Rainhas do palco: diversidade marca segunda noite do festival Mimo
A diversidade de género, cores, idades e corpos marcaram ontem a segunda noite do festival Mimo em Amarante. Mesmo com chuva e alterações de última hora no cartaz por causa do “apagão informático” ocorrido na sexta-feira que impediu a viagem de alguns artistas, o público compareceu novamente em peso no Parque Ribeirinho.
As apresentações no palco começaram com a artista brasileira Simone Mazzer, que deu destaque para as canções do álbum Deixa ela falar. A cantora define a sua obra como uma defesa da liberdade dos corpos. As músicas criticam o padrão corporal imposto pela sociedade e brinda a diversidade de corpos, especialmente das mulheres, com um discurso de combate à gordofobia.
O segundo concerto da noite foi da artista trans Ákila, que começou a vida artística com o nome de Puta da Silva. A imigrante brasileira vive em Portugal há sete anos e está em ascensão na carreira, sendo o festival Mimo um dos maiores palcos em que já atuou.
Com emoção em alguns momentos, Ákila deu um concerto poderoso, acompanhado de uma afinada banda e um habilidoso casal de dançarinos, todos negros. A artista cantou clássicos brasileiros como Maria Mariá e Polícia, além de trabalhos autorais como Hétero Curioso e Bruxona, que o público demonstrou conhecer cantando em coro.
O concerto também foi diverso em si mesmo. Em alguns momentos, sobressaiu os acordes de guitarra em ritmo de rock’n’roll, e, noutros, um sensual e romântico saxofone ou os acordes de capoeira - desporto de origem africana que mistura artes marciais e dança. Na primeira parte da apresentação, a artista vestia uma roupa toda preta e botas de estilo militar. Na segunda parte, voltou com um grande chapéu, botas de salto alto até o joelho e um vestido vermelho vivo.
O que não mudou durante a apresentação foram as acutilantes mensagens políticas, em defesa das pessoas trans, dos imigrantes e afrodescendentes. As bandeiras são marcas da artista, que pode ser considerada uma revolucionária em Portugal: passou de uma artista de rua até aos grandes palcos do país, além de ser a primeira atriz trans a estar numa novela portuguesa (Cacau, da TVI). Ákila agradeceu diversas vezes aos espectadores e destacou o quanto isso é revolucionário. “Olha quanta gente veio ver a artista travesti”, celebrou.
Após 1h30 de concerto, a brasileira encerrou sob gritos e aplausos com duas bandeiras: uma do Brasil e outra de Portugal, a pedir para o público repetir o refrão O amor será eterno novamente.
Na sequência, em mais uma mostra de diversidade do Mimo, foi a vez de Rita Benneditto, de 58 anos. Vinda diretamente do estado do Maranhão, a brasileira foi mais uma presença forte em palco. O concerto, batizado de Tecnomacumba, misturou religião, trabalhos autorais e clássicos da Música Popular Brasileira (MPB), como Gilberto Gil e Caetano Veloso.
A chuva insistia em cair devagar, o que não fez o público sair. Durante toda a apresentação as pessoas cantaram e dançaram animadas. Foi assim também no concerto seguinte da noite, com o grupo Ilê Aiyê, o primeiro bloco afro do Brasil. A apresentação no Mimo fez parte das celebrações dos 50 anos de carreira dos artistas, que, além da música, possuem um discurso político de justiça racial.
O concerto foi uma explosão de cores e batuques poderosos que seguiu madrugada adentro. O Ilê Aiyê volta ao festival neste domingo para um cortejo no Largo de São Gonçalo, às 18h.
O festival chega ao último dia com um cartaz diverso, que traz Dino D’ Santiago e Femi Kuti & The Positive Force, da Nigéria.
A noite de ontem teria a apresentação de Fatoumata Diawara, do Mali, contudo, o grupo não conseguiu viajar por causa da falha informático global de sexta-feira.Entretanto, a organização do festival MImo confirmou-os como a primeira confirmação para a edição do próximo ano, que terá lugar novamente em Amarante.