Encontro-me com André Marques da Silva no encantador Amélia, em Campo de Ourique, já ele aviou a rotina diária no ginásio e é a pé que dali há de sair rumo às Amoreiras, onde vive e tem duas das mais importantes lojas que lidera, enquanto representante de duas marcas de luxo particularmente desejadas dos portugueses, a Apple (GMS Store, loja oficial da marca da maçã em Portugal) e a Bang&Olufsen. É pela política que pega na conversa, lembrando um encontro com o vizinho Carlos Moedas, quando ainda poucos lisboetas sonhavam tê-lo como presidente da Câmara, e vai-me dizendo que acredita que esse foi o primeiro sinal de que a dinâmica política mudou - agora reforçada a ideia com Rio e Costa a alinhar ao centro -; uma mudança de que, enquanto empresário, defende que o país precisa. Lá voltaremos, depois do pedido - um sumo Amélia (de beterraba, maçã e limão) para ele, café duplo para mim e beakfast sandwiches para os dois (sanduíche em focaccia com abacate, bacon, queijo e ovo estrelado) - e de me guiar pelo percurso que o levou dos stands de automóveis à representação daquelas marcas, a que hoje dedica a maior fatia do seu tempo..Recuamos a 2010, com a crise a rebentar em Portugal e uma viagem aos Estados Unidos que, não sendo dele, lhe mudaria a vida. "O meu pai estava em Nova Iorque, entrou na Apple da Quinta Avenida e ligou-me para saber se eu conhecia a marca e a loja, o que havia aqui... e disse-me para me pôr em campo e saber mais." Seria uma oportunidade de negócio a explorar e André não hesitou, descobrindo que a distribuição era feita apenas por terceiros, nada dedicado nem que dignificasse a marca. Apreendendo uma oportunidade real, seguiu o conselho do pai e foi bater à porta da Apple. Um ano depois estava a abrir a primeira loja GMS, no Fórum Almada. Em 2012 já triplicara o negócio, incluindo uma abertura no Colombo e outra nas Amoreiras.."Percebemos logo que tinha uma tração incrível e dez anos depois acabámos de abrir a décima loja, sem mudar uma vírgula no plano de expansão nem sequer em pandemia", conta-me, exemplificando com o espaço inaugurado no Porto - e fechado logo de seguida pelo confinamento obrigatório. E se reconhece que não é o mesmo funcionar só remotamente, mesmo quando o negócio é a tecnologia, também assume que, mesmo com alguns embates fruto das circunstâncias dos dias que vivemos, a Apple é uma receita vencedora. Ainda que abrir uma loja custe 500 a 700 mil euros - o peso da renda conta muito, mas a marca "é muito aspiracional", por isso vende sempre e nem para encontrar pessoas que ali queiram trabalhar há grande dificuldade..Hoje, André acumula a Apple com o retalho automóvel, área em que a família se afirmou há décadas e que ainda se mantém, agora sob sua gestão. "Não é difícil entender as diferenças entre vender carros e tecnologia, há que escolher as pessoas certas, mas enquanto comerciante, a tecnologia não é diferente do setor automóvel", diz, ainda que não hesite em escolher a mais recente aposta como "filha" preferida. Mesmo porque os carros, pela transformação que o setor vive rumo à eletrificação, se tornaram um negócio mais complexo. "Estou um bocado cansado... Há uma pressão enorme dos construtores para baixar os custos da distribuição o que esmaga brutalmente as margens", justifica. "Há grandes movimentos de concentração nas construtoras e na distribuição acontece o mesmo: ou se é um grande grupo ou se é pequeno e se desaparece; quando se está no meio, como nós, ou se sai ou se vende. Nós temos uma posição interessante no Algarve mas as novas regras que aí vêm vão tornar tudo mais difícil.".O gozo do comércio, que lhe corre nas veias, não lhe permite identificar o carro que mais gostou de vender, diz que houve "imensos ao longo dos anos". "Gosto de carros, mas sou apaixonado por marcas, cada uma tem a sua história, os seus princípios e ADN, e é engraçado arranjar equipas à medida de cada uma." E o carro que mais gostou de guiar? Sendo o pai colecionador, poderia indicar-se quase qualquer clássico, mas não se esgota num, acompanha os tempos, desde o Honda S2000 ao Fiat500..Lembra-se de estar rodeado de quatro rodas desde pequeno, com um pai "tarado por carros". E André, filho único, acompanhou-o na materialização desses sonhos desde que o pai, José Marques da Silva, que há 40 anos fundou, com António Portela de Morais, a então Fialgar, representante da Fiat Portugal em Faro. Desses idos anos de 1980 até agora, a maior transformação dessa empresa aconteceu quando se transformou em MS Car - referência incontornável do mercado a sul -, em 2005, passando a agrupar marcas como Chrysler, Dodge, Jeep, Lancia, Fiat, Alfa Romeo, Honda, Seat e Suzuki e abrindo portas também em Portimão e Vila Real de Santo António..Formado em Direito, André Marques da Silva fez um mestrado em Gestão já de olho nos negócios que havia de lhe calhar liderar. Trabalhou em seguros, financiamento e ainda passou dois anos na Escócia, a trabalhar nos automóveis. "Foi muito interessante, super enriquecedor, especialmente naquela idade, ali no final dos 20 anos. Se há um legado a dar aos filhos é esse, aprenderem línguas, viverem fora." É o que quer também passar aos dele, Cereja, de 19 anos - que como a mãe, Mónica Guimarães, representante da Hermès em Portugal, "adora o luxo e também a tecnologia" - e o mais novo, de 10, que está no Liceu Francês. Hoje já não lhe apetecia viver fora, mas gostaria de ter tido uma experiência nos Estados Unidos. E viajar continua a ser uma prioridade: "Prefiro viajar a comprar o que quer que seja.".Regressa ao negócio da tecnologia para me garantir que é quase imune às crises - e a Apple não é exceção, mesmo porque é uma marca "muito aspiracional". Durante a pandemia, com as pessoas fechadas em casa, ainda mais despertou "a necessidade de ter boa tecnologia, ouvir música com qualidade, estar sempre ligado; a covid tornou-nos ainda mais dependentes da tecnologia". E isso explica que mesmo quando teve as lojas fechadas a quebra no negócio não tivesse ultrapassado os 10%, relativamente a 2019. E se este segundo confinamento foi "mais duro mentalmente", nas vendas isso não teve reflexo, já que desta vez nem chegou a fechar lojas e pôde servir todos quantos acompanham o ciclo Apple, trocando de equipamento a cada dois anos e meio..Também a Bang&Olufsen acabou por ganhar em tempos de pandemia: abriu dois espaços no El Corte Inglés de Lisboa e Gaia, somando já cinco espaços, e vendeu mais 15%. Explica. "Começámos a valorizar mais a nossa casa, o tempo ali passado, e a querer mais qualidade na música, na imagem." Assume que não é uma marca para todos os bolsos, mas vinga porque "concilia de forma única qualidade e design", diz. E junta logo o argumento final: "Não é por acaso que é a marca com mais peças expostas no MoMA em Nova Iorque.".Conciliar os diferentes negócios que gere obriga André a dividir a semana entre o escritório de Alvalade e o do Algarve - "não precisava de ir, mas acho que faz a diferença, é importante estar com as pessoas", explica. Até porque se a pandemia não abalou a tecnologia, o mesmo não se pode dizer do setor automóvel, a braços também com a crise dos chips. "É mais difícil, porque há uma volatilidade enorme neste negócio e ressentiu-se imenso com pandemia: quando o turismo voltou, não tínhamos carros para entregar." Assume que essa falta de chips também tocou a GMS - "neste Natal tenho menos material para vender" -, mas nos carros a pancada foi mesmo brutal. "E reflete-se nos preços", assume..Porque não é homem de se dar por satisfeito com as conquistas, André Marques da Silva está já a pensar nos próximos passos. "Em 2022, vou arrancar com os recondicionados, pelo aproach de sustentabilidade do negócio e pelo potencial brutal que abre ao ir buscar novos clientes, os miúdos que até agora não tinham dinheiro para comprar um iPhone." E se esse é o campeão de vendas, representando metade das receitas, o Apple Watch tem tido um crescimento notável: "Já ultrapassou o Rolex como o relógio mais vendido do mundo.".A chegada de um chá faz-nos ver que estamos a chegar ao fim da conversa e imagino que num mundo paralelo talvez pudesse ter sido DJ. "A música é uma paixão antiga e até já pus música aos fins de semana nas Docas, numa loja da Kookaï que se tornava bar. Adoro soul, funk, e toda a batida dos anos 70, e ainda ponho música de vez em quando em casa de amigos. Tenho sempre playlists no telemóvel.".Quanto ao futuro, uma única certeza, passa pelas vendas e pelas marcas. "Sou um comerciante, adoro comércio", diz, ainda que lamente a dificuldade de "ser empresário neste país". Com mais de 200 trabalhadores a cargo, o que mais lhe custa é não conseguir pagar salários de maior qualidade - "É impossível, quando tem de se entregar 50% ao Estado... É o país que temos, por isso era importante mudar, termos um governo mais amigo das empresas. Economia é consumo e um corte de impostos punha dinheiro no bolso dos portugueses. Era a medida que mais diferença faria", diz, fechando a conversa como começou, a acreditar que há ventos de mudança no ar.
Encontro-me com André Marques da Silva no encantador Amélia, em Campo de Ourique, já ele aviou a rotina diária no ginásio e é a pé que dali há de sair rumo às Amoreiras, onde vive e tem duas das mais importantes lojas que lidera, enquanto representante de duas marcas de luxo particularmente desejadas dos portugueses, a Apple (GMS Store, loja oficial da marca da maçã em Portugal) e a Bang&Olufsen. É pela política que pega na conversa, lembrando um encontro com o vizinho Carlos Moedas, quando ainda poucos lisboetas sonhavam tê-lo como presidente da Câmara, e vai-me dizendo que acredita que esse foi o primeiro sinal de que a dinâmica política mudou - agora reforçada a ideia com Rio e Costa a alinhar ao centro -; uma mudança de que, enquanto empresário, defende que o país precisa. Lá voltaremos, depois do pedido - um sumo Amélia (de beterraba, maçã e limão) para ele, café duplo para mim e beakfast sandwiches para os dois (sanduíche em focaccia com abacate, bacon, queijo e ovo estrelado) - e de me guiar pelo percurso que o levou dos stands de automóveis à representação daquelas marcas, a que hoje dedica a maior fatia do seu tempo..Recuamos a 2010, com a crise a rebentar em Portugal e uma viagem aos Estados Unidos que, não sendo dele, lhe mudaria a vida. "O meu pai estava em Nova Iorque, entrou na Apple da Quinta Avenida e ligou-me para saber se eu conhecia a marca e a loja, o que havia aqui... e disse-me para me pôr em campo e saber mais." Seria uma oportunidade de negócio a explorar e André não hesitou, descobrindo que a distribuição era feita apenas por terceiros, nada dedicado nem que dignificasse a marca. Apreendendo uma oportunidade real, seguiu o conselho do pai e foi bater à porta da Apple. Um ano depois estava a abrir a primeira loja GMS, no Fórum Almada. Em 2012 já triplicara o negócio, incluindo uma abertura no Colombo e outra nas Amoreiras.."Percebemos logo que tinha uma tração incrível e dez anos depois acabámos de abrir a décima loja, sem mudar uma vírgula no plano de expansão nem sequer em pandemia", conta-me, exemplificando com o espaço inaugurado no Porto - e fechado logo de seguida pelo confinamento obrigatório. E se reconhece que não é o mesmo funcionar só remotamente, mesmo quando o negócio é a tecnologia, também assume que, mesmo com alguns embates fruto das circunstâncias dos dias que vivemos, a Apple é uma receita vencedora. Ainda que abrir uma loja custe 500 a 700 mil euros - o peso da renda conta muito, mas a marca "é muito aspiracional", por isso vende sempre e nem para encontrar pessoas que ali queiram trabalhar há grande dificuldade..Hoje, André acumula a Apple com o retalho automóvel, área em que a família se afirmou há décadas e que ainda se mantém, agora sob sua gestão. "Não é difícil entender as diferenças entre vender carros e tecnologia, há que escolher as pessoas certas, mas enquanto comerciante, a tecnologia não é diferente do setor automóvel", diz, ainda que não hesite em escolher a mais recente aposta como "filha" preferida. Mesmo porque os carros, pela transformação que o setor vive rumo à eletrificação, se tornaram um negócio mais complexo. "Estou um bocado cansado... Há uma pressão enorme dos construtores para baixar os custos da distribuição o que esmaga brutalmente as margens", justifica. "Há grandes movimentos de concentração nas construtoras e na distribuição acontece o mesmo: ou se é um grande grupo ou se é pequeno e se desaparece; quando se está no meio, como nós, ou se sai ou se vende. Nós temos uma posição interessante no Algarve mas as novas regras que aí vêm vão tornar tudo mais difícil.".O gozo do comércio, que lhe corre nas veias, não lhe permite identificar o carro que mais gostou de vender, diz que houve "imensos ao longo dos anos". "Gosto de carros, mas sou apaixonado por marcas, cada uma tem a sua história, os seus princípios e ADN, e é engraçado arranjar equipas à medida de cada uma." E o carro que mais gostou de guiar? Sendo o pai colecionador, poderia indicar-se quase qualquer clássico, mas não se esgota num, acompanha os tempos, desde o Honda S2000 ao Fiat500..Lembra-se de estar rodeado de quatro rodas desde pequeno, com um pai "tarado por carros". E André, filho único, acompanhou-o na materialização desses sonhos desde que o pai, José Marques da Silva, que há 40 anos fundou, com António Portela de Morais, a então Fialgar, representante da Fiat Portugal em Faro. Desses idos anos de 1980 até agora, a maior transformação dessa empresa aconteceu quando se transformou em MS Car - referência incontornável do mercado a sul -, em 2005, passando a agrupar marcas como Chrysler, Dodge, Jeep, Lancia, Fiat, Alfa Romeo, Honda, Seat e Suzuki e abrindo portas também em Portimão e Vila Real de Santo António..Formado em Direito, André Marques da Silva fez um mestrado em Gestão já de olho nos negócios que havia de lhe calhar liderar. Trabalhou em seguros, financiamento e ainda passou dois anos na Escócia, a trabalhar nos automóveis. "Foi muito interessante, super enriquecedor, especialmente naquela idade, ali no final dos 20 anos. Se há um legado a dar aos filhos é esse, aprenderem línguas, viverem fora." É o que quer também passar aos dele, Cereja, de 19 anos - que como a mãe, Mónica Guimarães, representante da Hermès em Portugal, "adora o luxo e também a tecnologia" - e o mais novo, de 10, que está no Liceu Francês. Hoje já não lhe apetecia viver fora, mas gostaria de ter tido uma experiência nos Estados Unidos. E viajar continua a ser uma prioridade: "Prefiro viajar a comprar o que quer que seja.".Regressa ao negócio da tecnologia para me garantir que é quase imune às crises - e a Apple não é exceção, mesmo porque é uma marca "muito aspiracional". Durante a pandemia, com as pessoas fechadas em casa, ainda mais despertou "a necessidade de ter boa tecnologia, ouvir música com qualidade, estar sempre ligado; a covid tornou-nos ainda mais dependentes da tecnologia". E isso explica que mesmo quando teve as lojas fechadas a quebra no negócio não tivesse ultrapassado os 10%, relativamente a 2019. E se este segundo confinamento foi "mais duro mentalmente", nas vendas isso não teve reflexo, já que desta vez nem chegou a fechar lojas e pôde servir todos quantos acompanham o ciclo Apple, trocando de equipamento a cada dois anos e meio..Também a Bang&Olufsen acabou por ganhar em tempos de pandemia: abriu dois espaços no El Corte Inglés de Lisboa e Gaia, somando já cinco espaços, e vendeu mais 15%. Explica. "Começámos a valorizar mais a nossa casa, o tempo ali passado, e a querer mais qualidade na música, na imagem." Assume que não é uma marca para todos os bolsos, mas vinga porque "concilia de forma única qualidade e design", diz. E junta logo o argumento final: "Não é por acaso que é a marca com mais peças expostas no MoMA em Nova Iorque.".Conciliar os diferentes negócios que gere obriga André a dividir a semana entre o escritório de Alvalade e o do Algarve - "não precisava de ir, mas acho que faz a diferença, é importante estar com as pessoas", explica. Até porque se a pandemia não abalou a tecnologia, o mesmo não se pode dizer do setor automóvel, a braços também com a crise dos chips. "É mais difícil, porque há uma volatilidade enorme neste negócio e ressentiu-se imenso com pandemia: quando o turismo voltou, não tínhamos carros para entregar." Assume que essa falta de chips também tocou a GMS - "neste Natal tenho menos material para vender" -, mas nos carros a pancada foi mesmo brutal. "E reflete-se nos preços", assume..Porque não é homem de se dar por satisfeito com as conquistas, André Marques da Silva está já a pensar nos próximos passos. "Em 2022, vou arrancar com os recondicionados, pelo aproach de sustentabilidade do negócio e pelo potencial brutal que abre ao ir buscar novos clientes, os miúdos que até agora não tinham dinheiro para comprar um iPhone." E se esse é o campeão de vendas, representando metade das receitas, o Apple Watch tem tido um crescimento notável: "Já ultrapassou o Rolex como o relógio mais vendido do mundo.".A chegada de um chá faz-nos ver que estamos a chegar ao fim da conversa e imagino que num mundo paralelo talvez pudesse ter sido DJ. "A música é uma paixão antiga e até já pus música aos fins de semana nas Docas, numa loja da Kookaï que se tornava bar. Adoro soul, funk, e toda a batida dos anos 70, e ainda ponho música de vez em quando em casa de amigos. Tenho sempre playlists no telemóvel.".Quanto ao futuro, uma única certeza, passa pelas vendas e pelas marcas. "Sou um comerciante, adoro comércio", diz, ainda que lamente a dificuldade de "ser empresário neste país". Com mais de 200 trabalhadores a cargo, o que mais lhe custa é não conseguir pagar salários de maior qualidade - "É impossível, quando tem de se entregar 50% ao Estado... É o país que temos, por isso era importante mudar, termos um governo mais amigo das empresas. Economia é consumo e um corte de impostos punha dinheiro no bolso dos portugueses. Era a medida que mais diferença faria", diz, fechando a conversa como começou, a acreditar que há ventos de mudança no ar.