Crescimento das exportações de bens e serviços desacelerou de 17,4% para 4,2% no ano passado.
Crescimento das exportações de bens e serviços desacelerou de 17,4% para 4,2% no ano passado.Paulo Spranger

Alta de preços fez arrefecer a economia portuguesa em 2023 

O produto interno bruto cresceu 2,3% em 2023, impulsionado pela procura interna. Apesar disso, o consumo das famílias, o investimento e as exportações desaceleraram.
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A economia portuguesa cresceu 2,3% em 2023, confirmou ontem o Instituto Nacional de Estatística, indicando que a subida de 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB) no último trimestre, face ao anterior, permitiu ao país escapar à recessão técnica. A procura interna teve um contributo positivo para a variação anual do PIB, apesar de o ano ficar marcado pela desaceleração do consumo privado, associado à alta de preços, e do investimento. Em termos nominais, o PIB aumentou 9,7%, atingindo cerca de 266 mil milhões de euros. 

Recorde-se que, em 2022, o PIB português havia crescido 6,8%, o valor mais elevado desde 1987. E 2023 ficou-se pelos 2,3%, valor ligeiramente acima das previsões do Governo, na proposta de Orçamento do Estado para 2024, que apontava para um crescimento da economia portuguesa de 2,2% em 2023. Para o ministro das Finanças, estes números “permitem ter mais confiança de que iremos atingir, no ano de 2024, o crescimento que temos previsto, que é um crescimento de 1,5% do PIB num contexto de abrandamento significativo [da economia] na União Europeia”. Fernando Medina fala num crescimento “muito forte, o terceiro mais alto de toda a União Europeia”.

A verdade é que a procura interna desacelerou, em 2023, com o consumo das famílias a crescer 1,6%, comparativamente aos 5,6% registados no ano anterior. A despesa em bens não duradouros e serviços passou de um crescimento de 5% em 2022 para 1,1% e a componente de bens duradouros também desacelerou, de 11,7% para 7,1%.O consumo público desacelerou e ficou-se pelos 1,2%, contra 1,4% em 2022. O investimento aumentou 0,8%, que compara com os 3,5% registados no ano anterior. 

A procura externa, que em 2022 havia contribuído com 2,3 pontos percentuais para a variação anual do PIB, ficou-se por um contributo de 0,9 pontos percentuais em 2023. O crescimento das exportações de bens e serviços desacelerou de 17,4% para 4,2%, sendo que as exportações de bens em volume aumentaram 1,1% (haviam crescido 8,6% em 2022) e as exportações de serviços registaram uma “desaceleração significativa”, diz o INE, passando de um crescimento de 40,8% em 2022 para 10,6% no ano passado.

Uma performance que não surpreende José Reis, professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, para quem o crescimento do PIB, apesar de positivo e esperado, vem pôr a nu as dificuldades da economia portuguesa ao nível da distribuição de rendimentos e da necessidade de mudar o seu perfil de especialização. “Às vezes esquecemo-nos que o crescimento económico depende sempre, em grande parte, do modo como se vive no país, de como se distribuem os rendimentos e se proporciona o acesso ao bem-estar. E o consumo privado contrai-se quando essas condições são afetadas”, diz. 

“Uma economia com um perfil de especialização como a nossa nunca pode esperar notícias maravilhosas em matéria de crescimento e, sobretudo, de aceleração da procura externa e de qualidade dessa procura”, defende o também investigador do Centro de Estudos Sociais, sublinhando que exportamos bens “de fraco conteúdo nacional” e que o crescimento do turismo “não é infinito”. 

Já António Mendonça, bastonário da Ordem dos Economistas, aponta o dedo às políticas de combate à inflação. “A política monetária seguida um pouco por todo o lado, mas em particular pelo Banco Central Europeu, teve impactos negativos em termos de dinâmica económica e que são visíveis, até, ao nível do investimento”, frisa, lembrando que não é um exclusivo nacional. “A Alemanha já está em recessão, outros países estão próximos disso, e vamos ver o que se vai passar este ano. A incerteza continua a dominar e qualquer elemento ou fator que provoque uma perturbação no plano geopolítico pode ter impactos muito significativos em matéria económica. 2024 vai ser um ano em que provavelmente iremos rever as projeções anteriores relativamente ao dinamismo económico. Temos que estar preparados para isso”, defende.

Já João Neves opta por destacar que, “apesar de um contexto internacional complexo, as exportações aumentaram para um máximo de 126 mil milhões e voltámos a registar um excedente comercial de 2,3 mil milhões de euros, um feito que não conseguíamos desde 2019”. Para o ex-secretário de Estado da Economia, as contas nacionais mostram também que “mantemos o dinamismo empresarial”: o investimento (FBCF) aumentou 5,7% em 2023 (mais 2,4% em termos reais) e atingimos, uma vez mais, um novo máximo, de 51,4 mil milhões de euros, salienta.

Por fim, e no que ao mercado de trabalho diz respeito, o economista aponta que o país continua com “valores históricos” de emprego, com o INE a indicar que 2023 fechou com mais de cinco milhões de pessoas a trabalhar. Importante, também, assinala, é o aumento da produtividade para 1,4%.

ilidia.pinto@dinheirovivo.pt

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