Comércio e serviços já pesam mais de 70% na riqueza nacional

Estudo elaborado pelo antigo ministro da Economia, Augusto Mateus, para a CCP, revela mudanças profundas no contributo de cada setor para o VAB nacional: de 37%, no final da década de 50, serviços mercantis passaram a pesar quase três quartos, superando todas as outras atividades juntas.
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Se, no final da década de 50, a economia portuguesa denotava um "grande equilíbrio" quanto ao contributo das principais atividades para a riqueza do país, os números apresentados esta segunda-feira pela Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) não deixam margem de dúvida para a "mudança muito significativa" que ocorreu até 2018, ao revelarem que o comércio e os serviços pesam hoje mais de 70% no valor criado.

"Os serviços mercantis, onde se incluem as atividades de comércio e distribuição, conheceram uma forte e contínua expansão que permitiu aumentar drasticamente o respetivo contributo para a criação de valor na economia" nacional, passando de um peso de 37,2% na viragem para os anos 60, para 72,1% em 2018, ou seja, mais 34,9 pontos percentuais (p.p.) aponta o estudo em causa, elaborado pelo economista e antigo ministro Augusto Mateus [1996-97].

"O contributo do comércio e serviços para a competitividade e internacionalização da economia portuguesa" detalha que a evolução foi mais rápida até aos anos 90, atingindo os 61,5% em 1995, "sob o impulso da terciarização do consumo". O ritmo abrandou a partir dessa altura, com o "dinamismo dos serviços empresariais e dos serviços associados ao turismo e ao lazer a assumir o protagonismo no impulso à expansão dos serviços na economia portuguesa", é referido.

A atividade tornou-se, desta forma, e desde a década de 80, mais relevante do que todas as outras juntas, no que toca ao seu peso relativo do contributo para o Valor Acrescentado Bruto (VAB) da economia portuguesa (50%). O contributo aumentou com o passar dos anos e, em 2018, o comércio e os serviços já pesavam quase três quartos (72,1%) de toda a riqueza criada no país.

Na opinião do autor, a terciarização da economia não deve ser considerada excessiva, "até porque a promoção de um efetivo crescimento económico, suscetível de aumentar de forma sustentada quer a produtividade, quer os salários reais, exige um reforço dos serviços", recorda. Deve, antes, ser vista como portadora de "desequilíbrios económicos e sociais" e de "limitações competitivas" que, "não sendo corrigidos nem superadas, travam e distorcem o desenvolvimento estrutural", ressalva.

De acordo com o relatório, a configuração das atividades económicas alterou-se ao longo do último meio século, refletindo três transformações decisivas: a democratização, a adesão à União Europeia e o envolvimento na aceleração da globalização.

A análise aos restantes setores mostra que a produção de bens nas atividades primárias e nas indústrias viu o seu peso no VAB reduzir-se mais do que três vezes entre o final dos anos 50 e 2018, decrescendo de 52,7% para 16,7%. Esta perda de predomínio conjunto fez-se sobretudo às custas do declínio intensivo nas atividades primárias, que de um contributo de 28,6% passaram a 2,8%, traduzindo um decréscimo 25,8 p.p..

Na indústria, as quebras foram menos acentuadas e mais tardias (24,1% para 13,9%). Não obstante, o seu peso na riqueza criada diminuiu para praticamente metade, na sequência do "aprofundamento da construção europeia e da aceleração da globalização".

O contributo das administrações públicas, por seu turno, "subiu expressivamente", sobretudo entre 1990 e 2010, "combinando o dinamismo político, da atribuição de um vasto conjunto de direitos democráticos, com o dinamismo económico e financeiro, do acesso aos fundos europeus de investimento e desenvolvimento". Indica o estudo que estas duas dinâmicas permitiram uma expansão "sem precedentes" do investimento público, emprego e organismos. De 6,6%, no final da década de 50, o peso das administrações no valor criado passou a 7%, em 2018.

A construção e obras públicas, por último, acompanhou o perfil do contributo das administrações para o VAB na economia portuguesa - era de 4,2% em 2018, pouco superior ao que fora em 1958-60 (3,5%), chegando a ultrapassar os 7% antes da crise financeira. "O perfil de avanço e recuo do contributo da construção e obras públicas para o valor acrescentado na economia portuguesa foi alimentado por dois movimentos de estagnação estrutural, traduzidos em reduções relativamente abruptas e prolongadas, depois, em ciclos relativamente longos", conclui o autor.

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