Rescisão da TAP com Alexandra Reis vai custar 725 mil euros à conta da tributação autónoma
Empresa pública justifica legalidade do valor pela antiguidade e quebra antecipada dos contratos. Secretária de Estado do Tesouro, que se demitiu na terça-feira à noite, chegou a pedir 1,47 milhões.
Afinal a indemnização de meio milhão de euros que a TAP pagou Alexandra Reis - secretária de Estado do Tesouro que na noite de terça-feira foi convidada a pedir a demissão -, para sair antecipadamente da companhia aérea, a 28 de fevereiro deste ano, vai custar 725 mil euros, ou seja, mais 225 mil euros, uma vez que a empresa pública está obrigada a pagar tributação autónoma, em sede de IRC, sobre aquela compensação, revela o advogado especialista em Direito Fiscal, Fernando Castro Silva.a
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"Tratando-se de indemnização de gestor pela cessação da sua relação profissional, a TAP está obrigada a pagar tributação autónoma sobre a referida indemnização a qual corresponde a 45% do valor pago", esclarece o jurista, sócio da Garrigues, uma empresa internacional de serviços jurídicos e fiscais. O DN / Dinheiro Vivo confirmou a informação. Segundo os n.º 13 e 14 do artigo 88.º do Código do IRC, são tributados "à taxa de 35% os gastos ou encargos relativos a indemnizações ou quaisquer compensações devidas não relacionadas com a concretização de objetivos de produtividade previamente definidos na relação contratual, quando se verifique a cessação de funções de gestor, administrador ou gerente". No ponto seguinte, a legislação refere que as taxas previstas são agravadas em 10 pontos percentuais, o que eleva o imposto para 45%, quando as empresas apresentem prejuízo fiscal, como é o caso da TAP.
Assim, a fatura vai ser mais pesada do que os 500 mil euros, mas poderia ainda ser pior se a companhia aérea, liderada por Christine Ourmières-Widener, respondesse às exigências de Alexandra Reis. Numa resposta que a transportadora aérea enviou esta terça-feira aos ministérios das Finanças e das Infraestruturas para esclarecer a legalidade do valor da indemnização, é revelado que a ex-gestora chegou a pedir uma compensação de 1,47 milhões de euros, quase o triplo do acordado. "Como contrapartida pela cessação de todas relações contratuais, e não obstante a pretensão inicial de Alexandra Reis se cifrar em 1 479 250 euros, foi possível reduzir e acordar um valor global agregado ilíquido de 500 mil euros a pagar a Alexandra Reis", lê-se no comunicado da TAP divulgado esta terça-feira pelo governo.
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Do meio milhão a pagar a Alexandra Reis, 56 mil euros "correspondem especificamente à compensação pela cessação do contrato de trabalho sem termo", uma vez que a ex-gestora ingressou na TAP a 1 de setembro de 2017, ao abrigo de um contrato de trabalho sem termo, que foi suspenso por ter sido nomeada para o conselho de administração, em setembro 2020 pelo acionista privado, David Pedrosa, para um período de três meses, e posteriormente pelo anterior governo de António Costa para um mandato de quatro anos, entre 2021 e 2024. A companhia esclarece que a contagem do tempo de serviço não ficou congelada, continuando a contar para efeitos de antiguidade.
Outra das parcelas do meio milhão de euros diz respeito a 443 500 euros como "contrapartida pela cessação antecipada dos contratos de mandatos referentes às funções de administração", explica a TAP. A companhia detalha ainda que dos 443 500 euros, 107 500 euros são referentes a remunerações vencidas reclamadas, correspondentes a férias não gozadas, e 336 mil euros são relativas a remunerações que ainda não se venceram e que correspondem a um ano de salário base, considerando a retribuição bruta sem cortes decorrentes dos acordos de emergência ou outras deduções. A TAP chama a atenção que este valor relativo a um ano de salários em que Alexandra Reis não teve de trabalhar, por ter aceitado renunciar ao cargo de administradora, é "inferior à retribuição base anual" da ex-gestora (350 mil euros).
A TAP esclarece ainda que o vínculo laboral assim como a rescisão contratual estão fora do regime do Estatuto do Gestor Público pelo que não se aplicam as limitações de ordenado, que deve ser inferior ao do primeiro-ministro (5792 euros), e de compensações por demissão por conveniência (máximo de 12 meses de salário). Recorde-se que Alexandra Reis estava a ganhar 17 500 euros por mês, já depois do corte de 30% devido ao processo de reestruturação.
Também foram desfeitas as dúvidas sobre quem deu o primeiro passo para quebrar os contratos. A TAP revelou que foi por iniciativa da companhia que se iniciou "o processo negocial com Alexandra Reis, no sentido de ser consensualizada por acordo a cessação imediata de todos os vínculos contratuais existentes". Ou seja, a ex-gestora de facto apresentou a renúncia, tal como indica o comunicado da transportadora enviado à CMVM em fevereiro, mas tal aconteceu fruto de um convite da TAP à saída de Alexandra Reis. O governo vai agora enviar todos "os esclarecimentos prestados pela TAP à Inspeção-Geral de Finanças e à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários para avaliação de todos os factos que tenham relevância", lê-se no mesmo comunicado.
Envolta em polémica, a secretária de Estado do Tesouro terá pedido escusa no dossiê TAP, já que foi o ministro das Finanças, segundo a CNN Portugal, a assinar o despacho que autoriza a injeção de 980 milhões de euros na companhia, o último cheque dos 3,2 mil milhões atribuídos pelo Estado, no âmbito do plano de reestruturação.
Salomé Pinto é jornalista do Dinheiro Vivo