OCDE culpa estivadores de Setúbal de atrasarem a economia portuguesa
Os protestos dos trabalhadores precários do porto de Setúbal, que ocorreram na reta final do ano passado, prejudicaram significativamente a exportação de automóveis e isso teve um impacto negativo no crescimento do país, refere a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), no estudo sobre Portugal incluído no novo panorama sobre as economias desenvolvidas, divulgado ontem.
No mesmo documento, a OCDE observa que outros problemas persistem no setor portuário, como contratos de concessão a operadores privados demasiado longos no tempo, o que pode condicionar seriamente a atividade das empresas portuguesas e, ato contínuo, limitar o crescimento económico do país como um todo.
Segundo a organização liderada por Angel Gurría, a expansão das exportações portuguesas, o motor do crescimento nos últimos anos, deverá registar o pior momento da última década (desde 2009, quando cederam 10%), avançando uns meros 2,4% neste ano (há seis meses, a OCDE previa uma expansão de 4,3% nas vendas nacionais ao exterior).
Portanto, com o andamento das exportações a cair para quase metade do previsto em novembro de 2018, o crescimento da economia teve de ser revisto em baixa, de 2,1% para 1,8%. Em todo o caso, está em linha com a nova previsão do governo no Programa de Estabilidade (1,9%).
A OCDE diz primeiro que "o crescimento das exportações deverá desacelerar em consequência do abrandamento da atividade económica nos principais parceiros comerciais de Portugal", como Espanha e Alemanha (esta quase estagna). Mas logo de seguida identifica problemas internos que atrapalham o comércio externo português. "O crescimento das exportações abrandou no final de 2018, e tal foi, em parte, reflexo das ações sindicais levadas a cabo no porto de Setúbal, em novembro e dezembro, que restringiram temporariamente as exportações de automóveis", atira a OCDE.
E os riscos que pendem sobre a atividade futura continuam. "No setor portuário, os contratos de concessão que conferem direitos de exclusividade podem ser adjudicados a operadores privados prestadores de serviços portuários." No entanto, sublinha a OCDE, "a duração destes contratos é frequentemente excessiva, o que reduz o potencial de entrada de novos concorrentes no mercado com capacidade para prestar serviços de maior qualidade às empresas portuguesas", critica a mesma organização.
Estas observações da OCDE surgem na véspera de mais uma reunião entre o Sindicato dos Estivadores e Atividade Logística (SEAL) e os operadores portuários de Setúbal, para chegar a um acordo de contrato coletivo de trabalho que aumente os salários e garanta a integração efetiva dos precários que ainda subsistem.
Na crise que paralisou o porto de Setúbal em novembro e dezembro e que bloqueou as exportações de veículos da Autoeuropa, o SEAL contabilizou a existência de cerca de 90 estivadores em situação laboral precária.
Depois, numa primeira tentativa de alcançar a "paz social", em dezembro último, alguns trabalhadores (cerca de 40) terão sido integrados, mas previa-se a passagem de mais 56 precários para os quadros e o "levantamento de todas as formas de luta, incluindo a greve ao trabalho extraordinário, bem como a negociação e aprovação de um contrato coletivo".
O acordo para a criação do contrato coletivo deveria ter ficado fechado no final de fevereiro, 75 dias depois do acordo para integração imediata dos referidos 56 trabalhadores nos quadros. Até hoje, não houve avanços, e a situação continua por sanar.
As partes reúnem-se nesta quarta-feira no escritório de advogados Macedo Vitorino & Associados, em Lisboa.