Mercado de consumidores seniores cresce e é oportunidade para novos negócios
A chamada "silver economy", dos maiores de 55 anos, valerá, já em 2025, 5,7 biliões de euros na Europa. Portugal precisa de acelerar para não perder o comboio e apostar mais neste segmento de elevado potencial de crescimento. Conheça algumas empresas que foram criadas a pensar nas necessidades dos mais velhos.
Em 2020, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou os anos compreendidos entre 2021 a 2030 como a década do envelhecimento saudável, mostrando um claro sinal de que os países deverão preparar-se para os desafios que a longevidade acarreta, como seja manter a qualidade de vida. A Organização Mundial da Saúde (OMS) projeta que, em 2050, a população mundial com mais de 60 anos ultrapasse os dois mil milhões de pessoas e que, na Europa, mais de um terço da população estimada para essa data tenha mais de 65 anos. Portugal é um dos países mais envelhecidos da Europa, tendo atualmente cerca de quatro milhões de pessoas com idade igual ou superior a 55 anos. Esta é, pois, a faixa etária considerada para avaliar a chamada "silver economy", ou seja, o mercado de bens e serviços destinados a pessoas sénior.
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Segundo um estudo realizado pela Technopolis Group e a Oxford Economics para a Comissão Europeia - feito em 2018, mas que continua a ser o mais recente - as estimativas apontavam para que, em 2025, este setor pese na economia, só na Europa, qualquer coisa como 5,7 biliões de euros. E grandes desafios representam boas oportunidades de negócio: novos serviços surgirão e com eles novas funções e profissões. Idosos ativos são consumidores de, para além dos tradicionais produtos, vários tipos de viagens, produtos e serviços de tecnologia para o cuidado geriátrico, novas soluções terapêuticas integradas, consultoria e requalificação de competências, entre muitos outros.
Por tudo isto, além das grandes empresas, como as farmacêuticas, que já procuram há anos soluções integradas para o mercado da longevidade, começam agora surgir inúmeras startups destinadas a esta franja da população, com negócios que ultrapassam as soluções meramente sociais, nomeadamente na transformação digital. Em Portugal existem já bons exemplos.
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Ageless Portugal focada em maiores de 55 anos
Mónica Póvoas, fundadora da Ageless Portugal, foi aprofundando a consciência de que o mercado dos maiores de 55 está em crescimento e necessita de investimento direcionado. Decidiu então transformar o seu conhecimento num negócio real, criando a empresa que disponibiliza ao mercado um conjunto de serviços e produtos especializados para pessoas desta faixa etária, tendo como principal meta o envelhecimento saudável, mais ativo e mais inclusivo.
"A Ageless Portugal, enquanto agência de comunicação, marketing e eventos focada nas pessoas com 55 ou mais anos tem trabalhado em projetos que pretendem conhecer melhor este mercado e, assim, ajudar a traçar um perfil do comportamento do seu consumidor", afirma esta responsável.
A empresa define-se como promotora de mudança de comportamentos e atitudes, procurando quebrar estereótipos idadistas (envelhecimento associado a ideias negativas como doença, exclusão, etc.) e atua em áreas como a aceleração de projetos de empreendedorismo, consultoria, apoio ao investimento e apoio personalizado.
"Portugal ocupa a 8.ª posição enquanto país europeu com menor qualidade de vida para os seus idosos, ranking este liderado pela Suíça, Noruega, Suécia e Alemanha. No entanto, o país já vai tendo algumas iniciativas que demonstram preocupação com as suas necessidades", diz. Mónica Póvoas afirma ainda que as marcas estão mais conscientes de que este é um público enorme e lucrativo, e por isso estão a captar cada vez mais a sua atenção devido à sua capacidade de adaptação às novas tecnologias.
Por outro lado, refere que a população ao aproximar-se dos 50 anos deparar-se com dificuldades de crescimento profissional ou requalificação. "Nas organizações, quem abrir oportunidades de atração e retenção, assim como desenvolver novas estratégias de reskilling e upskilling continuará a contar com uma mão-de-obra produtiva, motivada e capaz de contribuir para a inovação nos negócios".
É precisamente para atuar neste nicho específico do mercado que Jorge Fonseca fundou, em 2015, em parceria com um grupo de formação, a George - Executive Advisor, consultora especializada em mudança de carreiras, sobretudo para o público que, perto dos 50 anos, enfrenta dificuldades profissionais e pretende mudar de vida
"Se há áreas em que os cabelos brancos são muitos valorizados é na consultoria, como a jurídica, por exemplo. Em outras áreas, em que a idade é menos valorizada, há que trabalhar bem o currículo, apostar no percurso da pessoa para conseguir «vender» o profissional da melhor forma, ou apoiar na sua requalificação".
Este responsável, depois de 20 anos ligado ao setor do recrutamento profissional, tem conhecimento aprofundado do mercado e sabe quais as áreas em que os candidatos seniores podem ou não apostar. Cerca de 90% dos seus clientes são particulares que procuram um realinhamento profissional, sendo que a maior parte está empregada, porém insatisfeita. "Tento direcionar os meus clientes para negócios em crescimento", explica.
Atualmente Jorge Fonseca é o único acionista da empresa, e acredita que esta é uma atividade com futuro, pois, não é fácil conseguir sem apoio, nesta fase mais madura da vida, uma viragem de carreira.
Humanamente para apoiar a mente humana
Foi também a pensar na silver economy, ainda que numa vertente mais social do que puramente económica, que Patrícia Paquete avançou, há dez anos, com a criação da empresa Humanamente. Terapeuta ocupacional, licenciada em Alcoitão, e com doutoramento na Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa, que incidiu no bem-estar de pessoas com demência, apercebeu-se da falta de soluções para este tipo de público. Criou assim, em parceria com duas sócias, o seu próprio emprego.
"A Humanamente surgiu porque conhecia bem o mercado e tinha consciência de que havia um problema que não estava a ter resposta social", afirma a responsável da empresa que, em 2014, recebeu um prémio de empreendedorismo. Constituída com fundos próprios, materializa-se através de um site no qual é possível adquirir serviços e produtos que apoiam o idoso, sobretudo numa fase de demência. Na loja virtual o cliente, o próprio ou o cuidador, pode comprar e-books com jogos e passatempos, puzzles e jogos para estímulo mental e sensorial.
Por outro lado, as instituições, como lares, residências e outras, podem ainda comprar os serviços associados, como a formação mais especifica para este público.
"O que nos diferencia no mercado é que ajudamos a combater o idadismo. O meu objetivo é mudar mentalidades, mudar a forma como se prestam cuidados a estas pessoas, promovendo o bem-estar. Aos poucos vou colocando a semente daquilo que são as boas práticas", refere Patrícia Paquete.
A formação em posto de trabalho, dada nas próprias instituições, sobretudo nas IPSS, é atualmente a maior fatia deste negócio, e curiosamente, foi em plena pandemia que registou a maior faturação, o que prova que nesta fase houve maior preocupação com os mais velhos.
Quer a Sioslife quer a Actif são duas empresas que apostam sobretudo nas novas tecnologias para apoiar o público idoso. A Sioslife, fundada por Jorge Oliveira, CEO, e Fábio Macedo, ambos engenheiros informáticos, chegou ao mercado há cerca de oito anos, tendo começado como um projeto de investigação universitário. Oferece soluções tecnológicas para a população mais envelhecida, combatendo a solidão e a falta de socialização.
"Começámos por visitar instituições e percebemos que havia entre os mais velhos um sentimento de exclusão social. Assim decidimos desenvolver sistemas interativos user-friendly, materializados em computadores para lares e centros de dia, com hardware e software adaptados, focados em interfaces naturais", explica Jorge Oliveira.
Atualmente, a Sioslife, além de facilitar a comunicação e a socialização, tem ainda uma vertente de saúde mental, com estimulação cognitiva, musicoterapia, e uma vertente de saúde física, com sensor de movimentos.
A Sioslife disponibiliza dois tipos de tablets, um mais direcionado para instituições de acolhimento e outro mais direcionado para casa, e ainda ferramentas de apoio de backoffice, quer através de aplicações móveis, destinadas quer aos cuidadores formais quer aos informais, para fazer toda a gestão do dia a dia.
O modelo de negócio passa por parcerias com entidades que prestam serviços de apoio, e já está presente em cerca de 500 instituições, alcançando cerca de cinco mil utentes. O próximo passo para a Sioslife, que está prestes a recolher uma nova ronda de investimento, é acelerar a sua internacionalização, sendo que já está presente em mais de uma dezena de instituições em Espanha.
Atividade física precisa-se
"A Actif surgiu pela necessidade de colocar as pessoas mais velhas a fazer mais exercício. Identificámos inúmeras lacunas nos lares e centros de dia que não têm capacidade de implementar estimulação suficiente, bem como nas pessoas que estão em casa", explica Sara Gonçalves, CEO e cofundadora. A ideia da startup surgiu em 2020, em plena pandemia, e consiste numa plataforma web, que tem vídeos de atividades físicas e cognitivas, que se dividem em várias áreas, como ioga, tai-chi, fitness, estimulação cognitiva, entre outras. Esta plataforma é compatível com vários equipamentos, seja o smartphone, o tablet, a smart TV, ou qualquer outro com acesso à internet.
"Recolhemos dados clínicos das pessoas e os seus interesses para assim podermos sugerir um plano semanal que vá de encontro ao que o utilizador necessita", explica Sara Gonçalves.
A empresa, que já tem uma equipa de dez pessoas, está incubada na Casa do Impacto e vai receber brevemente uma ronda de investimento. A Actif tem entre os seus clientes o grupo José de Mello e a Misericórdia do Porto e pretende chegar brevemente a 50 instituições nacionais. Além disso, está também a iniciar os primeiros contactos internacionais.
Apesar de não estar ainda em comercialização para a comunidade em geral, a plataforma está aberta a quem quiser experimentar de forma gratuita, que passará depois a um modelo de subscrição, como já tem, aliás, para as instituições. "Costumamos dizer que somos uma espécie Netflix saudável", brinca a responsável.
dinheirovivo@dinheirovivo.pt
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