Não trabalhávamos tanto há mais de uma década. Salários já estão a travar

Com o emprego a bater recordes, está também em máximos o número daqueles que acumulam mais do que um trabalho. Horas trabalhadas já recuperaram e a folga de quem ainda se pode juntar ao mercado de trabalho esvaziou para o ponto mais baixo de que há registo. Apesar disso, a subida de salários está a abrandar.
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O mercado de trabalho encontra no arranque deste ano os melhores indicadores de participação em mais de uma década e desde que o país atravessou a crise das dívidas soberanas. Nunca houve tantos a trabalhar, e tanto, com os segundos empregos a dispararem para um máximo de sempre e as semanas de trabalho a alongarem-se novamente após os cortes de horários trazidos pela pandemia.

Mas o mercado está também a esgotar a mão-de-obra disponível. Em tese, seria razão para um impulso maior nos salários, que não está a acontecer, segundo indicam os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), divulgados esta semana.

A média salarial total dos trabalhadores por conta de outrem chegou ao final do primeiro trimestre nos 1258 euros brutos mensais, numa subida de 2,2% face ao mesmo período do ano passado e num ritmo que estagna face à dinâmica registada em dezembro de 2021, ficando abaixo do crescimento que se registava nos restantes meses de 2021. Esta evolução representa já uma perda de poder de compra de 2% face à subida da inflação, nos cálculos do INE.

A perda real de salário é, no entanto, maior quando se considera apenas os salários sem subsídios de férias e de Natal. Sem estes, a média salarial limitou-se a crescer 1,7%, para ficar em 1127 euros brutos. Em termos reais, calcula o INE, o salário médio ficou a valer menos 2,5% do que há um ano devido à subida de preços.

Os 1,7% de crescimento representam um desacelerar face aos 2,3% de subida de dezembro e também relativamente às restantes variações observadas ao longo do último ano. Em março de 2021, a média salarial crescia 3,8%, ainda que em parte influenciada pela perda de emprego ocorrida entre os salários mais baixos nos piores momentos da pandemia.

Se a evolução salarial moderou a velocidade, a inflação acelerou, com crescentes reivindicações de maiores aumentos, nomeadamente, entre as forças sindicais. Mas o próprio mercado de trabalho sugeriria maiores impulsos nas remunerações.

O INE estima que estivessem no emprego no primeiro trimestre mais de 4,9 milhões de pessoas. É o nível mais elevado desde 2011, quando arranca a atual série estatística sobre mercado de trabalho.

Noutro indicador, assiste-se hoje também a um número recorde daqueles que acumulam mais de um emprego. Seriam no primeiro trimestre 254,3 mil os trabalhadores com uma atividade secundária. São mais 47,8 mil do que há um ano, ou mais 23%, numa tendência que reflete a acumulação de empregos no setor de serviços e que abrange um número ligeiramente superior de homens (52%).

As semanas de trabalho, entretanto, já recuperam da pandemia. Atingiam no primeiro trimestre uma média de 37 horas entre os trabalhadores a tempo completo. São mais três horas semanais do que um ano antes, quando o país atravessava uma nova vaga de covid-19, com cortes de horários laborais e aumento do absentismo.

As 37 horas semanais de trabalho estimadas pelo INE estão já ao nível da duração de horários registada em final de 2019, mas ainda abaixo dos máximos ocorridos em 2011 e 2012, com 40 horas semanais de trabalho apuradas. Os dados mostram ainda que as semanas são mais longas para os homens, com uma média de 38 horas de trabalho (35 horas semanais entre as mulheres).

Mas, do lado de quem ainda procura emprego, há também cada vez menos pessoas. A folga de disponíveis para o mercado de trabalho, a chamada subutilização do trabalho, tem vindo a esvaziar-se com a recuperação dos períodos agudos da pandemia e está agora ao nível mais baixo de mais de uma década.

Havia, no primeiro trimestre, apenas 618,2 mil trabalhadores ou potenciais trabalhadores subutilizados, representando 11,5% da população ativa alargada.

Menos de metade desta folga é composta por desempregados que mantêm a procura ativa de emprego. Ao certo, apenas 308,4 mil pessoas, num trimestre em que a taxa de desemprego voltou a recuar para ficar em 5,9%, aqui num mínimo não observado desde o arranque deste século.

Naqueles que ainda podem dar mais horas à economia, contam-se também os trabalhadores a tempo parcial à procura de horário completo. Eram 144 mil no primeiro trimestre, segundo os dados.

Há ainda a bolsa de temporariamente indisponíveis ou desencorajados da procura de emprego. O INE estimou no primeiro trimestre 137,4 mil indivíduos disponíveis para o trabalho, mas sem diligências ativas nas semanas anteriores à recolha dos dados. Além destes, havia ainda 28,3 mil indivíduos à procura de emprego mas não imediatamente disponíveis para começar a trabalhar. Por exemplo, por motivo de doença.

Na comparação com outros países da União Europeia, embora ainda com dados de 2021, o Eurostat mostrou também nesta semana que Portugal surge como um dos 27 com as menores folgas disponíveis para alimentar a procura por trabalhadores, abaixo da média europeia. Os 12,6% de taxa de subutilização nacional do trabalho medidos então comparam com uma média de 14% na UE e de 15,6% na zona euro.

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