O furacão que atingiu a seleção espanhola às portas do Mundial

Espanha demite Lopetegui devido ao acordo com o Real Madrid e substitui-o por Hierro a 48 horas do jogo com Portugal

Na história dos Mundiais já houve treinadores demitidos durante o torneio - Arábia Saudita, Tunísia e Coreia do Sul fizeram-nos durante o França"98. E também seleções poderosas a trocar de selecionador com a prova no horizonte, como o Brasil fez a João Saldanha a meses do México"70. Mas não há memória de uma revolução como esta vivida pela seleção espanhola nas vésperas do arranque da competição, frente a Portugal.

No epicentro do furacão está o nome de Julen Lopetegui, o treinador espanhol que já tinha protagonizado uma passagem turbulenta pelo FC Porto (ver texto secundário) e que agora deixou a seleção de Espanha, considerada a priori como uma das principais favoritas para este Mundial, a ter de reunir os cacos provocados pelo anúncio extemporâneo (terça-feira) da sua contratação pelo Real Madrid. O presidente da federação espanhola (RFEF), Luis Rubiales, não perdoou a "traição" do antigo técnico portista e promoveu ontem Fernando Hierro como selecionador de recurso para este campeonato, nas vésperas do duelo com Portugal.

Rubiales, que nem há um mês (17 de maio) foi eleito sucessor do "dinossauro" Ángel María Villar como presidente da RFEF, oferecera a Lopetegui a renovação até 2020 como uma das suas primeiras medidas no cargo. Na terça-feira, informado do anúncio da contratação do técnico pelo Real Madrid apenas cinco minutos antes de ele ser tornado público, o dirigente abandonou de imediato o congresso da FIFA em Moscovo - já sem participar na atribuição do Mundial 2026 a EUA, Canadá e México - e viajou para Krasnodar, quartel-general espanhol na Rússia, onde na manhã de ontem despediu Lopetegui.

Segundo a imprensa espanhola, nem a tentativa de um grupo de jogadores, liderado pelo capitão e central do Real Madrid Sergio Ramos, serviu para demover o presidente da RFEF. "Não se pode fazer assim as coisas. Ganhar é importante, mas a forma como se trabalha é ainda mais", criticou Rubiales, na conferência de imprensa que serviu para anunciar a saída imediata de Julen Lopetegui. Poucas horas depois, foi apresentado Fernando Hierro, até aí diretor desportivo da RFEF, como o selecionador para este Mundial, a completar um ciclo louco de pouco mais de 24 horas.

"Ataque de cornos" ou "valentia"?

A decisão provocou ondas de choque diferentes entre o sensível universo do futebol espanhol, historicamente dividido em duas forças de influência tão distintas quanto Madrid e Barcelona. Xavi, ex-capitão do Barça, aplaudiu a opção de Rubiales: "A seleção está acima de todos." Já o antigo selecionador Javier Clemente apelidou de "pacóvio" o presidente da federação: "É um novato com tiques ditatoriais."

Também a opinião publicada foi bastante diversificada. No El Mundo, Iñako Díaz-Guerra comparou a atitude de Luis Rubiales à de um clássico "ataque de cornos". "Nem mais nem menos. E todos sabemos que nessas circunstâncias jamais decidimos com a cabeça. O orgulho cegou-o." Já no El País, Ramon Besa elogiou "a valentia" de Rubiales pela lição dada ao Real Madrid, a Lopetegui e a... Jorge Mendes.

O papel de Mendes e Portugal

Agente do ex-treinador do FC Porto, o empresário português foi assinalado como um dos principais responsáveis pelo timing do anúncio do Real Madrid, servindo até para alimentar teorias conspirativas pelo facto de Portugal ser o primeiro rival de Espanha no Mundial.

Poderá a convulsão na seleção espanhola beneficiar Portugal? Hierro, o novo selecionador, tentou ontem resgatar o foco dos jogadores e dos adeptos para o duelo ibérico, na sua apresentação. "A prioridade agora é o jogo com Portugal", frisou, referindo que vai mexer o menos possível na preparação feita por Lopetegui, o homem que liderou a equipa numa qualificação sem derrotas (e um só empate). "Não se pode mexer em dois dias no trabalho de dois anos", acrescentou o ex--capitão do Real Madrid e da seleção.

Do lado português, tenta-se também não dar especial significado à revolução espanhola. "Os jogadores deles são muito experientes, quase todos já ganharam Mundiais, Europeus, a Champions, os melhores campeonatos da Europa. Estão mais do que habituados a todo este tipo de situações. Sinceramente, acho que não vai afetar", disse ontem Bernardo Silva.

Quanto a Lopetegui, despediu-se já ontem da Rússia, "triste". "Oxalá ganhemos o Mundial", disse, remetendo mais declarações para a sua chegada a Madrid, onde já hoje pode ser apresentado no Santiago Bernabéu.

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