Conselho das Finanças ativa alerta laranja na despesa com pessoal

Ritmo de crescimento dos funcionários já é o dobro do que está previsto no Programa de Estabilidade, alerta o CFP. A entidade está muito preocupada com o impacto do descongelamento de carreiras nas contas públicas.

O andamento da despesa com pessoal suscita cada vez mais reservas ao Conselho das Finanças Públicas (CFP) por causa dos efeitos de medidas como o descongelamento das progressões nas carreiras dos funcionários públicos, nomeadamente professores do ensino básico e secundário, bem como o aumento na contratação de trabalhadores e a regularização de precários.

Há vários meses que o CFP, entidade presidida por Nazaré Costa Cabral, tem vindo a advertir para o impacto das referidas medidas na despesa pública, mas num estudo ontem publicado constata que há rubricas que estão efetivamente a crescer muito acima do ritmo previsto em abril, no Programa de Estabilidade enviado para Bruxelas (PE 2019).

De acordo com o relatório sobre a evolução orçamental até março de 2019, os "ordenados e salários" estão a aumentar 5% (média móvel de quatro trimestres), acima dos 3,5% previstos no PE 2019 (meta anual).

Essa despesa em remunerações subiu sobretudo "na sequência do aumento do número médio de trabalhadores do conjunto das administrações públicas de 1,8% face ao primeiro trimestre de 2018 (em parte resultante do processo de regularização extraordinária dos vínculos precários) e do descongelamento das progressões na carreira do pessoal. Trata-se do dobro da taxa de crescimento de postos de trabalho registada no primeiro trimestre de 2018", observa o conselho que fiscaliza a gestão e a execução orçamental.

O CFP observa que "as despesas com pessoal cresceram a um ritmo superior ao implícito no PE 2019", atingindo 5036 milhões de euros nos primeiros três meses, mais 5,2% (ou 247 milhões de euros) do que no período homólogo. É a rubrica de despesa "que registou o aumento mais expressivo no período em análise".

"Este comportamento configura um risco para o cumprimento da previsão efetuada no PE 2019, atendendo às crescentes pressões orçamentais decorrentes do calendário do processo de descongelamento das progressões e da medida destinada a mitigar os sete anos de serviço congelado em carreiras em que a progressão depende do tempo de serviço", alerta a mesma instituição.

O CFP detetou ainda uma alteração no recurso a uma das almofadas de segurança da execução orçamental: a dotação provisional. Ao contrário dos outros anos, em que apenas é usada no final do ano, o Ministério das Finanças foi buscar dinheiro à referida dotação para pagar aos professores já no primeiro trimestre.

"Até ao final de março, a dotação provisional (que ascende a 330 milhões de euros) teve uma utilização de 7,6 milhões. Já no segundo trimestre, designadamente em maio, foram utilizados 239 milhões de euros dessa dotação provisional sobretudo para reforçar a dotação em contabilidade pública de despesas com pessoal dos estabelecimentos de educação e ensinos básico e secundário em 230 milhões", contabiliza o CFP. "Nos últimos anos esse reforço de dotação com contrapartida na dotação provisional tem ocorrido apenas no quarto trimestre."

Cinco grandes incertezas no OE 2019

Há cinco grandes incertezas na execução até final do ano do atual Orçamento do Estado de 2019 (OE 2019) mas, ainda assim, a meta estabelecida pelo governo para o défice público (0,2% do produto interno bruto ou PIB) não está em risco, os sinais de cumprimento deste objetivo são "positivos", diz o mesmo Conselho.

"O saldo apurado até final de março fornece uma indicação positiva quanto ao cumprimento da meta anual fixada pelo governo para o saldo (-0,2% do PIB)". No entanto, "existem alguns fatores de riscos (descendentes e ascendentes), que irão afetar ou condicionar a evolução orçamental nos próximos trimestres".

O maior de todos, talvez, materializou-se no segundo trimestre pelo que não entra para aquela lista de riscos futuros. É a injeção de capital no Novo Banco, "cujo pagamento de 1149 milhões de euros já foi realizado em maio pelo Fundo de Resolução e afetará o saldo das AP no segundo trimestre".

"Em sentido contrário, espera-se que nesse trimestre ocorra uma maior receita de dividendos provenientes de entidades do setor financeiro, nomeadamente do Banco de Portugal e da Caixa Geral de Depósitos (CGD), expectativa incorporada no OE 2019 e mantida na previsão do PE 2019."

Daqui para a frente, o CFP releva os tais cinco fatores que podem desestabilizar a execução orçamental de Mário Centeno, o ministro das Finanças: "A incerteza na recuperação integral do valor remanescente da garantia concedida pelo Estado ao BPP nos termos previstos no PE 2019 (impacto favorável de 166 milhões de euros, aproximadamente 0,1% do PIB)".

"Os encargos associados a medidas de política de valorização salarial dos trabalhadores das AP, nomeadamente o descongelamento salarial das carreiras das AP (cuja 3.ª fase terá início em maio de 2019) e a conclusão do processo de integração de trabalhadores precários".

"A continuação de pressões orçamentais em áreas setoriais, em particular nas áreas da saúde e educação".

"O pagamento extraordinário de indemnizações por parte do Município de Lisboa, no seguimento de decisões judiciais desfavoráveis (prevendo o PE 2019 um impacto de 170 milhões de euros na despesa, cerca de 0,1% do PIB anual)" e a "incerteza dos resultados das medidas relativas à revisão da despesa em consumo intermédio e outras despesas correntes".

"Situações que podem beneficiar" a meta de 0,2%

No entanto, há "fatores que podem vir a ser parcial ou totalmente acomodados por situações que podem beneficiar [isto é, aumentar] o saldo orçamental", diz o Conselho das Finanças Públicas.

Um deles é a receita com impostos e com contribuições para a Segurança Social que pode ficar "acima do previsto na última estimativa" das finanças.

Além disso, o CFP sinaliza que pode haver uma receita extra com a venda dos terrenos da Feira Popular uma vez que Centeno não contou com esse dinheiro das contas do défice de 0,2% em 2019.

"A concretização do valor integral (aproximadamente 265 milhões de euros) da venda dos antigos terrenos da Feira Popular pelo Município de Lisboa, não incluída na estimativa do MF para 2019 subjacente ao PE 2019", será assim outra das situações que, a acontecer, pode dar um impulso positivo ao saldo orçamental, fazendo reduzir o valor final do défice para perto dos tais 0,2%.

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