Empresários antecipam ano desastroso nas exportações

Inquérito do INE a 3293 empresas dá pior previsão de início de ano desde 2014. Setor alimentar e de fornecimentos industriais parecem estar no fio na navalha.

Os mais de três milhares de empresários e gestores do setor exportador (mercadorias) consultados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) estão a antecipar um ano de 2023 algo desastroso ao nível das suas vendas ao exterior, mostrou o INE no inquérito semestral "Perspetivas de exportação de bens", ontem divulgado.

Os responsáveis empresariais preveem um aumento nominal médio nas exportações de apenas 1,1% em 2023 o que significa, descontando o deflator das exportações (a inflação implícita nestes produtos), que vários setores devem incorrer em quebras de volumes exportados (o valor real depois de descontada a inflação).

Esta subida média de 1,1% (resultado dos inquéritos conduzidos em dezembro passado) é a mais fraca dos registos do INE, que remontam a 2014, quando esta pesquisa começou a ser feita pelo instituto.

Ou seja, o valor apenas sobe (e não em todas as classes de mercadorias) porque as empresas compensam o esmagamento da faturação real com um agravamento nos preços finais de venda, o que impulsiona o crescimento dos valores finais nominais (contando com o deflator das exportações).

Os segmentos que vivem uma situação mais apertada são os dos "produtos alimentares e bebidas": aqui os empresários anteveem um avanço de 5,9% no valor exportado. Se a inflação implícita neste tipo de exportações for desta magnitude ou superior, significa que os volumes podem retroceder em 2023 face a 2022.

Só para se ter uma ideia, segundo o INE, nos últimos quatro trimestres terminados no terceiro trimestre do ano passado, o deflator das exportações superou os 14%. Mesmo que esta inflação registe alguma moderação ao longo de 2023 (para metade, por exemplo), continuaremos a ter subidas implícitas de preços bastante significativas, na ordem os 6% ou 7%.

A exportação de "fornecimentos industriais" é a fileira exportadora onde o pessimismo é maior. Os empresários antecipam uma quebra nominal de 1,1% no valor exportado.

Mais folgados acreditam estar os exportadores de "máquinas, outros bens de capital (exceto material de transporte) e seus acessórios", que projetar um crescimento nominal de 8,2% nas suas vendas para fora.

No segmento do "material de transporte e acessórios" o caminho também parece estreito: a previsão de aumento de faturação fica-se pelos 6,2%.

O INE não tem valores disponíveis para o setor exportador de "combustíveis e lubrificantes".

Fazer comércio global em tempo de crise

O maior pessimismo destes empresários relativamente ao ano corrente tem razão de ser.

A inflação continua muito elevada, na casa dos 8%, as taxas de juro vão continuar a subir muito e por tempo indeterminado, muitos investimentos estão em modo cauteloso ou mesmo parados à espera de dias menos incertos.

Com os clientes de Portugal acontece algo parecido. A confiança não abunda neste tempo de crise e de guerra sem fim à vista na Ucrânia.

O governo, no Orçamento do Estado para este ano (datado de outubro), prevê que o ritmo das exportações totais afunde de 18% em 2022 para cerca de 4% este ano. Em novembro, a Comissão Europeia antecipou pior: um crescimento real de apenas 2,3% nas vendas portuguesas ao exterior.

Nesta primeira previsão (a segunda ronda será feita em maio e os resultados publicados a 28 de julho), "as perspetivas das empresas exportadoras apontam para um aumento nominal de 1,1% nas suas exportações de bens em 2023 face ao ano anterior, prevendo um acréscimo de 1,7% nas exportações para os mercados intra-União Europeia (UE) e uma diminuição de 0,3% para os países extra-UE".

O INE explica que "as expectativas das empresas para a evolução das suas exportações de bens em 2023 diferem nos vários setores de atividade, verificando-se em alguns casos aumentos esperados em resultado de acréscimos de preços e noutros a redução decorrente da previsão de contração da procura e de paragens programadas ou descontinuidade de linhas de produção".

É a "resposta às condições de mercado, às disrupções nas cadeias de valor global e aos aumentos nos custos dos fatores de produção".

Adicionalmente, "a incerteza quanto à evolução dos preços é apontada pelas empresas como um fator que influencia de forma significativa as suas previsões de exportação para 2023".

"A conjuntura atual de incerteza, espelhada nos resultados do Indicador de clima económico recentemente publicado pelo INE, refletem bem a dificuldade manifestada pelas empresas na elaboração de uma perspetiva de evolução das exportações de bens para a globalidade do ano de 2023", acrescenta o instituto.

Para mais, "as opiniões das empresas, em especial as da indústria transformadora, quanto à procura global e em particular à procura externa (carteira de encomendas), considerando-se as empresas com produção orientada para o mercado externo, apresentaram valores na ordem dos -15 pontos percentuais. ao longo da segunda metade do ano de 2022, e as empresas não esperam melhorias para o início do ano de 2023", remata o INE.

Para este inquérito, o INE consultou "3293 empresas, que em 2021 representavam cerca de 90% das exportações totais de mercadorias".

A amostra é composta por "empresas exportadoras de bens em atividade, localizadas em Portugal, que declararam valores de exportação superiores a 250 mil euros".

Luís Reis Ribeiro é jornalista do Dinheiro Vivo

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