Big Sam é o último a cair na teia de escândalos dos selecionadores ingleses

Sam Allardyce deixa a seleção após ter sido apanhado a cobrar 464 mil euros para ajudar a fintar os regulamentos da federação
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Dois meses e quatro dias. Foi este o tempo que mediou entre o anúncio oficial de Sam Allardyce como selecionador inglês e o escândalo de corrupção revelado pelo jornal The Daily Telegraph que ontem levou à sua saída.

Big Sam, como é conhecido em Inglaterra, fica assim para a história como o selecionador com menos tempo em funções, tendo apenas orientado um jogo: vitória na Eslováquia, na qualificação para o Mundial 2018. É mais uma história que confirma uma espécie de maldição que assombra o cargo de selecionador inglês desde 1990. É que dos nove treinadores que se seguiram a Bobby Robson, já são cinco os que foram afetados por escândalos.

Allardyce foi apanhado numa investigação jornalística que utilizou uma câmara de filmar escondida e numa conversa em que o repórter, que vestiu a pele de intermediário de empresários asiáticos interessados em investir em transferências de jogadores, procurava saber a melhor forma de contornar os regulamentos da Federação Inglesa (FA) sobre a proibição da partilha de passes de futebolistas por uma terceira entidade. Big Sam mostrou-se bem identificado com o tema e ofereceu os seus conselhos a um grupo fictício de investidores de Singapura e Hong Kong, a troco de 464 mil euros.

De Venables a Capello

Nos últimos 26 anos, Allardyce é a quinta vítima de uma maldição dos selecionadores iniciada com Terry Venables, que após levar Inglaterra às meias-finais do Euro"96 decidiu demitir-se desgastado com uma investigação policial iniciada dois anos antes. Na qualidade de treinador do Tottenham, era suspeito de ter pago um prémio de 58 mil euros a Brian Clough, técnico no Nottingham Forest, para contratar o avançado Teddy Sheringham. Venables disse que se tratava de uma campanha para desacreditá-lo, mas cedeu à pressão e demitiu-se.

Glenn Hoddle rendeu então Venables, mas em janeiro de 1999 deu uma entrevista ao The Times na qual expressou uma teoria que atingiu a dignidade dos deficientes. "Nós recebemos duas mãos, duas pernas e metade de um cérebro decente. Mas algumas pessoas não nasceram assim por alguma razão: é o karma que vem de outra vida. Eles não são apenas pessoas com deficiência, pois tu colhes o que semeias", disse, recebendo de imediato uma onda de indignação de vários setores da sociedade inglesa. Hoddle ainda tentou retratar-se, dizendo que tinha sido mal compreendido, mas dias depois voltou a expressar as mesmas ideias à Radio Five. A situação tornou-se insustentável e foi despedido.

Após um período de relativa acalmia com Kevin Keegan, em 2001 entrou em funções Sven--Göran Eriksson, que foi protagonista de um manancial de histórias para os tabloides. Tudo começou com a relação extraconjugal com Faria Alam, secretária da federação inglesa, numa altura em que o treinador sueco vivia com a italiana Nancy Dell"Olio. Apesar de o escândalo sexual ter rebentado no verão de 2004, Eriksson conseguiu manter-se no cargo, apesar de a FA lhe ter recomendado não ter casos amorosos com outras empregadas. Passaram 18 meses e o sueco voltou a estar no olho do furacão, quando foi alvo de um falso xeque árabe que lhe propôs um contrato para orientar o Aston Villa. Eriksson mostrou-se entusiasmado com o projeto e até se propôs convencer Beckham a ir com ele para o Villa Park, vetando Rio Ferdinand por ser um jogador "preguiçoso". O sueco ainda orientou a seleção no Mundial 2006 e depois demitiu-se.

Fabio Capello foi a vítima seguinte. Assumiu o cargo em 2008, só que quatro anos depois as coisas começaram a complicar-se quando a FA decidiu retirar a braçadeira de capitão a John Terry, à sua revelia. Terry fora acusado de ter comportamentos racistas contra Anton Ferdinand, num jogo da Premier League. Após um péssimo Mundial 2010, numa entrevista à televisão italiana RAI, Capello revelou ter dito à FA que Terry devia manter-se como capitão enquanto a justiça inglesa não desse como provadas as acusações. E dois dias depois das declarações, face à enorme pressão de que foi alvo, Capello resignou.

Sam Allardyce é agora a mais recente vítima desta "maldição". Ontem, depois de se reunir com a federação, chegou a acordo para sair. O sonho de uma vida durou pouco.

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