Centeno acertou. INE revela que défice de 2021 ficou abaixo de 3%, nos 2,8% do PIB

No início de fevereiro, o governador do Banco de Portugal, que normalmente se abstém de fazer previsões orçamentais, deixou cair que em 2021 o défice "talvez já cumpra com os tratados, ou seja, será provavelmente inferior a 3%". E assim foi.
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O saldo das Administrações Públicas (AP) em 2021 atingiu o valor de 5.977,1 milhões de euros, o que corresponde a 2,8% do produto interno bruto (PIB), ficando assim visivelmente abaixo da fasquia de 3% definida no Pacto de Estabilidade (por agora suspenso), indicou esta sexta-feira o Instituto Nacional de Estatística (INE).

O INE é única entidade responsável pelo apuramento do saldo orçamental em função do PIB, em contas nacionais. Até porque é também o INE que apura o nível do PIB, que permite depois chegar ao referido indicador fundamental, que em 2021 foi 2,8%.

Quer isto dizer também que o governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, tinha muito boa informação há cerca de dois meses.

Tão boa que acertou quando disse que o défice devia ficar abaixo dos 3%. No início de fevereiro, o governador referiu, numa conferência do Jornal de Negócios, que "em 2021, o défice orçamental ficará muito próximo dos 3%, talvez mesmo cumprindo já com os tratados orçamentais, ou seja, será provavelmente inferior a 3%".

A declaração surpreendeu e é bastante atípica no caso de um governador de banco central, entidade que costuma zelar muito pela sua independência e distância face a indicadores orçamentais deste tipo, que são do foro do governo e da política.

O Banco de Portugal é responsável pelo apuramento da dívida, sim, mas nunca faz ou publica previsões para o défice (ou saldo orçamental), para a despesa ou a receita, por exemplo. Nem se alonga muito sobre questões fiscais.

Segundo o INE, "o saldo em contabilidade pública apresentou uma melhoria significativa em 2021, resultado de um crescimento da receita (10%) superior ao da despesa (3%)".

"O aumento da receita decorreu, essencialmente, da evolução positiva da receita fiscal e contributiva refletindo a recuperação parcial da atividade económica e do mercado de trabalho após o choque pandémico inicial em 2020."

"Nas despesas das AP destacam-se os seguintes aumentos:

i) pensões pagas no âmbito do regime geral de Segurança Social;

ii) despesa com aquisição de bens e serviços do setor da saúde e aquisição de computadores no âmbito do Projeto de Universalização da Escola Digital;

iii) despesas com pessoal, em particular devido ao impacto das novas admissões, descongelamento de carreiras e promoções, pagamento do trabalho suplementar realizado no âmbito do combate à covid-19 pelo Serviço Nacional de Saúde e na área da educação", enumera o INE.

Assim, "em 2021, o impacto orçamental direto das medidas de política pública no contexto da pandemia covid-19 foi ainda significativo".

Segundo cálculos com base em dados da execução orçamental das Finanças, o impacto direto das medidas covid no saldo em contabilidade nacional foi maior em 2021 do que em 2020. "Terá ascendido a cerca de 2,8% do PIB (2,4% em 2020)", refere o mesmo instituto.

Além da pandemia, houve outras operações que interferiram no défice final, claro.

O governo e o ministro das Finanças não destacam muito este ponto, mas o orçamento de 2021 beneficiou de uma receita extraordinária enorme, de valor superior a 1,1 mil milhões de euros, o equivalente a 0,5% do PIB do ano passado.

O INE refere-se à "receita da devolução da margem paga antecipadamente pelo Estado português, que ficou retida pelo Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF), aquando da concessão inicial do empréstimo no âmbito do Programa de Assistência Económica e Financeira, no montante de 1114,2 milhões de euros".

Do outro lado do balanço, houve despesas pesadas, como é costume. Segundo o INE, "o ajustamento em injeções de capital e assunções de dívidas, para além das injeções de capital concedidas a empresas classificadas no setor das AP, inclui ainda a classificação de algumas operações como transferência de capital em contas nacionais com impacto no saldo das AP".

São duas as despesas extra de grande dimensão, segundo o INE:

i) aumento de capital, através da Direção-Geral do Tesouro e Finanças, na TAP Air Portugal, com um impacto (líquido do reembolso parcial do empréstimo concedido pela TAP S.A. à respetiva holding que já integrava a dívida pública das AP) de 640,5 milhões de euros;

ii) a concessão de uma garantia pelo Governo Regional dos Açores à SATA Air Açores, no valor de 120 milhões de euros."

O instituto explica que "as duas operações foram registadas em contas nacionais como transferência de capital, tendo em consideração a situação económica e financeira das empresas".

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