Empresas estão a investir menos na formação dos trabalhadores
O investimento feito pelas empresas na formação dos trabalhadores está a cair e representa hoje, em média, menos 150 euros do que em 2010. O gasto por cada ação de formação está agora em 349 euros. E, ainda assim, são menos de um quinto do total as empresas que apostam na formação contínua, mesmo que a lei exija 35 horas anuais de atualização de conhecimentos a cada trabalhador.
O último Relatório sobre Emprego e Formação do Ministério do Trabalho, conhecido terça-feira, refere que só 19,6% das empresas portuguesas asseguram a formação contínua dos trabalhadores. A percentagem é baixa mas, apesar de tudo, está a crescer. Em outubro de 2017, os últimos dados disponíveis, um total de 50 001 entidades patronais garantia formação profissional, mais 10% do que igual período do ano anterior. E a taxa de participação dos trabalhadores subiu aos 40%, com mais de um milhão a frequentar as ações pagas pelas empresas. O número cresceu 15%.
O economista João Cerejeira, um dos autores do documento, destaca a nota positiva. "O mais interessante é ter aumentado a percentagem de empresas que fazem formação. E essa percentagem cresceu em todos os setores."
O problema é que as empresas também investiram menos na formação. Em média, menos 23 euros do que no ano anterior, e menos 150 euros quando se comparam valores de 2010. João Cerejeira admite que os dados estejam a refletir da parte das empresas não tanto um esforço para melhorar a produtividade, mas antes o cumprimento de uma obrigação legal que tem encontrado cada vez mais reforço nos contratos coletivos de trabalho.
"O requisito legal da empresa dar formação pode estar a fazer que algumas optem por formação mais barata, não tanto por ter uma implicação no aumento da produtividade dos trabalhadores, mas por uma questão meramente formal", diz o economista da Universidade do Minho, lembrando que a formação em higiene e segurança no trabalho continua a ser a mais comum.
As maiores percentagens de acesso a formação contínua são encontradas nos setores da energia e do saneamento, onde metade das empresas garante formação, e na área financeira, onde a percentagem supera os 30%. Na agricultura e no alojamento e restauração, as empresas que garantem formação aos trabalhadores vão pouco além dos 10%. Na indústria transformadora ficam ligeiramente acima dos 20%.
Os dados também revelam que são os trabalhadores mais qualificados aqueles que recebem mais formação. A formação contínua "não está a contribuir para dotar mais os trabalhadores que saíram do sistema de ensino com menos competências", reconhece João Cerejeira. "Pelo contrário, a formação profissional tem até, de algum modo, aprofundado ainda mais a desigualdade dos diferentes níveis de educação."
Mas mesmo os números conhecidos podem ser postos em causa. Os dados públicos sobre a formação que é garantida pelas empresas em Portugal têm por base uma declaração anual junto do Ministério do Trabalho, que não é objeto de verificação. "As empresas podem pôr lá o que quiserem que depois não há forma de controlar", afirma Mário Martins, diretor da Forma-te - Associação Nacional da Formação e Ensino Profissional.
Mário Martins defende que há falta de dados públicos e verificáveis, assim como de uma cultura de controlo deste direito dos trabalhadores - até pelos próprios. "Não há relatos de trabalhadores que coloquem a entidade patronal em causa por não terem formação e, mesmo quando acaba o contrato, não há ninguém que reclame os créditos à formação a que tem direito."
Segundo a lei, todos os trabalhadores têm direito a 35 horas de formação contínua por ano, que podem ser antecipadas ou adiadas por um período de quatro anos. Quando não aproveitadas, podem ser convertidas em créditos para que o trabalhador aceda por sua iniciativa a formação e dão direito a retribuição após o fim do contrato de trabalho.