João Baptista Borges: "Energia solar beneficiará 1,2 milhões de famílias"
Investimento de mais de 540 milhões de euros em sete centrais solares vai permitir "eliminar o consumo de 1,4 milhões de litros de gasóleo por dia", afirma o ministro angolano da Energia e Águas.
A Sun Africa, empresa norte-americana de energia, lança hoje, 11 de março, aquele a que afiança ser o maior projeto fotovoltaico de baterias na África Subsariana. Através de sete projetos, vai implementar uma capacidade total de 370 MW em três províncias de Angola: Lunda Norte, Lunda Sul e Moxico. Um investimento superior a 546 milhões de euros que vai levar eletricidade a populações sem acesso a esta energia. No projeto vai trabalhar a empresa portuguesa MCA, como construtora líder, e vários financiadores: Swedish Export Credit Corporation (Suécia), K-Sure (Coreia do Sul) e DBSA (África do Sul). O sindicato bancário é liderado pelo banco europeu ING. O ministro da Energia e Águas de Angola aceitou falar ao DN sobre economia e o impacto deste investimento.

João Batista Borges
Trata-se do maior investimento de sempre em fotovoltaico, em Angola?
Efetivamente. Este investimento marca uma aposta na exploração de um recurso abundante e cada vez mais barato, que é o sol, recordando que Angola tem um elevado potencial de recurso solar, com uma radiação global em plano horizontal anual média compreendida entre 1370 e 2100 kWh/m2/ano.
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Com base nesse recurso, o Atlas e Estratégia Nacional para as Energias Renováveis de Angola previu a possibilidade de instalação de uma capacidade de produção em parques solares de 55 000 MW, dez vezes mais toda a capacidade de produção atualmente instalada no país, usando todas as fontes. Os sete projetos em lançamento pretendem não só alcançar maior predominância de fontes renováveis na matriz energética nacional, que é atualmente de 60%, como também reduzir custos com a produção térmica nas áreas do leste do país, com base na hibridização da a produção a instalar, combinando o solar com o térmico a diesel. Este investimento pretende impulsionar a participação privada no financiamento de projetos renováveis. Uma aposta forte do executivo angolano nas novas energias renováveis, num momento de forte contração na economia nacional, por força da redução do preço do petróleo.
As sete centrais vão produzir 370 MW. Essa energia chegará a quantas pessoas?
O projeto é um grande ganho para o país, com impacto direto no de- senvolvimento económico, social e ambiental de pelo menos seis regiões: Benguela (municípios da Baia Farta 96^703 MWdc e Biopio 188 877 MWdc), Huambo (Bailundo 17 9992 MWdc), Bié (Cuito 15 652 MWdc), Moxico (Luena 29 906 MWdc), Lunda Norte (Lucapa 8192 MWdc) e Lunda Sul (Saurimo 26 906 MWdc). Sendo regiões extremamente povoadas, a nossa estimativa é que essa energia beneficiará cerca de 1,2 milhões de famílias. Promovendo o acesso à uma eletricidade limpa e barata, além de reduzir os gastos da população e dos órgãos de administração pública local na utilização de pequenos e grandes geradores a gasolina e gasóleo, servirá para impulsionar atividades desde a educação, saúde às atividades comerciais.
É um contributo importante para a descarbonização do país? E como Angola analisa e se posiciona perante as ambiciosas metas climáticas do Acordo de Paris?
Julgamos que sim. O Acordo de Paris encoraja os países signatários a definirem metas para redução das emissões, e Angola é um país emissor de gases de efeito estufa, por força da utilização de derivados de petróleo na sua indústria, embora o continente africano seja responsável apenas por 2% do total de emissões a nível mundial. A adoção de energias renováveis enquadra-se na Estratégia Nacional das Alterações Climáticas, adotada pelo país e no desenvolvimento de um modelo de baixo carbono. Nesta estratégia de transição energética é importante a significativa penetração da energia hídrica na matriz energética nacional, com 60%, fruto de significativos investimentos feitos nos últimos anos, como a construção de grandes barragens hidroelétricas, existindo ainda espaço de penetração para as renováveis não convencionais, como solar, eólica e biomassa.
O plano Angola Energia 2025 prevê que 60% da população rural tenha eletricidade nesse ano. Quanto estima que se poupará em combustíveis fósseis usados em geradores?
A execução do Plano de Electrificação Nacional prossegue, não obstante os constrangimentos de natureza orçamental que afetam o cronograma. O investimento em causa integra não só a construção de novas centrais de produção de energia elétrica como de linhas de transporte e distribuição de eletricidade, unindo as diferentes regiões de um território 14 vezes maior do que Portugal, e onde a desminagem continua a representar um custo significativo nos orçamentos dos projetos, para que se tenha uma noção do esforço em questão. Analisando a vantagem na substituição do diesel usado na produção de eletricidade, os cerca de 350 MW de capacidade solar a instalar, numa comparação com a mesma capacidade térmica a diesel, permitirão eliminar a necessidade de consumo de 1,4 milhões de litros de gasóleo por dia, mesmo tendo em conta o carácter intermitente dessa nova fonte energética. É também importante ter em conta vantagens intangíveis desta substituição das fontes poluentes, como a promoção do emprego que se vai gerando e da redução dos desequilíbrios regionais e sociais.
O Estado prevê poupar 5000 milhões de dólares [4,2 mil milhões de euros] em 35 anos. Em Angola o que representa esta ordem de grandeza?
Na perspetiva de desenvolvimento de setores da vida social do país que nos são caros, como é o caso da educação, esse valor poderá permitir, ao longo desse período, construir cinco mil escolas e garantir a inclusão escolar a mais de 2,5 milhões de crianças e jovens. Como o país depende da importação de derivados de petróleo para a satisfação do seu consumo energético, são incomensuráveis os ganhos que se obterão com a poupança em recursos cambiais para essa importação.
Este projeto de 650 milhões de dólares [546 milhões de euros] junta vários financiadores, mas nenhum chinês. Trata-se de um sinal de diversificação do investimento estrangeiro em Angola, por contraponto ao domínio e presença chinesa nas últimas décadas?
É sobretudo um sinal da credibilidade internacional que o país vai recuperando, mercê de uma política económica e medidas de ajustamento conduzidas de forma corajosa e coerente pelo atual executivo. Esse sinal resulta, em suma, da confiança que os credores têm na capacidade de Angola honrar os seus compromissos e, sobretudo, na estabilidade do país e a sua firme liderança, o que faz que ninguém queira "perder esse comboio".
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