O Close-up traz memórias do futuro a Famalicão
É já um dos eventos que marcam o calendário famalicense por esta altura do ano, e a fasquia não baixa. Depois de temas como a comunidade, infância e juventude, ao seu 9.º episódio, como gosta de ser designado, o Close-up: Observatório de Cinema - de regresso à Casa das Artes de Famalicão entre os dias 12 e 19 - tem por mote o futuro. Entenda-se: um futuro que não depende de uma estética futurista, mas que assenta no acalentar de ideias, numa forma de percecionar “o que está por vir”, como aliás se lê no subtítulo de Futura (produção coletiva de Alice Rohrwacher, Francesco Munzi e Pietro Marcello), um dos filmes mais literais do programa, ao lado de reflexões de calibre dramático como Saint Omer, de Alice Diop, A Sala de Professores, de Ilker Çatak, ou Vidas Passadas, de Celine Song; sem esquecer os clássicos Bom dia (1959), de Yasujiro Ozu, e Videodrome (1983), de David Cronenberg. Propostas para abrir o apetite, sob o signo das “Memórias do Futuro”.
Será também o futuro que salta à vista e aos ouvidos na sessão de abertura do Close-up (dia 12, 21h45), entre o surrealismo de Luis Buñuel e Salvador Dalí, na obra alucinante Um Cão Andaluz (1929), e as sonoridades de Surma, que a revestem num cine-concerto de alta expectativa. Ou não fosse esta uma tradição identitária do Observatório, como explica ao DN o programador Vítor Ribeiro: “Desde a sua primeira edição em outubro de 2016, o Close-up colocou os cine-concertos, muitas vezes em estreia, como um dos destaques do programa. Inicialmente, prevaleceu a relação do cinema com a música, privilegiando-se revisitas à história do cinema, alargando o acesso de obras importantes a um maior número de espectadores. E nas edições seguintes a prática solidificou-se, procurando uma intencionalidade da relação do Close-up com a programação da Casa das Artes de Famalicão, um Teatro Municipal que privilegia a criação artística nas diversas disciplinas: a música, o teatro, a dança e o cinema.”
Em anos anteriores passaram por aqui nomes como The Legendary Tigerman, Mão Morta ou Dead Combo, e “esta edição tornou mais diversificadas as abordagens, na procura do alcance de diversos públicos”, sublinha também Vítor Ribeiro, notando que para as famílias o ideal serão duas curtas de Chaplin (Charlot Prestamista e O Emigrante) musicadas pela Orquestra da Costa Atlântica, no dia 13, pelas 11h30. O programador recomenda ainda Glimmer, no encerramento do Close-up (dia 19, 21h45), “um espetáculo de cruzamento, de fusão de uma coreografia de Rui Horta com a música dos Micro Audio Waves, e uma circulação de imagens que apontam para o futuro, a tentar rebentar com o conceito de cine-concerto.”
Este ano, outro dos principais destaques será a homenagem ao cineasta americano William Friedkin, “um dos grandes autores saídos da Nova Hollywood”, período que se “edificou em cima da crise e do consequente colapso dos estúdios da Hollywood clássica, num contexto de profundas transformações sociais e culturais na América, e com a chegada ao poder de um conjunto de novos cineastas que asseguraram uma notável marca autoral no reflexo das turbulências políticas da época, como a guerra traumática do Vietname ou o escândalo Watergate”, contextualiza Vítor Ribeiro.
São então quatro títulos dessa época específica que encontramos no cartaz: o célebre oscarizado Os Incorruptíveis Contra a Droga (dia 13, 21h30), O Comboio do Medo (dia 14, 21h30), O Exorcista (dia 18, 00h00) e A Caça (dia 19, 14h30). Um ciclo que dialoga com a exposição ‘Imagens da Nova Hollywood’, desenvolvida em parceria com o Museu de Cinema de Melgaço, patente no foyer da Casa das Artes até ao final de dezembro.
Já no capítulo do cinema português, a Fantasia Lusitana está nesta edição ao cuidado da dupla João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata, realizadores e cinéfilos cuja última obra, Onde Fica Esta Rua? Ou Sem Antes Nem Depois, na relação com Os Verdes Anos (1963), de Paulo Rocha, inspira toda uma narrativa e debate sobre o Cinema Novo e a produção do pós-25 de Abril. Para além de uma masterclasse (dia 17, 11h00, na ESAP), aos cineastas foi também dada uma carta branca, “que resultou na escolha de duas longas-metragens - Dina e Django (1981), de Solveig Nordlund, e As Ruínas no Interior (1976), de José Sá Caetano - que explicitam o mapa de relações entre o seu trabalho e os filmes, e as afinidades geradas dentro de várias gerações de cinema português”, realça o programador.
Tudo isto e mais qualquer coisa num encontro à volta dos filmes que nunca perde o gosto pela palavra: todas as sessões são comentadas por especialistas, e há um trabalho intenso junto das escolas locais. É esta a filosofia do Close-up.