Maradona foi de calças de veludo para a sua estreia há 40 anos
Há precisamente 40 anos, num dia de muito calor, Diego Armando Maradona, então com 15 anos, saiu de casa com as únicas calças que tinha, de veludo, e apanhou o comboio para a sede do Argentinos Juniors, o clube que representava. O treinador Juan Carlos Montes tinha-o avisado que estava convocado para o jogo com Talleres de Córdoba. Mas não sabia se ia jogar.
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O Argentinos Juniors perdia por 1-0 ao intervalo. "Prepara-te miúdo, vais entrar", ordenou-lhe o treinador. "Ainda olhei para o lado e não vi mais nenhum miúdo. Era mesmo para mim que ele estava a falar. E assim foi, estreei-me. Apesar de termos perdido, jamais esquecerei esse jogo", contou ontem o ex-jogador ao jornal argentino Olé, numa entrevista a assinalar a sua estreia oficial na I Divisão, há 40 anos, em que entrou para o lugar de Rubén Giacobetti, então com o número 16 nas costas, e numa das suas primeiras intervenções passou a bola por baixo das pernas de um adversário.
Nascia naquele momento uma verdadeira lenda, para muitos considerado ainda hoje o melhor jogador do mundo. Seguiu-se o Boca Juniors (1981-82), o Barcelona (1982-84) e o Nápoles (1984-91), onde chegou de helicóptero ao Estádio San Paolo e se tornou um verdadeiro rei, contribuindo decisivamente para os dois títulos de campeão do clube napolitano e para a conquista da Taça UEFA.
Ao mesmo tempo brilhava na seleção argentina, onde em 1986 se sagrou campeão do Mundo, depois de um jogo memorável contra a Inglaterra (no pós-Guerra das Malvinas) nos quartos-de-final onde apontou o famoso golo com a mão de Deus e o do século, numa jogada de 10 segundos em que tirou todos os adversários da frente e ainda driblou o guarda-redes Peter Shilton. Maradona ainda hoje considera que este foi o jogo mais importante da sua vida, recordando também a final do Mundial de sub-20 em que a Argentina venceu o Japão, por 3-1, e sagrou-se campeã.
Ainda sobre o golo com a mão de Deus, a confissão só chegou anos mais tarde, em 2005, durante o seu programa de televisão La Noche del 10. "Quero contar a todos os argentinos e a todo o mundo. Nunca me arrependi de ter marcado aquele golo com a mão. Marquei um parecido pelo Nápoles à Udinense, na Liga italiana [...] o Shilton [guarda-redes de Inglaterra] por causa disso disse que não me convidava para a sua festa de despedida", contou El Pibe.
Declínio começou em Nápoles
Foi precisamente no seu último ano em Nápoles que começaram a surgir as polémicas extrafutebol. Em 1991, num controlo antidoping, acusou cocaína e foi suspenso 15 meses, ao mesmo tempo que eram noticiadas em Itália as suas ligações à máfia. Em 1994, em pleno Mundial dos EUA, foi novamente apanhado com doping - acusou efedrina, um estimulante proibido que melhora a condição física e foi suspenso 18 meses.
Ainda passou pelo Sevilha (1992-93), Newell"s Old Boys (1993--94) e regressou ao Boca Juniors para terminar a carreira (1995-97). Mas já sem o brilho de outros tempos. "Graças a Deus dei muitas alegrias às pessoas. Mas com a minha doença dei muita vantagem aos meus rivais. Sabe que jogador eu teria sido se não fossem as drogas, sabe? Um jogador do c...", reconheceu em 2014 numa entrevista emotiva à TyC Sports, da Argentina.
Uma das maiores mágoas de Maradona é não ter regressado ao Boca na plenitude das suas faculdades. "Às vezes penso na sorte que teve o Riquelme, em ter regressado ao Boca ainda como grande jogador. Imaginem o que era eu nos meus melhores tempos do Nápoles chegar à Bombonera cheio de força. Tínhamos ganho tudo", confessou em entrevista ao Olé, ele que continua a reclamar inocência num processo de fuga ao fisco em Itália num montante de 40 milhões de euros: "Eu não devo nada a ninguém e, apesar de ser inocente, sou tratado como um dos piores criminosos do mundo."
Nos últimos anos foi sobretudo notícia pelas declarações de teor político e pela guerra que abriu à FIFA e à UEFA - chegou a dizer que Blatter e Platini eram ladrões. Mas na Argentina e em Nápoles continuam a considerá-lo El Dios.