Burocracia na contratação pública ameaça estudos do novo aeroporto
O tempo é curto e a tarefa hercúlea: duas comissões compostas por 31 personalidades irão tentar, nos próximos 12 meses, encontrar resposta para um problema com cinco décadas e chegar a um consenso sobre qual a melhor localização para o futuro aeroporto da região de Lisboa. O presidente do Conselho Superior de Obras Públicas (CSOP), o ex-bastonário dos Engenheiros, Carlos Mineiro Aires, que lidera a Comissão de Acompanhamento, aponta os desafios.
"Confesso que estou apreensivo por causa de questões burocráticas, especialmente neste país. A questão da contratação pública acabou por criar umas amarras quando a Comissão Técnica Independente vai necessitar de fazer contratação com listas, quer para a realização de alguns estudos quer para a revisão e atualização de estudos que estão feitos, e tudo isso é um caminho de tormentas que consome imenso tempo."
O engenheiro adianta que já decorrem conversações com o governo no sentido de encontrar soluções e ressalva que este receio não é uma desculpa para um eventual atraso no calendário. "Não vou estar a tornar a contratação pública numa justificação para o que quer que seja. A contratação é uma tormenta para quem pretende fazer coisas, com timings e prazos apertados. É difícil. Já cá ando há muitos anos e sei bem como as coisas funcionam", refere.
O presidente da comissão que fiscaliza o principal grupo de trabalho assume-se otimista e acredita que o relatório da avaliação ambiental estratégica (AAE) esteja concluído antes de 31 de dezembro de 2023. "Gostaria muito de, no fim do próximo ano e como final da minha carreira, poder dizer que ajudei a resolver um problema importante para o meu país. Gostaria muito que déssemos uma solução e que fosse a melhor possível para Portugal", revela, sublinhando, no entanto, que existem posteriormente "relações contratuais com a atual concessionária, com custos e investimentos, com uma série de coisas" e que esta matéria extravasa as competências das comissões.
"A decisão será sempre política, não tenho qualquer dúvida, e quem pensar o contrário que tire daí o sentido", vinca. O presidente do CSOP não foge à discussão sobre as cinco localizações em análise e assume a preferência por Alcochete, posição que sempre defendeu enquanto bastonário da Ordem dos Engenheiros.
"Sendo a voz dos engenheiros, não me parece cordial que não defendesse publicamente a solução de Alcochete. Os engenheiros têm uma questão muito importante que é a ética. Desde o dia 1 de julho, quando fui convidado para ser presidente do CSOP que me remeti completamente ao silêncio", justifica.
Carlos Mineiro Aires clarifica que o trabalho a ser desenvolvido nos próximos meses será transparente e independente. "O processo é transparente. Tenho as minhas ideias como engenheiro, como cidadão - e obviamente que as tenho -, mas neste caso limito-me a presidir a uma comissão que também terá as suas e cada um dos que lá está terá uma opinião. Estou ciente de que será impossível agradar a gregos e a troianos, haverá alguns que não irão ver os seus pontos de vista vingar e outros que sim. Tudo isto será feito de uma forma completamente limpa", promete.
O tiro de partida para o arranque dos trabalhos que visam eleger a melhor localização para o futuro aeroporto da região de Lisboa já foi dado. A primeira reunião, que juntou os 25 membros da Comissão de Acompanhamento e a coordenadora da Comissão Técnica Independente, Maria do Rosário Partidário, aconteceu às portas do Natal, no passado dia 22, depois de um reagendamento devido às cheias que afetaram Lisboa em dezembro. O líder da Comissão de Acompanhamento elogia a escolha das personalidades que constituem os grupos de trabalho. "Além dos presidentes de câmaras, a Comissão de Acompanhamento reúne pessoas ligadas à universidade e ao ambiente. É um conjunto de individualidades que poderão dar contributos altamente interessantes para a apreciação do trabalho", indica.
Relativamente às funções da sua equipa, ressalva que o objetivo "não é controlar nada nem ninguém uma vez que a Comissão Técnica é mesmo independente" e sobre a calendarização da agenda, afiança que existirão reuniões regulares e sempre que justificáveis com a coordenadora da Comissão Técnica para solicitar esclarecimentos e verificar o andamento dos trabalhos.
Carlos Mineiro Aires confessa que não hesitou em aceitar o desafio e garante que está empenhado em conduzir esta odisseia a bom porto. "Quando me colocaram o desafio, fui incapaz de dizer que não. Na verdade, estou a trabalhar pro bono, sou aposentado e desempenho o cargo sem receber um cêntimo. Os contribuintes não têm de estar preocupados comigo. Quando se trabalha de manhã à noite, sem ganhar nada mais do que já recebo, que é a minha reforma, para a qual descontei, obviamente que o empenho ainda tem de ser maior", remata.