Governo travou subida das pensões a mais de 11 mil novos reformados
Executivo falhou, em 2022, a portaria que atualiza os salários pela inflação de 2021 para cálculo da prestação. Perdas podem chegar aos 14 euros para uma aposentação de 800 euros. Diploma acabou por ser publicado esta segunda-feira à noite e garante retroativos a janeiro do ano passado.
Os mais de 11 mil contribuintes que pediram a reforma em 2022 foram penalizados com uma pensão mais baixa face à que teriam direito, porque o governo não atualizou os valores dos salários declarados à Segurança Social ou à Caixa Geral de Aposentações, segundo a inflação média anual de 2021, que se fixou em 1,24%. Os cálculos do Dinheiro Vivo apontam para perdas que podem chegar aos 13,92 euros mensais para uma prestação de 800 euros.
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A denúncia partiu de Eugénio Rosa, afeto à CGTP. "O governo não cumpriu a lei 187/2007, lesando os direitos dos trabalhadores que se reformaram em 2022 e que estão a receber pensões inferiores às que têm direito", lê-se num estudo publicado pelo economista. Confrontado pelo Dinheiro Vivo, o Ministério do Trabalho garantiu que "os coeficientes de revalorização das remunerações anuais serão aplicados a todos os pensionistas que se reformaram em 2022". "Com o pagamento dos retroativos serão pagos todos os valores a que os pensionistas têm direito pela revalorização prevista no artigo n.º 27 do decreto-lei 187/2007", acrescenta agora fonte oficial do gabinete do Ministério de Ana Mendes Godinho.
Confrontados pelo DV, os ministérios das Finanças e do Trabalho acabaram por publicar a portaria nesta segunda-feira à noite e garantem que a revalorização das remunerações anuais será aplicada a todos os que se reformaram em 2022 com retroativos a janeiro.
Só nesta segunda-feira à noite, já depois de o DV ter insistido junto dos ministérios das Finanças e do Trabalho, que tutelam esta matéria, sobre o falhanço na publicação da portaria, é que saiu em Diário da República o texto legal que atualiza os coeficientes da carreira contributiva que passa para preços atuais os valores dos ordenados e que, por isso, influencia o valor da pensão. O diploma será retroativo a 1 de janeiro de 2022, tal como assegurou a tutela. Recorde-se que, em 2021, a portaria só foi publicada em agosto, ainda que com efeitos ao início do ano. Como a inflação média anual de 2020 tinha sido negativa, não se verificou uma atualização das remunerações em 2021. Mas o mesmo não se verificou para o cálculo das reformas que foram solicitadas em 2022.
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Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas (INE), a inflação média anual de 2021 sem habitação foi de 1,24%. Seria este o coeficiente a utilizar (1,24) para a revalorização das remunerações declaradas à Segurança Social, no setor privado, ou à Caixa Geral de Aposentações, no caso da Função Pública. Contudo, para os vencimentos registados entre 1 de janeiro de 2002 e 31 de janeiro de 2011, os cálculos são diferentes. Segundo o diploma, para esse conjunto de anos, é usada a ponderação de 75% da inflação, sem habitação, e de 25% da evolução média dos ganhos subjacentes às contribuições declaradas, sempre que esta seja superior ao aumento de preços, sendo que não pode ultrapassar a inflação em 0,5 pontos percentuais. Significa que "os salários entre 2002 e 2011 poderão ser atualizados até 1,74", como explicou ao Dinheiro Vivo, o economista Jorge Bravo. A portaria agora publicada confirma os valores adiantados pelo especialista.
É possível, assim, calcular de forma aproximada a penalização para quem se aposentou em 2022, aplicando um diferencial entre 1,24% e 1,74%. Um pensionista com uma reforma mínima de 278,05 euros poderia ter direito a mais entre 3,45 euros e 4,8 euros por mês. Um reformado com uma prestação média de 500 euros deveria receber mais 6,2 a 8,7 euros e uma pensão de 800 euros deveria ter tido um incremento entre 9,92 e 13,92 euros, sendo aplicados os corretos coeficientes para a revalorização da carreira contributiva. Corresponde a perto de 200 euros perdidos para estes pensionistas. Este valores podem variar sempre consoante os montantes das remunerações declaradas e os anos de descontos para a Segurança Social ou Caixa Geral de Aposentações.
Para o especialista em pensões e Segurança Social, "se o governo não corrigir esta situação, significa mais uma redução permanente das pensões, o que terá um impacto muito significativo no futuro". Uma vez que a lei está a ser infringida, Jorge Bravo sublinha que qualquer reformado pode pedir o recálculo da pensão. Eugénio Rosa aconselha ainda a apresentar reclamação junto do Ministério do Trabalho e a enviar queixa à Provedoria da Justiça.
Jorge Bravo lembra ainda que "o executivo está a a usar outro expediente para cortar em termos reais as pensões, já depois de ter decidido reduzir para metade o valor da atualização para este ano como contrapartida do bónus de meia pensão pago em outubro de 2022". Se o executivo tivesse aplicado integralmente a fórmula da atualização das pensões, que considera a inflação média anual registada em novembro e a média do crescimento do PIB dos últimos dois anos, os aumentos deveriam ter oscilado entre 8,06% para pensões até 960,86 euros e 7,46% para prestações entre 2882,58 euros e 5765,16 euros. Só que o governo descontou o complemento extraordinário das pensões e impôs uma atualização entre 4,83% e 3,89%.
Neste momento, há cerca de 3,5 milhões de pensionistas da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações. Para determinar o número dos novos reformados em 2022, e como ainda não existem dados finais do ano passado, o Dinheiro Vivo baseou-se na última publicação do Ministério do Trabalho, que dá conta da existência de 2,077 milhões de pensionistas em novembro do ano passado, uma subida de 11 983 reformados face aos 2,065 milhões registados no período homólogo de 2021.