Um livro e um filme para darem a conhecer o “Schindler britânico”
Nicholas Winton vai tornar-se um herói para muitos portugueses nas próximas semanas, graças à biografia Uma Vida Singular, lançada pela ASA, e ao filme homónimo, que esta semana estreia-se nos cinemas de todo o país. Conhecido como “o Schindler britânico”, numa alusão ao empresário alemão salvador de judeus imortalizado num filme de Steven Spielberg, Winton pertencia ele próprio a uma família de judeus alemães que no início do século XX se fixou em Inglaterra. E ganhou um lugar na história quando em 1939, já com a anexação da Checoslováquia pela Alemanha Nazi em curso acelerado, conseguiu levar para o refúgio seguro que eram as Ilhas Britânicas quase 700 crianças, na grande maioria judeus checos.
A ASA fez chegar à redação do DN a edição portuguesa do livro, escrito em 2014 por Barbara Winton, filha do biografado. E a embaixada britânica enviou convite para a antestreia do filme, em Lisboa. Mas já conhecia a história deste herói há alguns anos e graças a um vídeo no YouTube, que me deixa ainda hoje emocionado quando o revejo, como fiz antes de escrever este texto. Aliás, a autora de Uma Vida Singular (no original, One Life) começa exatamente a história do pai a contar esse momento de 1988 em que os britânicos e o mundo ficam a conhecer a extraordinária coragem e generosidade de Winton, na época um corretor da Bolsa de 29 anos, que nos meses antes da Segunda Guerra Mundial, arranjou forma de levar 669 crianças para Inglaterra, conseguindo-lhes famílias de acolhimento. Muitas das crianças, findo o conflito em que o próprio Winton serviu na força aérea, descobriram que os pais tinham morrido nos campos de concentração, como o de Auschwitz.
E que momento é esse, mais de quatro décadas depois do fim da Segunda Guerra Mundial, em que finalmente é conhecido o legado de Winton? Um álbum com fotografias e outros materiais sobre as crianças judias resgatadas em 1939 de comboio chegou às mãos de uma historiadora. Surgiram artigos de jornal sobre o heroísmo do antigo corretor. E finalmente no programa da BBC That’s Life - origem do excerto que circula na internet - um surpreendido Winton é apresentado a uma plateia onde são inúmeros aqueles que lhe devem a vida, seja por serem as crianças que ele salvou, ou então os filhos e netos. As lágrimas correram nos olhos do herói, em 1988 um homem de quase 80 anos. Sublinhou Barbara Winton no livro: “atualmente, existem no mundo cerca de seis mil pessoas que devem a vida a Nicholas Winton”.
Este “Schindler britânico” morreu em 2015, com 106 anos. Foi feito Sir pela rainha Isabel II, ela que também viveu a Segunda Guerra Mundial, e até conduziu ambulâncias apesar de ser a herdeira do trono. Note-se que as crianças resgatadas da Checoslováquia foram viver para o último bastião anti-nazi, o país de Jorge VI e de Winston Churchill, pois a dada altura a França tinha sido derrotada, a União Soviética tinha um pacto de não agressão com a Alemanha e os Estados Unidos insistiam na neutralidade.
Seja através do livro, seja pelo filme (realizado por James Hawes e com Anthony Hopkins), seja até por ambos, vale a pena conhecer quem foi Nicholas Winton, o britânico que nunca quis ser visto como um herói.