Jorge Machado e a ética no desporto: "O problema está em banalizar ações erradas"
Como é que surgiu o interesse pela ética no desporto? O facto de a sua vida estar desde cedo ligada ao desporto poderá ter influenciado esse interesse?
O interesse surge precisamente por isso. Em 2012, ano do meu abandono da prática desportiva, o que acontece a todos, chega a uma altura que temos de saber desistir. Recebi o convite para ser embaixador do PNED/IPDJ que é uma iniciativa governamental.
Como embaixador do PNED/IPDJ, de que forma mantém um papel ativo na defesa da ética na defesa e valores no desporto?
Eu assumi desde a primeira hora essa responsabilidade, mais do que dizer que sou embaixador, quero demonstrar através de ações e práticas a importância dessa responsabilidade. Comecei a fazer ações de sensibilização, ao mesmo tempo de aulas de karaté que dava. Nas ações procurava juntar a vertente da ética, a discussão dos valores, a importância de uma prática desportiva saudável e alicerçada em valores que possam ajudar ao desenvolvimento dos jovens e a haver um transfer para a sociedade civil. Com o tempo, depois das ações e das aulas, comecei a escrever uns artigos para jornais e tem sido esta a minha ligação ao longo dos últimos anos. Há 10 anos que agarro este desafio com muito orgulho.
O que o levou a querer congregar os textos que escreveu para jornais num livro - "Ensaios Sobre a Ética no Desporto"?
Eu percebi que era importante que a minha atuação fosse multifatorial, que entrevia no seio do desporto, mas estava a falar apenas para os agentes do desporto e percebi que tinha que tentar outros canais para falar sobre este tema. Lembrei-me de começar a escrever para jornais da terra e ia tendo oportunidade para escrever para jornais nacionais. Alguns destes artigos até foram premiados. Com isso, surgiu-me a ideia de juntar os textos e fazer um livro. Assim tenho mais um canal para conseguir chegar às pessoas com esta temática da ética e valores no desporto que não é exclusivamente para a parte desportiva, mas pode ser lido por todos.
Independentemente das modalidades e dos escalões, a questão da ética e dos valores deveria ser mais abordada? Acha que algumas polémicas podem falar mais alto do que a questão da ética e dos valores?
O que eu defendo é que não hã desporto sem ética. Sabemos que o desporto é um local de paixões, onde libertamos tensão e pressão do dia a dia. O que não há mal nenhum. O problema está em banalizar ações erradas. Comportamentos que todos nós temos consciência que devem ser punidos e alvo de medidas corretivas. Dou-lhe um exemplo: se eu for na rua e insultar alguém, se tiver uma atitude discriminatória com base na raça ou no género, isso é algo punível na sociedade civil e é um crime. A questão que coloco sempre é porque é que no desporto é diferente. Não podemos aceitar isso de forma leve e acho que aí todos temos responsabilidade.
A que se devem os incidentes que têm acontecido recentemente no futebol português, como aquele episódio da criança que foi obrigada a despir a camisola do Benfica no jogo com o Famalicão...
Tendo a ver essas situações na sua origem e não a consequência que toda a gente fala. Eu percebo quando as regras dizem que o jovem não podia entrar com a t-shirt numa bancada diferente do clube adversário, mas para mim o problema está antes. Mas têm de haver essas regras? O conceito de desporto obrigada a que haja ética e valores, é um dos compromissos.
Ainda existe ética no desporto?
Sim, eu acho que sim. Senão não estava aqui a fazer nada. Eu acredito que no seio da prática desportiva existem muitas pessoas de valor e as coisas vão melhorando. Na sociedade civil passamos por uma crise de valores e o desporto é um reflexo da sociedade. Temos de ter a capacidade de gerir as emoções, manter a racionalidade e que nos permita tomar aquela decisão que é a correta, embora no momento possa ser difícil.
Para quem não o conhece, quem é o Jorge?
O Jorge é uma pessoa normal. É pai, é marido, é um sonhador, é alguém que procura sempre alcançar novos objetivos. Simultaneamente, como todos, tenho a minha vida profissional. Sou jurista, mestre em gestão desportiva. Fui atleta de alto rendimento durante muitos anos. Tenho uma vida ligada ao karaté. Gosto ainda de junto com o PNED, Plano Nacional de Ética no Desporto, dar ações de formação sobre a ética e valores no desporto pelo país fora. O Jorge é como toda a gente, tem várias dimensões tendo em conta o ambiente onde se movimenta. O Jorge é um amante de desporto.