Governo eleva fasquia do salário mínimo para 759 euros em 2023
O valor ainda não está fechado, mas o salário mínimo no próximo ano deverá acelerar para cerca de 759 euros, mais nove euros do que os 750 euros anteriormente previstos, de modo a evitar uma perda de poder de compra dos trabalhadores devido à inflação galopante que este ano vai chegar aos 7,7%, nas estimativas do Conselho das Finanças Públicas. A garantia está inscrita na proposta que o governo entregou ontem a patrões e sindicatos, em sede da comissão permanente da Concertação Social. "Em 2023, o aumento da remuneração mínima mensal garantida deve assegurar um diferencial adicional para compensar os impactos da inflação", de acordo com o documento.
No final da reunião com os parceiros sociais, a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, afirmou que "o objetivo do governo é que não haja perda de poder de compra, em 2023, para quem ganha o salário mínimo nacional". Sem concretizar valores, a governante vincou que "o salário mínimo é decidido pelo executivo após negociações com os parceiros sociais".
Apesar de não adiantar montantes para a atualização do ordenado mínimo, Ana Mendes Godinho deixou claro que não "poderá haver perdas no próximo ano" por causa da subida de preços. Mais, na proposta entregue aos parceiros sociais, é mencionado um "adicional" de "1,3 pontos percentuais" para evolução das remunerações em geral. A soma deste acréscimo ao aumento de 45 euros, isto é, de 6,4% que estava previsto para 2023 dá precisamente uma subida de 7,7%, em linha com a inflação prevista para este ano. Considerando este indicador o salário mínimo deverá fixar-se nos 759 euros, mantendo o governo a meta de chegar aos 900 euros em 2026, no final da legislatura.
A confirmarem-se estes cálculos, a UGT deverá ser a única confederação sindical aceitar tal evolução salarial. "Para a UGT, o aumento do salário mínimo nunca poderá ser inferior à inflação". Pelo contrário, para a secretária-geral da CGTP, Isabel Camarinha, o valor é "insuficiente" e deve haver uma "subida para os 800 euros".
Do lado dos patrões, António Saraiva, presidente da CIP - Confederação Empresarial de Portugal, pediu ao governo que, "primeiro, garanta a sustentabilidade das empresas que se encontram exauridas por causa da crise, da guerra e da inflação" e só depois proceda ao aumento dos salários. João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) alertou para "os riscos de retração no próximo ano" que poderão dificultar aumentos salariais. Os empregadores exigem mais medidas, nomeadamente a redução do IRC que também está contemplada na proposta de Acordo de Médio Prazo de Melhoria dos Rendimentos, Salários e Competitividade.
A contrapartida para os empregadores deverá passar por "reduções seletivas do IRC para empresas com contratação coletiva dinâmica, com valorização de salários e diminuição do leque salarial" e para "empresas que invistam em Investigação e Desenvolvimento (I&D), reforçando as condições do Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial (SIFIDE II) na componente do investimento direto".
Será ainda criado "o Incentivo à Capitalização de Empresas (ICE), fundindo a dedução de lucros retidos e reinvestidos (DLRR) e a remuneração convencional do capital social (RCSS), simplificando os incentivos fiscais à capitalização e ao investimento, por via de eliminação de redundâncias e limitações inerentes aos instrumentos atualmente existentes, e melhorando ainda o regime fiscal de apoio ao investimento (RFAI)", lê-se na proposta do executivo. O governo propõe ainda uma reformulação do "sistema de reporte e dedução dos prejuízos fiscais no sentido da sua simplificação".
Ao nível do IRS, o executivo compromete-se com uma "atualização regular dos escalões de IRS de forma a assegurar a neutralidade fiscal" para que "os aumentos salariais não se diluam através da carga fiscal, nem se traduzam em perdas efetivas no rendimento disponível", segundo a proposta de acordo de competitividade e rendimentos do executivo. Mas a ministra do Trabalho acabou por não concretizar como será feita essa atualização. Além desta medida, o governo propõe a "aproximação e, sempre que possível, eliminação da diferença entre a retenção na fonte de IRS e o imposto devido". Está previsto ainda "a criação de um Incentivo de Regresso ao Mercado de Trabalho, direcionado a desempregados de longa duração".
Uma outra novidade em termos fiscais é a "reformulação das regras de funcionamento do mínimo de existência" que é o patamar até ao qual os rendimentos estão isentos de IRS. Questionada sobre esta alteração, a ministra do Trabalho disse apenas que depois "essas medidas serão detalhadas".
Neste momento, e segundo o Código do IRS, este teto é obtido pela aplicação da fórmula 1,5 x 14 x o valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS), que está nos 443,2 euros.
Contudo, a mesma lei diz que o mínimo de existência nunca pode ser inferior ao salário mínimo vezes 14 meses. Como a remuneração mínima é superior e tem subido mais do que o IAS, utiliza-se então esse referencial. Para este ano, o imposto a liquidar é relativo aos rendimentos de 2021, ano em que o salário mínimo subiu para 665 euros. Segundo as regras, o mínimo de existência para 2022 deveria ser 9310 euros (14 x 665 euros), mas o governo decidiu que esse teto deveria ser superior e fixou-o em 9415 euros. A manter-se as normas atuais, o mínimo de existência será de 9870 euros (14 x o salário mínimo de 705 euros) para os rendimentos obtidos em 2022, com imposto a liquidar em 2023.
Relativamente ao emprego jovem, o executivo propõe a "criação de um programa anual de apoio à contratação sem termo de jovens qualificados com salário igual ou superior a 1268 euros". O documento não detalha, contudo, de que forma esta medida se poderá materializar.
"A preocupação com a situação dos jovens é transversal a todos os parceiros sociais, entendendo-se como fundamental a implementação de medidas específicas para este segmento da população ativa", segundo a nota introdutória a este capítulo dedicado aos jovens do acordo de rendimentos. Nesse sentido, o governo propõe ainda o "aumento do benefício anual do IRS Jovem". Neste momento, este incentivo isenta parte dos rendimentos dos jovens trabalhadores dependentes ou independentes durante cinco anos, seguidos ou interpolados. A medida isenta de IRS 30% dos rendimentos, durante os dois primeiros anos, até ao limite de 7,5 vezes o valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS), isto é, 3324 euros, em 2022; 20% nos dois anos seguintes, com o limite de cinco vezes o valor do IAS (2 216 euros, em 2022); e 10% no último ano, com o limite de 2,5 vezes o valor do IAS (1108 euros, em 2022). O aumento do benefício anual poderá significar que a percentagem de isenção e o teto de rendimentos poderá ser superior.
Parceiros sociais e governo esperam poder fechar este acordo de rendimento a tempo de algumas medidas, como mexidas no IR e IRC, poderem ser vertidas na proposta do Orçamento do Estado, durante a fase de discussão no Parlamento.