Banca duplica lucros, mas há avisos de que os próximos tempos podem ser mais duros

No próximo ano, a banca vai enfrentar uma envolvente mais complicada. Mas a perspetiva é que o setor está agora mais bem preparado para lidar com choques provocados por uma eventual recessão.
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Depois de ter sido posta à prova com a pandemia, a resiliência da banca vai enfrentar novo teste com a inflação galopante e o risco de uma nova recessão no próximo ano. Os bancos garantem estar melhor preparados, mas não escondem que se trata de um "momento delicado", que pode ter um impacto "significativo". Como vão as instituições financeiras ultrapassar os futuros desafios? Os balanços financeiros terão músculo suficiente para combater os novos obstáculos? O assunto vai estar hoje em debate na Money Conference, em Lisboa, com a 6.ª edição sob o tema: Recessão, resiliência ou sobrevivência? 2022, o ano da guerra, na qual participam os presidentes executivos dos principais bancos a operar em Portugal, entre outras figuras destacadas do sistema financeiro nacional.

Nos últimos anos, o setor financeiro nacional tem vindo a melhorar a rentabilidade e a reduzir o crédito malparado através da venda de carteiras, por exemplo. Ao mesmo tempo, tem vindo a "encolher" a sua estrutura de custos, nomeadamente através da redução do número de trabalhadores e do fecho de balcões, mas avançando na digitalização. Todos estes passos têm conduzido à melhoria dos lucros, que têm aumentado de forma significativa este ano.

As maiores instituições do setor que já mostraram as contas dos primeiros nove meses - a CGD deverá apresentá-los hoje - reportaram um aumento de quase 100% dos lucros para 1,2 mil milhões de euros. "Esperamos que os bancos portugueses beneficiem bastante da forte recuperação da economia e da subida das taxas de juro em 2022", referiram recentemente os analis- tas da Moody"s num relatório.

Para já, isso tem-se confirmado. A melhoria da economia permitiu que as instituições baixassem o valor das imparidades e provisões e o aumento dos juros tem retirado pressão à margem financeira - a diferença entre o que os bancos pagam para se financiar e o que cobram nos empréstimos -, que estava a ser afetada pelo ambiente de taxas de juro negativas que vigorou entre 2014 e o início deste ano.

Mas estes resultados podem ainda vir a ser "assombrados" pela pressão para aplicar também à banca uma taxa sobre os lucros excessivos.

Até agora, em Portugal, esta tributação abrange apenas as empresas de petróleo, gás natural e carvão. Mas há países que têm alargado este imposto extra a outros setores, incluindo à banca - como em Espanha.

Mas, após terem passado no teste da pandemia, a tendência de crescimento dos resultados dos bancos deverá voltar a ser colocada à prova no próximo ano devido às expectativas de um abrandamento económico ou até da chegada de uma recessão. E um dos principais desafios vai centrar-se, precisamente, no eventual aumento do crédito malparado.
"Na nossa perspetiva, a pressão inflacionista persistente e os elevados custos da energia irão aumentar o stress sobre os devedores e elevar o risco da qualidade dos ativos no médio prazo", sublinharam os analistas da DBRS num relatório sobre a banca portuguesa.

O aumento do custo de vida e do esforço para pagar as prestações da casa poderão levar a uma subida do malparado e o abrandamento da economia também pode causar dificuldades às empresas, o que poderá afetar tanto a qualidade do balanço como a rentabilidade dos bancos.

Os líderes das instituições de crédito têm descartado a hipótese de um agravamento significativo do malparado. Mas a subida das Euribor tem sido tão rápida - no prazo a seis meses, por exemplo, aumentou de -0,546% para 2,296% desde o início do ano - que o governo optou por criar uma legislação específica para a renegociação de crédito.

Apesar do risco de subida do malparado, os analistas elogiam o caminho que a banca portuguesa tem feito nos últimos anos. "Foram feitos progressos significativos desde 2016, que melhoraram a resiliência a choques", considera a Moody"s. A agência notou também que "apesar da crise do Coronavírus, a limpeza dos balanços dos bancos continuou e as métricas de capitalização foram fortalecidas".

Também a DBRS observa que as almofadas de capital estão estáveis e que as condições de liquidez são adequadas. Mas os analistas desta agência alertam que "a recente volatilidade do mercado está a contribuir para um aumento dos custos de refinanciamento" nos mercados.

Além disso, devido à inversão da política do BCE, que está agora a usar todos os meios para atacar a alta inflação, os bancos deixarão de contar com o financiamento ultrabarato do banco central. Terão ainda de amortizar os empréstimos de prazo alargado concedidos por Frankfurt com condições muito vantajosas e, para isso, poderão ter de os substituir por dívida mais cara.
Ainda assim, uma das principais fontes de financiamento do setor, os depósitos, continuam a ser vantajosos para o setor, já que as remunerações oferecidas não têm acompanhado o aumento das taxas Euribor.

Em resumo, diz a Moody"s, 2023 terá uma envolvente "mais dura" para os bancos portugueses. Mas a perspetiva é que o setor está agora mais bem preparado para lidar com ventos contrários.

Além da evolução do negócio, há ainda outros temas que irão marcar a evolução da banca nacional. Após anos de reestruturação, o Novo Banco poderá agora estar a preparar-se para uma eventual venda, que pode passar por uma entrada em bolsa. Já o principal acionista do BCP - o conglomerado chinês Fosun, que detém 29,95% do banco - tem estado vendedor de alguns ativos devido aos seus problemas de liquidez. O banco português tem estado fora da lista de vendas e Miguel Maya assegura que "o medo é algo que não lhe assiste". O presidente do BCP garantiu que tem "sentido dos acionistas um suporte ao banco ao longo de todo o processo", aproveitando para relembrar que a saída da Sonangol do capital do BCP também é noticiada há anos, sendo que a petrolífera continua a deter cerca de 19%.

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