25% das vendas de vinho do Porto no Reino Unido estão em risco

Setor está preocupado com o aumento da carga fiscal que o país prepara sobre os vinhos fortificados. Mercado vale mais de 50 milhões de euros, pondo em causa 12 milhões.
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O governo britânico prepara-se para aumentar os impostos sobre o vinho e, em especial, sobre o fortificado, como o Madeira, Moscatel ou Porto. Neste último caso, o Reino Unido é o segundo maior mercado de exportação, valendo mais de 50 milhões de euros. A Associação das Empresas de Vinho do Porto teme que o aumento da carga fiscal leve a uma perda de 25% das vendas neste mercado, o que significará uma redução das exportações de mais de 12 milhões de euros. "Será negativo para todos", refere o presidente da AEVP, António Filipe.

Em causa está a tributação sobre o álcool e que, aquando da publicação, em setembro, do "Plano de Crescimento 2022", o governo britânico, então liderado por Liz Truss, havia anunciado a sua intenção de prolongar o congelamento das taxas do imposto sobre o álcool para todas as categorias a partir de fevereiro de 2023 e implementar o novo sistema de tributação a partir de agosto do próximo ano.

A questão é que, menos de um mês depois, com a chegada de um novo governo - Rishi Sunak substituiu Liz Truss como primeiro-ministro e nomeou Jeremy Hunt para a pasta das Finanças -, o congelamento das taxas para o próximo ano foi cancelado, deixando o setor vitivinícola em geral, e o dos fortificados em especial, altamente preocupado. Jeremy Hunt quer arrecadar 600 milhões de libras a mais ao ano, qualquer coisa como 700 milhões de euros. O setor duvida e garante que todos vão perder.

"Acreditamos que é uma medida que poderá vir a ter um impacto muito negativo em termos das exportações para o Reino Unido, em que todos perdemos. Perde o setor do vinho do Porto, perde o consumidor britânico e perde o Tesouro inglês", defende a AEVP, que já procurou alertar as várias entidades, designadamente o embaixador de Portugal no Reino Unido, para os efeitos nefastos da medida.

Menos exportações

A decisão de taxar os vinhos de forma diferenciada, em função do seu grau alcoólico, merece críticas, já que, segundo a AEVP, o que o governo britânico prevê é um aumento de 7% nos impostos sobre o álcool numa garrafa de vinho entre os 11,5 e os 14,5 graus, mas que ultrapassa os 30% de aumento no caso dos vinhos acima dos 14,5 graus, ou seja, os fortificados e as bebidas espirituosas.

Na prática, representará, acredita António Filipe, um aumento do preço de venda ao público do vinho de Porto de mais 1,09 libras, quase 1,3 euros, por garrafa. "No atual contexto inflacionista, isto poderá traduzir-se numa diminuição de vendas dos vinhos fortificados no Reino Unido, anulando, consequentemente, o objetivo inicial da medida de aumentar receitas para o Tesouro inglês", frisa.

Citaçãocitacao771,7 Milhões de euros é o valor total das exportações de vinho nos primeiros 10 meses do ano, o que representa mais 1,35% face ao período homólogo. O vinho do Porto está a cair 4,28% em relação a 2021.

No caso do vinho do Porto, a AEVP estima que o impacto da medida se traduza numa perda de 25% das vendas totais do setor para o Reino Unido. Tendo em conta que o mercado britânico compra 12 milhões de garrafas ao ano, pelas quais paga 50 milhões de euros, são três milhões de garrafas, no valor de 12,5 milhões de euros, que poderão perder-se.

Contactado pelo DN/Dinheiro Vivo, o Instituto dos Vinhos do Douro e Porto considera "prematuro" falar sobre a dimensão do aumento fiscal no Reino Unido, atendendo à falta de informações precisas e definitivas, mas Gilberto Igrejas admite que, de qualquer forma, foi já dando nota à tutela sobre a preocupação do setor. Um mercado que este ano está em queda, com as exportações de vinho do Porto a caírem quase 24% para cerca de 37 milhões de euros. "A instabilidade no Reino Unido e a guerra às portas da Europa não ajudou, de todo, às transações económicas", reconhece o líder do IVDP.

Empresas apreensivas

Muito preocupado com o tema está o grupo Symington, o maior exportador de vinho do Porto para o Reino Unido, que destina 25% das suas vendas a este mercado. Euan Mackay, diretor comercial da Symington Family Estates, não poupa nas palavras: "Estamos muito confusos, perplexos mesmo, com as opções do governo britânico, que faz dos vinhos fortificados o seu alvo, quando esta categoria, designadamente o vinho do Porto é parte das celebrações natalícias há séculos. São os vinhos mais consumidos", diz.

Citaçãocitacao50,5 Milhões de euros foram as exportações de vinho do Porto para o mercado britânico em 2021, um aumento de 7,7% face ao ano anterior. Um valor que corresponde a 12 milhões de garrafas.

O gestor estima que, daqui por um ano, o consumidor britânico terá de pagar mais 1,3 libras em média, cerca de 1,5 euros, por cada garrafa de vinho do Porto. "Estamos a falar de um aumento, num só ano, equivalente ao agravamento fiscal acumulado dos últimos 14 anos", sublinha, considerando que: "Será um dia triste se o Porto e os outros vinhos fortificados deixarem de fazer parte da cultura festiva do Reino Unido".

Também Adrian Bridge, CEO da Fladgate Partnership, se mostra apreensivo, estimando que o aumento fiscal se possa traduzir num acréscimo do preço de venda ao público na ordem das duas libras (2,33 euros). "As previsões são muito duras e não sabemos qual será a reação do consumidor, que tem outras pressões inflacionistas com que se preocupar, e não podemos esquecer que o vinho do Porto não é um bem de primeira necessidade", sublinha.

O presidente da ViniPortugal, admite impactos ao nível das exportações e diz que esta é uma "péssima notícia" para os vinhos do Porto, Madeira e Moscatel. Frederico Falcão assume "alguma esperança" de que o aumento de impostos, "que prejudica quem exporta, mas sobretudo quem consome vinho no Reino Unido, não se venha a verificar".

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