Entre as montanhas verdejantes da cidade de Pu’er, na província de Yunnan (sudoeste da China), a paisagem cultural das Antigas Florestas de Chá de Jingmai dá testemunho de uma milenar sabedoria de coexistência harmoniosa entre o ser humano e a natureza.No século X, os antepassados do povo blang migraram para esta região e, a partir do conhecimento das árvores de chá selvagens, desenvolveram, em conjunto com os dai e outras etnias locais, um sistema agrícola único, conhecido como “chá sob a floresta”. Esta floresta com mais de mil anos é um exemplo notável da civilização agrícola chinesa, preenchendo ainda, de forma singular, uma lacuna nos temas do Património Mundial por representar uma paisagem centrada no chá.O código ecológico da simbiose entre a floresta e o cháA técnica de cultivo de chá sob a floresta, em Jingmai, é uma invenção engenhosa, adaptada ao clima de monção subtropical e à ecologia montanhosa da região. Os antepassados blang e dai perceberam que, sob a copa densa da floresta primitiva, as plantas de chá estavam protegidas da luz solar intensa e beneficiavam de um microclima húmido, sustentado por uma vegetação em várias camadas. Utilizando de forma inteligente árvores, arbustos e ervas, criaram um ecossistema tridimensional no qual o chá cresce ao lado de líquenes, cogumelos silvestres e outras espécies, formando uma barreira natural contra pragas e conferindo às folhas o “sabor especial da montanha e da floresta”..Esta prática, que respeita a floresta sem a destruir, revela uma rara harmonia entre biodiversidade e diversidade cultural. Reconhecendo esta sabedoria ecológica, a 45.ª sessão do Comité do Património Mundial destacou-a como exemplo de “utilização sustentável dos recursos naturais.”As crenças animistas em que tudo tem espíritoEm Jingmai, o chá é muito mais do que uma cultura agrícola - é um elo espiritual entre as pessoas e o ambiente. O povo blang acredita que as árvores de chá têm alma; por isso, todas as plantações têm uma “árvore do espírito do chá”, venerada como guardiã da floresta. Já os dai homenageiam a “árvore divina do chá” com rituais sazonais para pedir colheitas abundantes. Este animismo ancestral funde-se com religiões posteriores e incorpora cerimónias que refletem uma filosofia de vida baseada na reverência à natureza e na gratidão pelas suas dádivas, transformando a conservação ecológica num princípio inscrito na memória coletiva.Talvez seja esta aura espiritual que leva quem visita Jingmai a sentir uma tranquilidade rara e a reencontrar o equilíbrio entre corpo e alma no abraço da natureza.Um modo de vida centrado no cháO chá está profundamente entrelaçado com o quotidiano dos habitantes de Jingmai. Nas casas da etnia blang, o fogão além de servir para cozinhar e aquecer, também é o berço da cultura do “chá torrado”: enquanto a água de nascente ferve, as folhas de chá são colocadas numa concha de madeira sobre brasas; quando o aroma se começa a espalhar, fervem-se as folhas na água, criando uma infusão dourada e intensa - ideal para aquecer o corpo, para receber convidados ou para discutir assuntos familiares..Outra tradição especial é o “convite em folha de chá”, um ritual de cortesia local em que o chá e uma vela são embrulhados numa folha de bananeira e entregues como convite simbólico. Geração após geração, este “convite verde” continua a reunir vizinhos em torno do chá, reforçando a entreajuda e cultivando a amizade. Dos casamentos aos funerais, das celebrações às reconciliações, o chá está presente em todas as fases da vida, como um símbolo cultural enraizado na alma de Jingmai.A floresta de chá de Jingmai preserva não só as técnicas de cultivo ao longo dos milénios, mas também um conhecimento profundo sobre a ligação entre ser humano e natureza, transmitido, de geração em geração, como uma herança viva, a sabedoria ecológica.Para descobrir mais conteúdos fascinantes sobre a história e a cultura chinesas, siga a nossa página no Instagram e no Facebook em “Vislumbres da China”.