O guarda-redes pentatleta que sonha com a baliza sadina e estar em Tóquio 2020
O guarda-redes João Valido tem apenas 17 anos mas já treina com o plantel principal do Vitória de Setúbal. Este jovem promissor entre as balizas, contudo, dá cartas em outras modalidades, pois já foi campeão nacional, europeu na disciplina de pentatlo moderno (modalidade que engloba tiro, natação, corrida, hipismo e esgrima) e mundial no biatlo. Além disso é um aluno excecional e adora matemática. Impressionante, tendo em conta que é diabético.
João, porém, não se sente um atleta prodígio ou um superatleta. "Acho que sou um atleta normal, com talento e limitações como qualquer outro. O tempo que os outros jovens têm para brincar ou conviver eu, por opção minha, gasto-o em treinos, é algo que eu adoro fazer", garantiu ao DN, revelando que, apesar do sucesso, o desporto nunca foi a sua prioridade: "Em casa sempre me disseram que podia fazer tudo desde que a escola viesse sempre em primeiro lugar. É óbvio que depois de um treino só apetece chegar a casa e descansar, sentar no sofá e ver televisão ou ir às redes sociais como qualquer jovem. Mas sei que tenho a obrigação de ir estudar e levar a sério os estudos. Neste ano ainda mais, pois, no final do ano tenho de decidir que curso vou tirar."
O pentatlo entrou na vida de João por causa do futebol. "Aos 5 anos eu queria mesmo era ser futebolista, mas o Vitória de Setúbal só aceitava crianças a partir dos 6. Então como o meu irmão mais velho era pentatleta eu comecei a ir aos treinos com ele na Escola Municipal de Desporto, em Setúbal, até entrar nas escolinhas do Vitória. Depois fui treinando e competindo em ambos", contou o sadino, que conquistou o primeiro título no pentatlo aos 8 anos.
Até hoje foi campeão nacional por oito vezes, campeão europeu em duas ocasiões e campeão mundial de biatlo (só com corrida e natação) por Portugal. Um título que conquistou com 12 anos. "Fui para o Dubai só eu e o meu pai. Foi ele que pagou a minha participação, porque a Federação não tinha o biatlo subsidiado. Nunca esperei vencer, mas no último percurso da prova, quando as pernas pareciam que não aguentavam, olhei para trás, vi que estava em primeiro, e aí quem comandou foi a cabeça e não as pernas ", recordou João, que nessa altura já acumulava o pentatlo e o futebol, depois de entrar para as escolinhas do V. Setúbal.
Difícil conciliar tantos desportos
Foi num torneio de futebol 4, no Fogueteiro, que a baliza lhe sorriu pela primeira vez. "O guarda-redes do escalão acima ficou doente e foi preciso uma solução. O meu treinador virou-se e disse: "Há aqui um rapaz que gosta de correr atrás das bolas para as apanhar, leva-o que ele assim até se diverte." Fui, joguei e nunca mais saí da baliza", contou o fã de Buffon, que já faz três treinos semanais com a equipa principal dos sadinos: "Aos 17 anos ter esta oportunidade é incrível e sinto-me orgulhoso. Posso não saber o futuro, mas sei que serei sempre vitoriano e por isso é lógico que quero chegar à baliza do Vitória um dia."
E da mesma forma que anseia pela baliza sadina, também sonha em estar presente em Tóquio 2020: "Ir aos Jogos Olímpicos era espetacular, só o nome tem uma grandeza enorme e é algo com que eu sonho. Se não for pelo pentatlo - algo que um português não consegue há 21 anos - gostava de ir com a seleção."
Para já, o futebol parece ter ganho. E por muito que custe ao jovem campeão, isso tem-se notado nas provas do pentatlo. "Vejo atletas a quem vencia facilmente ganharem-me com uma margem muito grande. Antes o que mais contava era o talento, mas agora o treino tem muita influência", admitiu João, explicando como é difícil conciliar os treinos diários do futebol com os outros cinco: "Até aos 16 anos, no pentatlo, fazemos três provas: corrida, tiro e natação. Aos 18 anos entra a esgrima e aos 19 a equitação, mas treinamos todas. E se consigo ir à piscina nadar, correr no Parque do Bonfim ou treinar o tiro (laser) na garagem, para a esgrima tenho de ir a Azeitão e o hipismo é em Lisboa..."
Neste ano a época do pentatlo ainda não começou, mas "em princípio" João vai ter de abrandar. Afinal há mais de dez anos que anda a treinar seis modalidades e com a particularidade de ser diabético: "Os meus pais sempre me disseram para lidar com a diabetes da forma mais natural e eu consegui captar essa mensagem. Posso ser atleta e fazer tudo como as pessoas ditas normais. É claro que tenho de ter cuidados. Ando sempre com o meu kit (o medidor, pacote de açúcar e insulina), mas da mesma forma que levo o telemóvel sempre comigo, também levo a bolsinha."
E como faz nos jogos e treinos? "Quando chego entrego a minha bolsa ao fisioterapeuta, meço os níveis de glicose no sangue antes e depois do treino/jogo, e se for preciso, como alguma coisa. Se por algum motivo me sentir mal faço sinal ao fisioterapeuta e ele vem ter comigo e faço ali mesmo o tratamento e depois volto a treinar. Não é limitativo." Palavra de campeão!