Medidas do governo para a habitação são "insuficientes" para as necessidades do país

Associações ligadas ao setor lembram que a resolução do problema habitacional tem que envolver o setor privado. E defendem que os impostos têm de baixar para os proprietários e para as empresas de construção

O novo governo liderado por António Costa deverá tomar posse a 23 de fevereiro, depois de ter garantido a maioria absoluta nas eleições legislativas, e pôr então em marcha as políticas que desenhou para a habitação. Nesta matéria, o programa eleitoral do PS não difere das medidas que foram sendo apresentadas pelo atual executivo, centradas na resolução dos problemas habitacionais das famílias portuguesas mais carenciadas, na criação de um parque público para arrendamento a custos acessíveis e no estabelecimento de condições que permitam a acessibilidade dos jovens a uma casa. Os agentes do setor reconhecem a importância de se implementar essas diretrizes, mas não têm dúvidas em considerar que são "insuficientes". E lembram que a solução para a falta de casas no país, a que se soma a escalada de preços, que impede grande parte das famílias de resolver os seus problemas habitacionais, não pode ficar só na esfera pública, tem de integrar o setor privado.

"O diagnóstico e as prioridades das políticas públicas direcionadas para a habitação que estão inscritas no PRR [Plano de Recuperação e Resiliência] e agora reafirmadas no Programa Eleitoral do PS são acertadas e as verbas consagradas são importantes", mas "são claramente insuficientes para responder à necessidade de requalificar um parque habitacional muito degradado", sublinha Manuel Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN). Na sua opinião, a habitação não pode ser vista apenas da perspetiva da oferta pública de cariz social e, nesse sentido, "é essencial introduzir mecanismos de incentivo ao investimento privado", nomeadamente para a criação de "um verdadeiro mercado de arrendamento", que não estão contemplados no programa eleitoral do PS. Para o presidente da AICCOPN, "o apoio ao arrendamento acessível, tal como está atualmente enunciado, está orientado sobretudo para o investimento público, e defendemos, a exemplo do que se passa na generalidade da Europa, a criação de instrumentos que envolvam os privados" nessas soluções.

Já Francisco Bacelar, presidente da Associação dos Mediadores do Imobiliário de Portugal (ASMIP), defende que o próximo governo deveria priorizar a redução do IVA na construção "de 23% para 13%, ou, se possível, para os 6%, quando fossem construídas habitações novas, em determinadas condições como, por exemplo, limitação de preços", potenciando assim um reforço da oferta no mercado e, por essa via, a redução dos preços. O responsável associativo defende que essa medida permitiria "alargar o leque de famílias com potencial para adquirir casa em condições que agora não existem" e sem hipotecar "o seu futuro, perante uma previsível subida das taxas de juro".

Reis Campos também aponta o dedo ao Estado em matéria de impostos, considerando que o investimento privado carece de um quadro de estabilidade e competitividade. No contexto, defende a aplicação da taxa reduzida de IVA de 6% de forma generalizada à construção de habitação e revisões fiscais do IMI e do AIMI, mas também lembra a necessidade de dinamizar parcerias com os privados para o desenvolvimento de projetos de habitação de renda acessível e a redução da burocracia associada ao licenciamento. A solução para o problema da habitação necessita de "uma visão global" que permita garantir "um volume de investimento mais significativo e alinhado com as necessidades identificadas" no país, sublinha.

O presidente da ASMIP chama ainda a atenção para a classe média, um pouco esquecida no programa para a habitação do PS. Como frisa, esse segmento populacional "não será particularmente beneficiado, nomeadamente ao nível dos impostos". O problema começa logo no momento da aquisição de casa com o pagamento do IMT, a que se soma anualmente o IMI. "Aos preços a que as habitações estão, o IMI pode constituir uma verdadeira renda para boa parte das famílias. Mesmo com a taxa mínima, um imóvel avaliado em 200 mil euros, no Porto, suporta um IMI de 54€euros mensais", aponta.

Também Paulo Caiado, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), lembra a necessidade de dinamizar o mercado de arrendamento para as famílias da classe média, sendo que o programa de rendas acessíveis do PS é "um primeiro passo", mas "que ainda se afigura aquém das necessidades atuais".

Paulo Caiado lembra a necessidade "muito urgente da publicação da legislação base do setor", que contempla maiores responsabilidades para as empresas de mediação, e um maior escrutínio e preparação de todos os seus operadores. São "medidas que, numa altura em que cada vez mais as mediadoras constatam grande aumento do recurso aos seus serviços, terão grande impacto na segurança e transparência" dos negócios.

Apesar de identificarem um conjunto de lacunas no programa do PS no que toca à habitação, estes três agentes do setor reúnem-se a uma só voz na defesa do que está já previsto implementar até 2026. A disponibilização, através das verbas do PRR, de 26 mil fogos para responder às situações de maior carência habitacional, e 6800 fogos a custo acessível é aplaudida por todos.

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