Costa e Leão cumpriram a meta anual da dívida três meses mais cedo
A meta do governo para o rácio da dívida pública em 2021 (o valor da dívida medido em proporção do PIB - produto interno bruto) foi atingida em setembro, três meses antes do final do ano, indicam cálculos do Dinheiro Vivo a partir dos dados oficiais do Banco de Portugal (BdP). Significa ainda continuar a comprimir o endividamento e que há claramente margem para ficar abaixo da referida meta, que o Ministério das Finanças, de João Leão, traçou nos 126,9% do PIB.
Em termos nominais, a dívida está agora a crescer ao ritmo mais lento desde o início da pandemia. Em setembro expandiu-se 1,7% face a igual mês de 2020. É preciso recuar a março de 2020 para encontrar um registo mais baixo. Nessa altura estava estabilizada (0%), mostram contas com base nos números apurados pelo BdP.
Quanto ao peso da dívida, este desceu com maior velocidade face ao que se esperava e, em setembro, fixou-se em 126,9% do PIB, precisamente o valor da nova previsão do Ministério das Finanças para o ano como um todo, avançada, há apenas três semanas, no cenário económico e financeiro da proposta de Orçamento do Estado de 2022, entretanto chumbada.
"Em setembro de 2021, a dívida pública, na ótica de Maastricht, diminuiu 2,1 mil milhões de euros, para 271,5 mil milhões de euros", uma redução que "refletiu, essencialmente, a amortização de títulos de dívida no valor de 2 mil milhões de euros", explicou ontem o Banco de Portugal, a entidade que faz o apuramento deste indicador fundamental de contas públicas, que serve, por exemplo, para avaliar o País no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
De acordo com informação avançada por entidades como o Conselho das Finanças Públicas (CFP), o PIB nominal deste ano andará perto dos 214 mil milhões de euros. O crescimento nominal previsto pela tutela de João Leão (a estimativa é de 5,8% este ano) aponta para valores próximos desse. Logo, 271,5 mil milhões de euros equivalem a 126,9% do PIB estimado para 2021, que é justamente a meta revista e atualizada que vem no cenário do OE2022.
Portugal é o terceiro país mais endividado da Europa (a seguir a Grécia e Itália) e é um dos mais endividados do mundo desenvolvido. Por isso, trata-se de um indicador muito relevante e sensível.
A cláusula de salvaguarda do Pacto de Estabilidade (que ativava processos disciplinares contra os países que violassem as regras mestras do Pacto) foi ligada em 2020 para os países poderem gastar à vontade na luta contra a covid-19, mas o ano que vem deverá ser o último neste regime de exceção. O mesmo é dizer que o Pacto volta a ser reativado em 2023.
Mais do dobro do que diz o Pacto
As regras principais obrigam os países a reduzirem a dívida pública em excesso face ao teto legal de 60%. E a manterem défices abaixo de 3%, de preferência a terem excedentes (para reduzirem a dívida).
Portugal tem, neste capítulo, uma longa viagem a fazer. Já tinha antes da crise pandémica, aliás. Em 2019, o fardo da dívida pública portuguesa estava a cair, mas continuava a ser o terceiro maior da Europa. Foi 116,6% nesse ano de excedente orçamental de 0,1% do PIB.
Com a pandemia, as contas públicas sofreram um embate histórico. A despesa disparou, a dívida também e a receita caiu. Em 2020, o rácio do endividamento atingiu o maior valor de que há registo desde a criação do Tratado de Maastricht, cerca de 135,2% do PIB. Mais até do que no tempo da troika: o segundo valor mais elevado da série oficial ocorreu em 2014 (132,4%).
Agora, segundo mostra o Banco de Portugal, este governo de António Costa e de João Leão, que deverá cair dentro de pouco tempo com a eventual dissolução do Parlamento pelo Presidente da República, parece estar a conseguir refrear o universo orçamental público e em várias frentes.
Atingiu a meta anual da dívida (assumida no OE2022) em setembro, três meses antes do previsto. E a execução orçamental também indica que o défice está a descer mais rápido do que se imaginava. O governo diz que é por causa da retoma económica "impressionante".
Reforço da almofada de liquidez
Ontem, o banco central governado por Mário Centeno referiu ainda que o executivo está a conseguir reforçar a almofada de liquidez, o dinheiro depositado que pode servir de proteção no caso de algum incidente ou acidente nos mercados de dívida.
"Os depósitos das Administrações Públicas aumentaram 500 milhões de euros", mas "deduzida desses depósitos, a dívida pública diminuiu 2,6 mil milhões de euros, para 249 mil milhões de euros".
Uma consulta feita pelo DV às bases de dados do BdP mostram que, de facto, o governo tem vindo a reforçar de forma significativa essa almofada de precaução: em julho, os depósitos ascendiam a 19,9 mil milhões de euros. Em setembro, já iam em quase 23 mil milhões de euros.
Como a dívida pública é alta, a fatura dos juros a pagar (que é despesa e agrava o défice) continua a ser muito elevada (mesmo que a tendência seja de alívio).
É sempre uma alta pressão sobre o Orçamento, apesar das taxas de juro baixas proporcionadas pelo Banco Central Europeu.
Este ano, o governo conta pagar quase 7,3 mil milhões de euros em juros aos credores, a maioria bancos e gestoras de fundos, mas também entidades oficiais, com o fundo da zona euro (ESM) que emprestou dinheiro ao país quando este entrou na bancarrota em 2011.