Quase 20 anos depois, Medvedev inverte a ordem natural do ténis
É o primeiro jogador fora dos Big Four a chegar a número 1 mundial em 18 anos. Proeza chega numa altura em que o seu país declarou guerra à Ucrânia. Mas o tenista já veio apelar à paz.
Foram precisos 18 anos, três semanas e seis dias, mas agora é oficial. O russo Daniil Medvedev é o novo número um da hierarquia do ténis mundial, colocando um ponto final no domínio dos chamados Big Four - Rafa Nadal, Novak Djokovic, Roger Federer e Andy Murray -, que durante este período nunca deram hipóteses à concorrência. O sérvio, que falhou recentemente o Open da Austrália por não estar vacinado, deixa deste modo a liderança que ocupou durante as últimas 361 semanas.
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Olhar para o ranking ATP nos últimos 18 anos era ver sempre os mesmos quatro nomes no topo da tabela (menos no caso de Andy Murray). Só para se ter uma ideia, o último jogador a conseguir quebrar esta hegemonia tinha sido Andy Roddick. Nessa lista, atrás do norte-americano, surgiam Roger Federer, Juan Carlos Ferrero, Andre Agassi e Guillermo Coria. Esta liderança de Roddick coincidiu também com o ano do primeiro duelo entre Nadal e Federer (em março de 2004), no Masters de Miami, no qual o espanhol venceu o então número 1 mundial. Por esta altura, Medvedev tinha 7 anos e vivia com a família em Moscovo.
O timing devido ao contexto da guerra na Ucrânia abafou de certa forma este enorme feito sem paralelo há quase uma década. Medvedev, aliás, tem sentido na pele durante os jogos a revolta das pessoas, mesmo antes de a Rússia ter invadido a Ucrânia. No Open da Austrália, no jogo dos quartos-de-final, ouviu-se um espectador gritar para Felix Auger-Aliassime "fá-lo pela Ucrânia, Felix".
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Já com conflito em marcha, na última quinta-feira, lamentou toda a situação. "É uma nova sombra. Não quero falar de culpados ou do problema, mas, no século em que vivemos, parece-me incrível que ainda haja guerras, não consigo compreender. Espero que termine o mais rapidamente possível. O que eu desejo é que haja o mínimo de perdas possível", afirmou.
No domingo à noite, na véspera de ser oficializado como número 1 mundial, deixou nas redes sociais uma mensagem mais sentida. "Hoje quero falar por todas as crianças do mundo. Todas têm sonhos, as suas vidas estão apenas a começar e estão para chegar grandes experiências: os primeiros amigos, as primeiras emoções. É por isso que venho pedir paz no mundo e entre os países. Vamos, todos juntos, mostrar-lhes que isso é verdade porque as crianças não podem deixar de sonhar", escreveu.
Medvedev, 26 anos, é o terceiro russo a alcançar a liderança do ranking ATP, depois de Yevgeny Kafelnikov e Marat Safin, que passaram, respetivamente, seis e nove semanas na liderança da hierarquia mundial.
O vencedor do Open dos Estados Unidos do ano passado e finalista do último Open da Austrália é também o tenista mais alto (1,98 metros) a ser número um mundial e o sexto mais velho a atingir o topo do ténis masculino pela primeira vez.
Foi um pouco por acaso que Daniil Medvedev se iniciou no ténis, aos 9 anos. Um dia, ao levar o filho para uma aula de natação, a mãe deparou-se com um anúncio de um curso de ténis e resolveu inscrevê-lo,
Depois de estudar Física, Matemática e depois Gestão, decidiu dedicar-se de corpo e alma ao ténis. E mudou-se juntamente com a família para França, em 2014, onde frequentou uma academia de ténis em Antibes.
No início da carreira teve um ou outro episódio de mau comportamento - em 2017, em Wimbledon, atirou moedas para o pé da juíza portuguesa Mariana Alves, a contestar uma decisão. No mesmo ano, tirou uma toalha a um apanha-bolas e atirou-a ao chão, fazendo um gesto obsceno para as câmaras de televisão. Talvez por isso procurou a ajuda de um psicólogo. Agora é esperar para perceber se é uma fase passageira ou se Medvedev vai mesmo inverter a ordem natural do ténis.