A Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) defendeu esta quarta-feira que o Programa de Estabilidade (PE) 2022-2026 não cumpre os requisitos legais, contrariando a lei orçamental, e "surpreende" por ter sido entregue por um governo que não o ia executar.."O PE entregue à AR [Assembleia da República] não cumpre os requisitos legais e surpreende por ter sido submetido por um governo que não o iria poder executar", lê-se na apreciação da UTAO..Segundo esta análise, o documento "contraria claramente" duas normas da Lei de Enquadramento Orçamental (LEO), uma vez que omite as medidas novas de política orçamental a adotar e apresenta "somente uma projeção macroeconómica" e um cenário orçamental "assente em políticas invariantes"..O programa foi entregue na Assembleia da República no final de março..Assim, as "insuficiências substantivas" no conteúdo do programa "limitam drasticamente" o interesse nas projeções, que "nada valem" enquanto indicadores dos objetivos para as próximas propostas do Orçamento do Estado, "nem as amarram à estratégia de médio prazo para as finanças públicas"..Soma-se a isto a ausência do Quadro Plurianual das Despesas Públicas (QPDP), uma vez que, sem ele, o PE "não estabelece a restrição orçamental em contabilidade pública para a administração central, o que seria economicamente desejável e é legalmente imperativo para as contas públicas de 2022 e 2023"..Para a UTAO, estas duas limitações retiram "substância política" às projeções de saldo e despesa em contas nacionais e não comprometem o executivo com o seu cumprimento..A isto acresce a "pobreza da informação" sobre as medidas temporárias ou não recorrentes..Conforme exemplificou, os dados do relatório do Ministério das Finanças "são quase inexistentes", mas contraditórios, o que desvirtua a classificação destas medidas enquanto avaliação da posição das finanças públicas.."Finalmente, a leitura atenta do documento não permite saber se as metas deste PE contêm ou não espaço orçamental para acolher novas medidas de política que onerem o saldo ou dívida, medidas novas que o (novo) governo quererá tomar já em 2022", acrescentou..De acordo com a apreciação, só se sabe que as medidas não estão contempladas na construção do PE, o que não significa que as metas anuais para o saldo e para a dívida tenham de ser modificadas para acolher novas medidas, dúvida que "não deveria existir num verdadeiro programa plurianual de médio prazo"..A UTAO vincou que deveria ficar claro se as projeções para 2022 e 2023 pressupõem ou não a capacidade de adotar novas medidas, mesmo que contrariando outras que já estavam planeadas ou adotadas..Perante isto, o cenário orçamental do PE "pouco mais é do que um exercício de ficção em folha de cálculo sobre a restrição orçamental pública para 2022 e os quatro anos seguintes"..Relativamente à redução da dívida pública, antecipada pelo Governo, a UTAO sublinhou que enfrenta "riscos descendentes consideráveis", num contexto pós pandémico, que ainda não foi superado, agravado pela incerteza gerada pela guerra na Ucrânia e a consequente crise energética.."As pressões inflacionistas e salariais pré-existentes e a resposta da política monetária a nível europeu serão outra condicionante da recuperação económica", apontou..O plano refere que Portugal deve apresentar, a partir de 2024, um rácio de dívida pública inferior ao de Espanha, França e Bélgica, misturando "projeções não comparáveis"..O PE para 2022-2026 prevê uma redução gradual do défice das contas públicas até final do horizonte da projeção, apontando para um excedente de 0,1% em 2026..A atualização dos indicadores macroeconómicos que constam do PE 2022-2026 foi avançada, em 25 de março, pelo então ministro as Finanças, João Leão, numa conferência de imprensa em Lisboa.