Para descobrir o Mediterrâneo filmado no feminino

"Olhares do Mediterrâneo", um certame dedicado ao cinema no feminino, chega à nona edição, com várias secções competitivas e tendo o Líbano como país convidado: as projeções repartem-se entre a Cinemateca e o Cinema São Jorge.
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No campo do cinema, muitas propostas de reflexão sobre a(s) identidade(s) feminina(s) têm sido marcadas pela preocupação de contar histórias que, de uma maneira ou de outra, transportam, esclarecem e discutem experiências, interrogações e ânsias das respetivas personagens. O festival "Olhares do Mediterrâneo"- que se apresenta, precisamente, em termos internacionais, como um festival de mulheres: Women"s Film Festival - não é, obviamente, estranho a tal visão. Com uma componente que, uma vez mais, importa sublinhar e valorizar: a escolha do Mediterrâneo como espaço/tema em que passado e presente se cruzam e dialogam através das mais variadas narrativas cinematográficas.

Hoje, na Cinemateca (21h45), A Civilized People (1999), de Randa Chahal, uma coprodução França/Líbano, marca o arranque da secção "Olhares do Líbano", primeira retrospetiva de cinema libanês que se realiza em Lisboa. Trata-se de uma iniciativa organizada em colaboração com o Beirute International Women Film Festival (BIWFF), incluindo ficções e obras documentais produzidas entre 1974 e 2021. Como se sublinha no programa oficial, o objetivo é "oferecer uma amostra de uma das cinematografias mais ricas dos países de língua árabe", ao mesmo tempo dando a conhecer histórias de um país que é um "concentrado de cultura, vitalidade e diversidade, mas também de conflitos contínuos e dramáticos".

Os filmes de "Olhares do Líbano" começarão por ser mostrados de 14 a 16 de novembro na Cinemateca, continuando depois no Cinema São Jorge. As sessões da Cinemateca contarão com a presença de Sam Lahoud, diretor do BIWFF, e também da realizadora Heiny Srour que apresentará o seu documentário The Hour of Liberation Has Arrived (1974), primeiro filme de uma cineasta árabe programado pelo Festival de Cannes. Heiny Srour conduzirá também uma masterclass ("Making World-Changing Films"), a realizar no São Jorge (dia 17, 18h00).

A partir do dia 17, o festival transfere-se para o São Jorge, apresentando na sessão oficial de abertura Murina, de Antoneta Alamat Kusijanovic, filme croata coproduzido com Brasil, EUA e Eslovénia, vencedor da Câmara de Ouro (melhor primeiro filme) na edição de 2021 do Festival de Cannes. O encerramento ocorrerá no dia 20 com o tunisino Under the Fig Trees, de Erige Sehiri; coproduzido com França, Suíça, Alemanha e Qatar, centrado nas relações entre raparigas e rapazes que trabalham numa colheita de verão, é o candidato oficial da Tunísia a uma nomeação para o Óscar de Melhor Filme Internacional (a atribuir a 12 de março de 2023) - a exibição de Under the Fig Trees será uma estreia europeia.

Estes dois filmes - tal como o português Ary, de Daniela Guerra, centrado numa personagem que "não se reconhece nas categorias binárias de género, e aos 28 anos decide explorar a sua identidade", ou o italiano La Tana, de Beatrice Baldacci, encenando as atribulações de uma família do campo abalada pelo aparecimento de uma jovem de comportamento pouco ortodoxo - integram a secção de longas-metragens exibidas extraconcurso. Em paralelo, o festival propõe três categorias competitivas, cada uma com o seu júri: Curtas-Metragens, Travessias (filmes sobre refugiados, migrações e colonialismo) e Começar a Olhar - trabalhos de Filmes de Escola. Os espetadores serão convidados a votar para dois Prémios do Público (melhor curta e melhor longa-metragem).

Com direção de Antónia Pedroso de Lima, Sara David Lopes e Silvia Di Marco, o festival é uma organização do Grupo Olhares do Mediterrâneo e do CRIA (Centro em Rede de Investigação em Antropologia). Num total de 52 filmes a exibir, é especialmente significativa a presença da produção portuguesa. Além do referido Ary, será possível encontrar, por exemplo, Madrugada, de Leonor Noivo, a par de realizações de jovens que estão a começar a sua carreira como Luísa Campino (Hysteria), Beatriz de Sousa (Mesa Posta), e Sara Carregado (Vergôntea); juntamente com O Maravilhoso Mundo de Miguel (coprodução Portugal/Hungria/Bélgica), de Ghada Fikri, estes títulos são candidatos ao recém instituído Prémio INATEL para melhor filme de escola português.

A pensar no público escolar e infantil, haverá sessões no Cinema São Jorge nas manhãs de quinta, sexta-feira e domingo (11h00). Um dos filmes a exibir nessas sessões, o italiano Robots and Daises, de Viola Folador, servirá de mote para "Olhares em Pequenino", um atelier com Maria Remédio destinado a crianças dos 8 aos 11 anos, no sábado, dia 19, às 11h00 (as inscrições para esta atividade deverão ser feitas através de olharesdomediterraneo.reservas@gmail.com).

Estreia absoluta e, por certo, um acontecimento marcante desta edição de "Olhares do Mediterrâneo", será o documentário Novíssimas Cartas Portuguesas, trabalho coletivo com produção de Irina Pampim e Cecília Honório, evocando os 50 anos da publicação das Novas Cartas Portuguesas, de Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, e o seu impacto na dinâmica cultural e política dos anos finais do regime do Estado Novo - o filme, com 45 minutos de duração, será projetado numa sessão especial de acesso gratuito, sábado, às 12h00, no cinema São Jorge.

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