Famílias gastaram mais 105 milhões nos supermercados em janeiro
Maiores aumentos deram-se nos laticínios (+24%) e nos produtos de mercearia (+14%). Vendas dos bens de consumo subiram 13%, muito abaixo da inflação dos alimentos
O ano arrancou difícil para as famílias que gastaram 907 milhões de euros, em janeiro, nas compras para o lar. É um crescimento de 13,1% face ao mesmo mês do ano passado, o que corresponde a 105 milhões de euros a mais deixados nas caixas dos supermercados.
Relacionados
Os dados são da Nielsen e mostram que as maiores subidas aconteceram nos laticínios, que tiveram um crescimento homólogo de 24%, e nos artigos de mercearia, que subiram 14%. No total, dos 907 milhões de euros gastos nos super e hipermercados, 378,2 milhões corresponderam a artigos de mercearia, mais 48 milhões do que em janeiro de 2022. Para os laticínios foram 171,4 milhões de euros, um aumento homólogo de 33,5 milhões.
Em conjunto, mercearia e laticínios pesaram 60,6% da fatura no supermercado. Já os gastos em congelados subiram 7%, mas o seu peso na despesa total baixou dos 7,4%, em janeiro de 2022, para 7% este ano. Mesmo assim, os congelados pesaram 63,5 milhões de euros no valor total, contra os 59,3 milhões de janeiro do ano passado.
Subscreva as newsletters Diário de Notícias e receba as informações em primeira mão.
Menos no saco e na carteira
Sabendo-se que a inflação dos produtos alimentares foi de 18,5% em janeiro (e subiu para 20,1% em fevereiro, segundo o Instituto Nacional de Estatística), o aumento de vendas de 13,1% do segmento de bens de consumo mostra que as famílias estão a levar menos compras para casa para fazer face ao disparar dos preços.
Essa prática evidencia que os consumidores portugueses mantiveram no arranque do ano a tendência que se já tinha instalado em 2022.
Como o Dinheiro Vivo avançou na última semana, no ano passado, os gastos reais (sem a inflação) das pessoas com alimentos tiveram um recuo de 2,3% face a 2021, uma diminuição ainda maior do que no tempo da troika. Em 2022, foram menos 573 milhões de euros, de acordo com dados do INE.
Outro dos sinais da redução do poder de compra está na subida das marcas próprias da distribuição, as chamadas "marcas brancas", que escalaram 27,2%, mais do dobro do crescimento do mercado. Já as marcas de fabricantes cresceram apenas 4,2%.
As marcas da distribuição valem já 43,1% dos gastos totais no supermercado, contra os 38,8% que pesavam há um ano. Significa isto que, dos 907 milhões de euros que as famílias gastaram, 391 milhões foram em artigos de marcas da distribuição. Nos artigos alimentares, o peso das "marcas brancas" é ainda mais significativo e passou de 45%, há um ano, para 49,5% agora.
Não admira, por isso, que sejam os grandes supermercados - categoria que no universo Nielsen integra as cadeias como o Lidl, Mercadona ou Aldi, nas quais as marcas próprias têm um peso significativo no sortido total - os que mais cresceram, com um aumento homólogo de 17,7%.
Inspeção aos preços
Recorde-se que, na última semana, 80 inspetores da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) estiveram no terreno a fiscalizar os preços dos bens alimentares nos hiper e supermercados, uma ação que o secretário de Estado do Turismo, Comércio e Serviços justificou com a necessidade de entender porque é que Portugal "tem uma inflação geral de 8,6%, abaixo da média da União Europeia, de 10%, mas, no que respeita aos produtos alimentares, o preço do cabaz aumentou mais do dobro da inflação, 21,1%", no último ano.
"Por isso mesmo, e também porque temos, em alguns produtos, aumentos de 40, 50 e até 70% face ao ano anterior, pretendemos intensificar a fiscalização ao nível dos preços dos bens alimentares", avançou Nuno Fazenda.
Em resultado dessa ação, a ASAE instaurou dez processos-crime por especulação e 12 processos de contraordenação por outros casos numa fiscalização a 123 supermercados de média e grande dimensão. Mas o trabalho não termina aqui, seguem-se ações junto dos fornecedores, para encontrar explicações para o aumento dos preços. Em declarações à TSF, o inspetor-geral da ASAE, Pedro Portugal, explicou que este é um processo moroso em que, partindo da análise a um cabaz de 20 produtos essenciais, foi já possível perceber que o preço de pelo menos metade destes aumentou em cerca de 50%. Agora, há que retroceder ao longo da cadeia para perceber "por que é que alguns bens alimentares custam agora mais 60 ou 70% do que no final do ano passado".
Mais reclamações
Para já, no Portal da Queixa, as reclamações relativas ao segmento alimentar estão a crescer, sobretudo na categoria "Gastronomia, alimentação e bebidas" que, desde o início do ano, recebeu 772 queixas, 32% mais do que no período homólogo.
Quanto aos hipers e supermercados, as queixas totais neste arranque de ano caíram 4% face a janeiro e fevereiro de 2022, num total de 443 reclamações. Mas é possível consultar no portal várias queixas de clientes contra o que consideram "aumentos brutais" em artigos alimentares ou contra diferenças entre o preço marcado e o efetivamente na caixa.
Ilídia Pinto é jornalista do Dinheiro Vivo