As grandes estrelas que nunca trocaram de clube. E Messi ainda é uma delas
Lionel Messi está muito perto de sair da sua zona de conforto, do clube onde cresceu, se fez homem e abraçou o futebol profissional. Esta semana foi marcada pela bomba que caiu em Barcelona, quando a estrela argentina disse basta, após uma época medíocre, e avisou os dirigentes que pretende deixar o clube que o acolheu aos 13 anos.
A decisão foi inesperada, afinal Messi era aos 33 anos um jogador que se confundia com o clube e poucos se atreviam a vaticinar que o seu final de carreira fosse longe do Camp Nou. Só que, ao que tudo indica, o argentino vai mesmo mudar de camisola. E se olharmos para o futebol mundial, há apenas dois jogadores ao mais alto nível que se mantêm fiéis ao mesmo clube.
Um deles acabou de conquistar a Liga dos Campeões e terá sido corresponsável pela decisão de Messi deixar o Barcelona, depois do Bayern Munique ter goleado uns inacreditáveis 8-2. Trata-se de Thomas Müller, avançado internacional alemão de 30 anos que até hoje só vestiu a camisola vermelha dos bávaros. E já lá vão 20 anos, dos quais 13 épocas foram na equipa principal.
Outro caso raro de fidelidade no futebol atual é o do guarda-redes russo Igor Akinfeev, de 34 anos, que está agora a iniciar a sua 19.ª temporada no CSKA Moscovo, o seu clube de sempre, onde começou com apenas cinco anos e contabiliza 684 jogos na equipa principal.
Numa era em que as transferências movimentam milhões, é muito difícil criar laços de afetividade entre os futebolistas e os emblemas que representam, tendo em conta a velocidade com que se troca de camisola.
Há, no entanto, vários exemplos que contrariaram essa tendência nos tempos mais recentes. O caso mais emblemático terá sido o avançado italiano Francesco Totti, que quem já chamavam o Rei de Roma quando no final da época 2016-17 decidiu, aos 40 anos.
Foi o exemplo máximo do jogador-adepto, pois quando aos 13 anos chegou à AS Roma já era fanático pelo clube que representou como jogador durante 28 anos, 25 dos quais ao serviço da equipa principal, pela qual se estreou com apenas 16 anos.
E não foi por falta de convites que Totti se manteve na Roma, pois chegou a ser seduzido pelo Real Madrid dos galácticos e, mesmo no final da carreira, recebeu ofertas para ganhar alguns milhões de euros na liga norte-americana (MLS). Não quis porque o amor ao clube falou mais alto, como se comprovou na forma como se emocionou na tarde em que disse adeus aos relvados no Estádio Olímpico de Roma.
Os êxitos do Manchester United de Alex Ferguson ficaram muito a dever-se à famosa "Classe de 92", uma equipa que aproveitou uma série de jogadores saídos da formação do clube e que se tornaram lendas.
Três desses jogadores nunca conheceram outro clube nas suas carreiras: Gary Neville, Paul Scholes e Ryan Giggs, que foi a figura maior dessa geração. O extremo galês esteve 27 anos em Old Trafford, dos quais 24 como jogador profissional, tornando-se no recordista de jogos oficiais pelos red devils, num total de 963. Giggs retirou-se aos 40 anos como o jogador com mais títulos conquistados do futebol inglês e, mais importante do que isso, uma das lendas imortais do clube.
Já Gary Neville totalizou 602 partidas oficiais em 19 épocas na primeira equipa do United, tantas quantas as de Paul Scholes, que atingiu os 718 jogos. Pelo meio, o médio protagonizou um episódio que mostra bem o amor ao clube, uma vez que a 31 de maio de 2012 anunciou que pendurava as botas, mas 7 de janeiro de 2012 acede a regressar aos relvados a pedido do treinador Alex Ferguson, que estava com uma série de médios lesionados e precisava do regresso do ruivo Scholes. Acabou por retirar-se definitivamente apenas em junho de 2013.
O AC Milan também teve dois jogadores exclusivos que ainda hoje são lendas do clube, até porque fizeram parte dos anos dourados do clube nas décadas de 1980 e 1990. Franco Baresi era o capitão e, quando se retirou, a braçadeira passou para Paolo Maldini, filho de outra lenda do clube: Cesare Maldini.
Franco Baresi tinha 17 anos quando se estreou na equipa principal na época 1977-78, na qual fez apenas três jogos. Mas a partir da temporada seguinte foi sempre titular durante 19 temporadas, durante as quais se tornou num dos melhores defesas-centrais do mundo. Quando pendurou as botas aos 37 anos, tinha ganho todos os títulos pelo seu Milan, pelo qual fez 720 jogos.
Paolo Maldini foi uma espécie de herdeiro de Baresi. Jogaram junto durante 13 épocas, tendo o lateral completado na equipa principal 25 temporadas, com a estreia a acontecer aos 16 anos e o último jogo aos 40. Pelo meio foram 902 jogos pelos rossoneri, cinco Ligas dos Campeões e sete títulos de campeão italiano.
O maior exemplo de amor ao clube em Portugal é o de Nené, avançado que só vestiu a camisola do Benfica nas 18 temporadas como futebolista profissional, às quais é preciso ainda juntar duas como júnior.
O antigo avançado é, ainda hoje, o futebolista com mais jogos (575) ao serviço do Benfica, pelo qual contabiliza 10 títulos de campeão nacional e sete Taças de Portugal, além de um total 359 golos, sempre de águia ao peito.
Dois dos maiores guarda-redes de todos os tempos também só tiveram um amor no futebol. O russo Lev Yashin, considerado o melhor de sempre, só representou o Dínamo de Moscovo entre 1950 e 1970, totalizando 326 jogos. Ficou conhecido como "Aranha Negra" porque usava sempre equipamento preto e o seu talento na baliza valeu-lhe a Bola de Ouro em 1963.
Já Sepp Maier foi capitão e líder do Bayern Munique dos gloriosos anos de 1970. Chamavam-lhe "Gato" por causa da agilidade e reflexos entre os postes e entre 1962 e 1980, período durante o qual fez 667 jogos pelo seu clube de sempre. E poderiam ter sido mais, não fosse um grave acidente de viação lhe ter antecipado o fim da carreira aos 36 anos. Maier é ainda o detentor do recorde de jogos consecutivos na Bundesliga (442).
Há outros exemplos de jogadores emblemáticos nos seus clubes por não terem representado outros emblemas, casos de Manolo Sanchís (Real Madrid), Jamie Carragher (Liverpool), Carles Puyol (Barcelona), Rogério Ceni (São Paulo) e Nilton Santos (Botafogo). A este último, o clube do Rio de Janeiro prestou-se uma enorme homenagem pela dedicação de uma vida, dando-lhe o nome do estádio inaugurado em 2007 e que em 2016 recebeu os Jogos Olímpicos.