminho da inevitabilidade da destruição da Região Demarcada do Douro. A CNA quer também que todos os excedentes sejam transformados em aguardente, para incorporação no vinho do Porto, reduzindo a importação de matérias-primas para a região. Vítor Rodrigues antecipa que tal medida poderia levar a um “pequeno acréscimo” no preço final de venda ao público, que estima em 1,5 a 2 euros por garrafa. Rui Paredes, da Casa do Douro também não se deixa convencer pelo argumento das regras de Bruxelas: “Temos toda a liberdade para investir na Efacec e por lá 600 milhões ou 3200 milhões na TAP, mas para o interior nunca podemos nada”..Produtores do Douro desesperam por soluções para excedentes de vinho