Serena vs. Carlos Ramos: quem está com quem na grande polémica do ténis
Passaram poucos dias mas parece que foi nas últimas horas que Serena William teve uma discussão com o árbitro português Carlos Ramos na final do Open dos Estados Unidos (ganha pela japonesa Naomi Osaka). Os protestos e insultos da americana ao juiz, chamando-lhe "ladrão" e "mentiroso", e que resultaram em três sanções à tenista - coaching do treinador de Serena, raqueta partida e abuso verbal -, continuam a correr mundo. E abriram uma discussão sobre se existe ou não tratamento desigual entre mulheres e homens no ténis, como Serena Williams alega.
Dois dois lados da barricada, trocam-se argumentos contra e a favor da atitude de Serena. Um dos últimos a abordar o assunto foi John McEnroe. "Eu disse muito pior. Ela tem razão quando diz que há um padrão, por parte dos árbitros, para os homens e outro para as mulheres. Disso não há qualquer dúvida", referiu o antigo tenista norte-americano que, há um ano, enalteceu os feitos de Serena, mas depois afirmou que "dificilmente" a americana bateria o número 700 do ranking masculino.
Também nas últimas horas surgiu a aquela que terá sido a crítica mais violenta a Serena Williams e por parte de uma tenista, a checa Barbora Strycova. "Ramos é duro, um dos melhores árbitros do Mundo. Ele fez o que tinha a fazer naquele encontro, pois ela ultrapassou completamente os limites. Ele deveria ter agido de forma diferente só por ela ser a Serena Williams? Acho curioso ela ter feito isto apenas quando está a perder", disse, antes de ter mostrado a sua discordância em relação à defesa que a WTA fez à tenista americana: "Ela diz que fez aquilo para defender as mulheres? Isso é uma treta. Para os juízes é indiferente serem mulheres ou homens. Por comparação, nunca vi o Nadal gritar assim com um árbitro. Eu, que sou mulher, levo imensos warnings, e decerto que não é por ser mulher. A defesa do WTA deixou-me terrivelmente surpreendida. As regras vão mudar agora nos jogos da Serena? Se é assim, então avisem-me."
Importa dizer que o WTA, através do seu presidente Steve Simon, reforçou a teoria de que Carlos Ramos agiu como agiu por ter na frente uma mulher e não um homem: "A final mostrou como há maneiras diferentes de as regras serem aplicadas a homens e a mulheres. O WTA acha que não deve haver diferença na tolerância no que à expressão de emoções diz respeito. Consideramos que na final não houve essa igualdade. Nós pensamos ainda que o coaching [receber instruções dos treinadores durante o jogo] deve ser autorizado na nossa modalidade."
Por seu turno, o oficial da Federação Nacional de Ténis, Mike Morissey, lembrou que Carlos Ramos "tem sido um dos melhores árbitros de ténis do mundo desde os anos 1990 e tem reputação de ser firme, mas justo com os jogadores". A própria federação, em comunicado, salientou que o português "é um dos árbitros mais experientes e respeitados no ténis".
Severo e sem contemplações para com Carlos Ramos foi o australiano Pat Cash, antigo vencedor do título do Wimbledon. "Foi um dos encontros mais bizarros de sempre. O árbitro perdeu o controlo e deveria ser multado. Multa pesada e suspensão."
Ainda naqueles que alinharam ao lado de Serena,registe-se a voz de Billie Jean King, uma lenda do ténis e fundadora do WTA que não foi nada meiga para o português: "A barreira que as mulheres enfrentam para o topo nunca se sentiu mais impenetrável do que na final feminina do US Open. O que deveria ter sido um encontro para a história da modalidade, tornou-se numa demonstração de abuso de poder. A causa foi a inconsistente aplicação de uma regra. Todos os treinadores fazem coaching e nenhum jogador deveria ser penalizado pelas ações do seu treinador."
Em seguida a vencedora de 12 Grand Slam's envolveu o que se passou em Flushing Meadows com o racismo. "Ramos passou dos limites, tornou-se parte do jogo e envolveu-se no resultado final. O trabalho de um árbitro é manter o controlo da partida e ele deixou que ela saísse do controlo. As regras são o que são, mas o árbitro tem discrição, e Ramos assumiu o protagonismo. É verdade que Williams poderia ter-se acalmado depois das duas primeiras advertências, mas Ramos tratou Williams de forma diferente do que os jogadores masculinos são tratados. As mulheres são tratadas de maneira diferente na maioria das áreas da vida, ainda mais as mulheres negras."
A questão do racismo ganhou uma dimensão diferente depois de o artista Mark Knight ter publicado um cartoon no jornal australiano Herald Sun em que se vê Serena William a pular em cima de uma raquete no mesmo momento em que o árbitro dialoga com uma Naomi Osaka... loura.
Continuando com lendas do ténis feminino, Martina Navratilova tem uma posição diferente de Billie Jean King, preferindo, em artigo de opinião publicado pelo New York Times, posicionar-se mais perto do juiz português: "Serena Williams tem parte da razão. Há uma grande diferença de tratamento para com as mulheres em relação a como o mau comportamento é tolerado ou não - e não apenas no ténis. Mas, nos protestos contra o árbitro durante a final de sábado do US Open, ela também está em parte errada. A sr.ª Williams optou por discutir sobre o seguinte: insistiu que não fez batota, que não recebeu instruções do treinador e que, portanto, não deveria ter sido penalizada. Mas não importa se ela sabia que estava a receber instruções ou não. Ela estava, efetivamente, como o sr. Mouratoglou [o treinador] admitiu após a partida. E se ela sabia ou não, não é o importante. Portanto, nessa altura, ela recebeu um aviso - o qual não poderia ser anulado retroativamente - e atirou depois a sua raquete ao chão, uma violação automática. O sr. Ramos, efetivamente, não tinha outra opção que não retirar-lhe um ponto. Foi aqui que a sr.ª Williams começou realmente a perder a compostura. Ela e o sr. Ramos começaram, efetivamente, a falar um por cima do outro. Ela insistia que não fez batota - completamente defensável, mas não era esse o ponto -, enquanto ele fazia um callsobre o qual, a determinada altura, foi muito pouco discreto."
Se Serena perdeu a final feminina, o sérvio Novak Djokovic venceu a final masculina. E depois disso não se coibiu de comentar o caso do momento sem se comprometer com nenhum dos lados da barricada: "Podia ter sido diferente, mas não mudou o rumo da partida. Na minha opinião talvez tenha sido desnecessário. Todos temos as nossas emoções, principalmente quanto lutamos por um título do Grand Slam."
Mais afirmativo mostrou-se Toni Nadal, tio de Rafael Nadal e ex-treinador do número um do mundo: "É uma pena que, no dia seguinte as capas dos jornais falem de uma situação desagradável. Serena não esteve no seu melhor dia em nenhum sentido, é claro. É difícil de entender como é que uma atleta da magnitude e do prestígio de Serena não tenha controlado os nervos no campo e tenha sido levada pelas emoções. Penso que há que exigir o bom comportamento dos atletas e sobre isso não há argumentos."
Ainda nem passou uma semana e as opiniões dividem-se. A verdade é que Carlos Ramos mantém-se em silêncio e Serena não voltou a comentar o tema.