Grandes consumidores de energia querem renováveis a preços mais baixos 

Associação dos grandes consumidores industriais de eletricidade estima que a regularização do mercado elétrico só deva ocorrer a partir de 2023. Pede ao novo governo medidas fiscais imediatas para que a eletricidade tenha "preços comportáveis".
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A Associação Portuguesa dos Industriais Grandes Consumidores de Energia Elétrica (APIGCEE) diz não ter recebido informações ou reclamações relativas às rescisões de contratos de energia a preço fixo, mas lembra que as empresas "precisam de preços sustentáveis no tempo, independentemente do período".

O Dinheiro Vivo noticiou no sábado que há empresas industriais a serem confrontadas com cancelamentos dos contratos de fornecimento de energia a preço fixo, com os fornecedores a invocarem a alteração de circunstâncias, ou seja, a subida dos preços nos mercados grossistas, para obrigar à renegociação do preço. A Entidade Reguladores dos Serviços Energéticos (ERSE)confirmou que já recebeu uma dezena de pedidos de informação e reclamações.

A APIGCEE , que representa empresa como a Navigator, Altri, Secil, Cimpor e Somincor, considera, no entanto, que a subida do preço da energia elétrica é um problema e do novo governo pede medidas fiscais imediatas e, a médio prazo, uma alteração no desenho do mercado, de modo a que a eletricidade "tenha preços comportáveis" com a estratégia de descarbonização e "reflita os preços futuros expectáveis das renováveis abaixo de 30 euros por megawatt-hora (MWh).

Em 2021, os preços da eletricidade registaram aumentos inéditos, passando dos 28 euros/MWh, em fevereiro, para valores históricos em dezembro, que chegaram a ultrapassar os 383 euros/MWh. Apesar de algum abrandamento no arranque de 2022, o mês passado foi o janeiro mais caro de sempre no mercado ibérico (Mibel), com um preço médio grossista de 201,89 euros por MWh. E tudo indica, olhando para os contratos futuros, que os preços se irão manter altos até ao início de 2023. Más notícias para os grandes consumidores.

"As empresas aguardam com alguma expectativa o fim do inverno e uma eventual clarificação da situação geopolítica na Ucrânia com forte impacto no preço do gás natural e, consequentemente, no preço da eletricidade", admite fonte oficial da APIGCEE, embora reconheça que a "progressiva regularização" só deva ocorrer a partir de 2023. A situação de seca e a maior produção hidroelétrica que tem servido para compensar o fim da produção das centrais nacionais a carvão - Sines e Pego - não ajudam.

Quem tem contratos de fornecimento de energia elétrica mais antigos, com pouca exposição aos mercados spot (o mercado diário), sofre, naturalmente, menos os efeitos da volatilidade dos preços no Mibel, do que as empresas com forte exposição aos mercados spot. No entanto, diz a associação, "em períodos longos, os preços médios não diferem muito, pois os contratos de longo prazo são feitos com base nas expectativas futuras". A questão é que as empresas "precisam de preços sustentáveis no tempo, independentemente do período". E o momento que se vive "é excecional, mas está a ser duradouro e, por isso, os seus efeitos fazem-se sentir de forma mais gravosa" no universo empresarial.

Se as descidas de janeiro trouxeram algum alívio às empresas com maior exposição aos mercados diários, houve, no entanto, quem tivesse que ajustar a laboração, com paragem nos períodos em que o tarifário elétrico é mais elevado, designadamente em horas de ponta e cheias. "Estas opções são tomadas quando não é possível fazer refletir no preço do produto acabado o incremento dos custos variáveis sob risco de perda de quota de mercado", frisa a APIGCEE.

Nesse contexto, a associação defende que o novo governo deverá implementar medidas fiscais, "de aplicação imediata", tais como a extensão da isenção do imposto sobre os produtos energéticos. Advoga ainda que, a médio prazo, seja alterado o desenho do mercado - que obedece a uma lógica marginalista, que dita que a última fonte de energia a entrar no sistema é que fixa o preço - "de forma a que a eletricidade tenha preços comportáveis com a estratégia de descarbonização e reflita os preços futuros expectáveis das renováveis abaixo de 30 €/MWh".

Os grandes consumidores de energia consideram ainda urgente a publicação da portaria que regulamenta o Estatuto do Consumidor Eletrointensivo - que permitirá o apoio às empresas eletrointensivas, em termos de custos regulados, e a compensação dos custos indiretos de CO2 - "que aguarda o parecer favorável da Comissão Europeia e do Ministério das Finanças, não obstante este mecanismo já estar implementado há muitos anos nos restantes Estados-membros". A associação lembra, a título de exemplo, que o montante aprovado em Espanha para este mecanismo de compensação ascende, este ano, a 179 milhões de euros.
Reclama também a "rápida operacionalização" dos apoios destinados a projetos de autoconsumo renovável por parte da grande indústria, bem como o seu "licenciamento mais expedito".

A nível europeu, a APIGCEE considera "fundamental" a entrada em vigor do Carbon Border Adjustment Mechanism (CBAM), que pretende atenuar a distorção de mercado causada pela importação de produtos produzidos em países onde as preocupações ambientais são menores, e que beneficiam, por isso, de energia mais barata, isenta de taxas de CO2.

Por fim, destaque para a necessidade de ser "fomentado o streamlining da adesão e processo de habilitação dos grandes consumidores industriais ao produto Banda de Reserva de Regulação (serviço de sistema), que consiste num mecanismo concorrencial de mercado que visa colmatar, parcialmente, o fim do serviço de interruptibilidade que ocorreu a 31.12.2021".

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