O apoio público às vítimas dos incêndios deste ano e à reconstrução dos territórios vai ser completamente "acomodado" no Orçamento do Estado de 2018 (OE 2018), e de tal forma que o ajustamento das contas públicas até vai ser melhor do que se previa, garante Mário Centeno, o ministro das Finanças, numa carta enviada ontem à Comissão Europeia (CE).."As despesas relacionadas com a catástrofe dos fogos florestais serão acomodadas na proposta de Orçamento e estamos atualmente a avaliar até que ponto as medidas adicionais serão financiadas por provisões centralizadas incluídas na atual proposta" de OE, escreve o ministro numa carta que responde a dúvidas levantadas por Bruxelas, no dia 27..O governo compromete-se com um ajustamento (redução do défice estrutural) num valor de pelos menos 0,5% do PIB, sabendo que a Europa exige 0,6%. É nesta conta que a "catástrofe" dos incêndios até pode vir a reverter a favor do ajustamento, defende Mário Centeno na carta. O governo diz que vai trabalhar em "medidas adicionais", que vão ter um custo (o montante não é especificado), mas que "resultará num ajustamento ligeiramente maior que trará o esforço estrutural de 2018 em linha com os requisitos". Isto é, os 0,6% exigidos..Centeno está a dizer duas coisas. Primeiro, que vai haver um maior esforço orçamental (embora acomodável na proposta de OE para 2018), mas que não deve contar como despesa para o ajustamento. E é provável que assim seja: Bruxelas já sinalizou que não penalizaria o país por causa dos fogos. Ainda nesta semana, em Lisboa, Jean-Claude Juncker, o presidente da Comissão, disse que a divergência entre Bruxelas e Lisboa é afinal "um pequeno problema", segundo o Jornal de Negócios. Segundo, essa décima a mais de ajustamento acenada por Centeno significa que o governo planeia expurgar da conta do défice estrutural mais dinheiro do que o previsto, o equivalente a quase 200 milhões de euros em 2018. São gastos extra, pontuais, com uma situação inesperada (a catástrofe). Por isso, podem ser elegíveis. É o que está a ser negociado. Isso terá um reflexo em 2018..Na carta assinada pelo vice-presidente da Comissão Valdis Dombrovskis e pelo comissário Pierre Moscovici, a CE admitia um "risco de desvio significativo do esforço necessário em 2017 e 2018". Nos documentos enviados por Portugal, a Comissão não via medidas que pudessem suportar o ajustamento anunciado por Centeno..O governo promete um défice nominal de 1,4% do produto interno bruto (PIB) em 2017, que depois cai para 1% no ano que vem. Na nova carta, os valores mantêm-se..Além disso, como o país vai sair do braço corretivo do Pacto, a regra a ter em conta é a do ajustamento estrutural, de onde se expurgam medidas extraordinárias e o efeito do ciclo económico. A ideia é cortar 0,6% do PIB ao ano..O outro défice (a medida clássica que dantes tinha de ficar abaixo de 3%) não mexe porque, como diz o ministro, as medidas adicionais vão ser financiadas por "provisões", dinheiro que o Estado tem guardado algures, que já está no OE..Nos quadros anexos enviados juntamente com a carta, o governo não quantifica as medidas dos incêndios, mas promete que o "Orçamento de 2018 será afinado durante as discussões no Parlamento" e que "estas decisões têm que ver com medidas pontuais de despesa [one--off] de apoio ao rendimento, à reconstrução de casas e à reparação de unidades produtivas"..Além desta engenharia financeira que decorre da aplicação das regras do Eurostat, Centeno lembra que diferenças de décimas entre as suas contas e as contas de Bruxelas "não são significativas tendo em conta as revisões estatísticas" recentes. Estava a referir-se, por exemplo, às previsões da Comissão para 2016, que acabaram por sair totalmente ao lado..Mas há mais. Até ao final de 2017 também há novas medidas incluídas nos quadros enviados a Bruxelas. O governo ainda conta gastar neste ano o equivalente a 0,1% do produto interno bruto (PIB) com "indemnizações aos clientes do BES" (dá cerca de 200 milhões de euros) e igual quantia com os swaps da STCP (transportes urbanos do Porto) e da Carris (transportes urbanos de Lisboa), lê-se nos quadros atualizados.