Leão sobre Novo Banco. "Estamos a dar sinal de que não vamos honrar, é como um cheque careca"
A norma do Bloco de Esquerda, aprovada com a abstenção do PSD, que impede o Orçamento de Estado de 2021 (OE2021) de acautelar uma verba de 476 milhões de euros para injetar no Novo Banco que "decorre de um contrato já assinado" pelo Estado é algo que "acontece pela primeira vez" na História dos orçamentos modernos de Portugal, acusa o ministro das Finanças.
"Estamos a dar o sinal de que não vamos honrar o contrato, é como passar um cheque careca", atirou João Leão, em entrevista à RTP1, esta sexta-feira.
O ministro fez questão de salientar que essa decisão do Parlamento, na reta final das votações do novo OE2021, causou alguma surpresa nos meios internacionais.
O ministro recordou que o seu primeiro-ministro, António Costa, ligou logo à presidente do Banco Central Europeu (BCE) para assegurar que tudo vai ser cumprido como prevê o contrato entre o Estado, o Fundo de Resolução e o fundo privado Lone Star (que é o principal dono dos restos do antigo BES).
Mas fez questão de contas que "recebemos contactos da imprensa internacional" a perguntar o que se estava a passar.
Na mesma entrevista, a resposta de Leão é que o Estado "é uma pessoa de bem" e por isso "estamos a estudar diferentes alternativas".
Uma delas, já se sabe, é pedir a fiscalização ao Tribunal Constitucional (TC) da referida norma aprovada pelo Parlamento pois é convicção do governo que aquilo que o Parlamento aprovou "viola a Constituição e a Lei de Enquadramento Orçamental".
"Ainda não fizemos esse pedido ao TC", disse o ministro, mas recordou logo de seguida que "é a primeira vez" que um orçamento é aprovado sem que lá esteja a verba para que o Estado possa cumprir os contratos já assinados.
"A lei diz que o Estado deve inscrever a verba prevista para honrar compromissos de despesa assumidos".
Ao não fazê-lo, "estamos a dar o sinal claro de que não vamos honrar esses compromissos, é como passar um cheque careca", acusou ex-secretário de Estado do Orçamento de Mário Centeno (hoje governador do Banco de Portugal).
Leão disse inclusive que uma coisa era aprovar uma norma em que se colocaria lá a verba na mesma, mas condicionada às auditorias e ao cumprimento das regras por parte do NB. Mas, acusou o ministro, não foi isso que foi aprovado. O dinheiro não está lá, pura e simplesmente.
Leão insistiria depois no fantasma da opinião internacional (os jornais que ligaram para saber mais sobre este "percalço", como lhe chamou António Ramalho, o CEO do NB) para atacar novamente o partido de Rui Rio.
"O PSD aliou-se às propostas mais radicais do Bloco de Estada para criar instabilidade", declarou João Leão.
Em todo o caso, a única via para tentar deitar abaixo a norma do BE não é só a constitucional. O ministro revelou que o governo está a avaliar outras formas de superar o problema.
"Tentaremos com razoabilidade resolver o problema", podendo rever o OE e ver em que medida" se pode acautelar lá a verba necessária.
Nesse aspeto, o governo e o PS podem estar secretamente mais sossegados. Rui Rio já disse que não vai obstruir um retificativo para meter mais 476 milhões de euros no Novo Banco se ficar claro que o banco passou na auditoria.
Em termos contratuais, o Novo Banco, se se provar pelo fecho das contas de 2019 que vai precisar de mais aquele dinheiro dos contribuintes, deve requerer essa injeção "lá para maio", disse Rui Rio.
Para João Leão, "não há nenhuma evidência explícita de que o NB esteja a não cumprir as regras e o que foi acordado", mas declarou que "temos de ser muito exigentes com os critérios para aplicar esse dinheiro" e de ser "exigentes nessa avaliação".
Sobre as muitas medidas aprovadas de alteração à proposta inicial do governo de OE2021, Leão desdramatizou o impacto.
"O OE inicial já tinha uma margem para medidas de alteração" até porque "somos um governo de minoria".
"Estamos a fazer avaliação final" do que foi aprovado, mas o ministro calcula que o adicional ronde "algumas centenas de milhões de euros, sendo que parte desse custo adicional "já estava previsto na meta inicial" do défice de 2021, cerca de 4,3% do produto interno bruto (PIB).
Para João Leão, o desvio face a essa meta "não será significativo" e será "seguramente menos de 5%", "menos mil milhões de euros".