Grito por Business Angels aumentou em ano atípico
"Inicialmente, foi o esperar para ver, mas depois, business angels e startups rapidamente se adaptaram e perceberam que havia oportunidades para crescer", descreve João Trigo da Roza, presidente da Associação Portuguesa de Business Angels (APBA), para justificar o crescimento da atividade num ano atípico como 2020, marcado pelo efeito da covid-19.
Na prática, os membros da APBA apoiaram 30 projetos, estimando-se que o número até possa ser superior, num montante de 20 milhões de euros, o que representa um aumento de 42,8% face a um ano antes. E já há o reporte de investimentos na ordem do dobro deste valor em projetos de crescimento.
Estamos a falar de investidores privados que aplicam o chamado "capital semente" em startups para as ajudar a nos primeiros tempos de vida. No ano passado, fruto do contexto pandémico, houve um setor que se destacou: foi o apoio à criação de empresas na área da saúde, para onde foram canalizadas 20% das verbas.
"Já em 2019 se vinha a notar uma tendência para a criação de startups no domínio da saúde, mas a pandemia veio acentuar essa vertente", explica o dirigente associativo, enumerando que, a inteligência artificial e o comércio eletrónico ocuparam o segundo lugar do destino do dinheiro "angelical", cada uma das áreas com 14%. As empresas ligadas aos serviços de software absorveram 10% dos apoios, ficando as tecnologias de energia verde (renováveis) com 5%. As fintech (startups financeiras) e unidades ligadas à cibersegurança, acolheram 3% cada uma.
"Em março parou tudo, mas em junho tudo começou a aparecer com muita força. Os empreendedores perceberam que havia uma disrupção na economia e que isso era uma oportunidade para crescer na área digital. Por outro lado, havia dinheiro disponível". João Trigo da Roza não tem dúvidas que foi assim que se criaram condições para haver "muita atividade ao nível da associação, decorrente do aumento do investimento".
A dinâmica alcançada em 2020 levou os profissionais a pretenderem criar uma organização onde pudessem convergir várias instituições, "para ganhar peso" no mercado. Assim, "até final do primeiro semestre deste ano", tencionam apresentar uma estrutura associativa que aglutinará, por um lado, as duas de business angels já existentes, a associação (APBA) e a federação (FNABA) e, por outro, os fundos de "venture capital" (fundos de capital de risco). João Trigo da Roza não quer adiantar mais pormenores por agora.
O aumento do nível de atividade da APBA foi também visível em termos de uma maior aproximação às entidades aceleradoras de empresas, com as quais passou a manter iniciativas mais assíduas de apresentação dos projetos a investidores, explica o gestor.
Mas, para estimular a atividade dos business angels, a associação também apresentou propostas ao Governo, no sentido de obter um compromisso político de apoio a estes investidores. Um dos pedidos formulados visam a atribuição de benefícios fiscais. "O que pode parecer um contrassenso nesta altura, tem o mérito de poder criar melhores condições para apoiar novas empresas que, por sua vez, vão elas próprias gerar receita fiscal, portanto, é um benefício com efeito reprodutor na economia", justifica.
Tendo em conta que os business angels são pessoas individuais, a APBA e a FNABA propõe que "50% do investimento realizado pudesse ser abatido à matéria coletável em sede de IRS", mas ainda não obtiveram resposta do Governo, quanto à possibilidade desta proposta vir a ser concretizada.
Pelo historial da associação, que já existe em Portugal desde 2006, João Trigo da Roza avança que o valor do investimento em cada empresa varia entre 50 e 100 mil euros (pode ir a 500 mil), podendo juntar na operação "dois ou três" investidores. Numa fase mais evoluída da existência da startup, então, os business angels podem diluir a sua posição ou sair, para entrar o "venture capital", já com montantes entre 500 mil e um milhão de euros, numa estratégia que o dirigente apelida de "coopetição", uma versão sincopada de cooperação com competição.
Neste momento, a APBA ainda desconhece quantas empresas foram apoiadas ao longos dos 15 anos em Portugal e, dessas, quantas se mantêm ativas e as que ficaram pelo caminho. "É muito difícil fazer esse apuramento pela dispersão da informação". No entanto, João Trigo da Roza antecipa que já foi estabelecida uma ligação com a associação europeia dos business angels, entidade que poderá vir apoiar um estudo do género de nível europeu.
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