Novos contratos precários alastram e pagam quase tanto como os efetivos

Observatório do CES Lisboa alerta para o "predomínio da precariedade", que se manifesta numa compressão salarial nos novos contratos permanentes e numa perpetuação de novos vínculos temporários, "à revelia da lei".
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Está em curso na economia portuguesa uma tendência clara de desvalorização dos salários dos vínculos mais seguros (novos contratos efetivos, permanentes) e de forte aumento nos ordenados dos novos contratos ditos precários (a prazo e outras formas), que, além de dominarem em número, estão a tomar conta da realidade em muitos setores. Atividades ligadas ao turismo ou que exigem poucas qualificações, por exemplo.

De acordo com um estudo do Observatório sobre Crises e Alternativas, do Centro de Estudos Sociais, em Lisboa, hoje divulgado, o número de novos contratos assinados no setor privado que sobreviveram (a diferença entre os que foram assinados menos os que cessaram por despedimento e outras razões) aumentou 23,5% (mais 243,6 mil) entre janeiro e outubro de 2017.

No entanto, ao contrário do que sinalizam os dados do INE, os novos contratos a prazo rivalizam em número com os vínculos efetivos. Foram assinados e estão vigentes 89 532 contratos a termo contra 89 506 sem termo. Além destes, há 64 593 tipos de contratação que configuram outras formas precárias (termo incerto, tempo parcial e temporários).

Estes resultados vêm de uma base de dados da nova contratação feita pelas empresas do setor privado a partir dos valores que descontam para os fundos que financiam os despedimentos. Este regime existe desde o final de 2013. Segundo o estudo do observatório do CES Lisboa, novos contratos são "todos os que foram firmados e comunicados pelas entidades patronais, após a entrada em vigor da criação do Fundo de Compensação do Trabalho (FCT) e do Fundo de Garantia de Compensação do Trabalho (FGCT), com vista à cobertura das compensações por despedimento".

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A base de dados do FCT e do FGCT "abrange todos os contratos assinados desde novembro de 2013". Mas, a partir de janeiro de 2016, deixou de se considerar "os contratos de duração inferior a 60 dias" que representaram "25% de todos os contratos assinados nos primeiros dez meses de 2015". Portanto, se estes entrassem, a precariedade seria ainda maior.

O trabalho recorda que o primeiro-ministro, António Costa, na mensagem de Ano Novo, disse que a prioridade para 2018 é "não apenas mais, mas sobretudo melhor emprego". Em 2017, isso não terá sido bem assim.

"O peso dos contratos permanentes nos contratos assinados desde 2013 continua a ser diminuto (cerca 34% dos novos contratos vigentes em outubro de 2017). A disparidade entre o número de contratos assinados e vigentes continua a ser reveladora da volatilidade dos contratos de trabalho, visivelmente à revelia da lei", dizem os peritos do CES Lisboa, coordenado por Manuel Carvalho da Silva.

Volatilidade porque, defendem, cada vez mais pessoas têm trabalho, mas desde que se sujeitem a sucessivos vínculos precários ou temporários.

O estudo conclui que a precariedade está a aumentar e com incentivos monetários. "O predomínio da precariedade é acompanhado por uma degradação da remuneração média dos novos contratos permanentes (837 euros mensais brutos no final do primeiro semestre de 2017), ao mesmo tempo que se verifica uma subida da remuneração média dos contratos não permanentes (777 euros mensais brutos no final do primeiro semestre de 2017)." Face a maio de 2014, quando acabou o programa de resgate, o salário médio bruto dos novos contratos a efetivo caiu 13%; o ordenado dos "não permanentes" disparou 36% até meados de 2017.

Assim, os especialistas defendem que o salário mínimo, que tem vindo a subir, é cada vez mais "a remuneração de referência", puxando para si os ordenados à sua volta.

A retoma está a "ocorrer sobretudo em atividades de serviços ligadas ao turismo, ou em atividades que, na maior parte dos casos, são de baixa produtividade e que requerem um baixo nível de qualificação ou de estabilidade dos seus quadros de pessoal". No primeiro semestre, sobreviveram quase 166 mil novos contratos. Destes, 29,2 mil estão no comércio e reparação automóvel, que lidera a lista. Em segundo lugar, aparece o binómio "alojamento e restauração", com 28,8 mil novos contratos.

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