Revisitando as memórias televisivas do atentado de 5 de setembro de 1972.
Revisitando as memórias televisivas do atentado de 5 de setembro de 1972.

'O Atentado de 5 de Setembro'. A televisão face à tragédia

Nos Jogos Olímpicos de Munique, em 1972, atletas israelitas foram alvo de um brutal ataque terrorista - a tragédia é agora objeto de O Atentado de 5 de Setembro, filme sobre o trabalho jornalístico.
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É verdade que o mercado cinematográfico português tem evoluído no sentido de uma maior diversificação da oferta, quer nas salas, quer nas plataformas de streaming. O certo é que, por vezes, a avalanche de estreias tende a “apagar” da atualidade alguns filmes que mereciam mais e melhor atenção. Esperemos que O Atentado de 5 de Setembro, lançado na quinta-feira, não seja uma dessas vítimas comerciais de uma abundância recheada de equívocos. 

Estamos perante um projeto enraizado num dramatismo clássico, apoiado num leque de talentosos atores — Peter Sarsgaard, John Magaro, Ben Chaplin, Leonie Benesch, etc. —, abordando um episódio trágico na história das Olimpíadas. Trata-se de evocar o ataque terrorista perpetrado pela organização palestiniana Setembro Negro durante os Jogos Olímpicos de Munique, no dia 5 de setembro de 1972, contra um grupo de atletas de Israel. 

O atentado saldou-se pela morte de todos os reféns, sendo escusado sublinhar que as suas ondas de choque marcaram, não apenas as convulsões no Médio Oriente, mas também a história política da Alemanha e, em última instância, de toda a Europa. As suas memórias, e também os seus ecos nas dinâmicas da geo-política, foram várias vezes objeto de tratamento cinematográfico ou televisivo — Munique (2005), de Steven Spielberg, constitui uma referência central de tais memórias. 

Resultante de uma coprodução EUA/Alemanha, o filme realizado pelo suíço Tim Fehlbaum (também co-autor do argumento) envolve um elaborado processo de “reconstituição”, muito cuidado no plano cenográfico e tirando excelente partido das imagens televisivas que deram conta dos acontecimentos. Em qualquer caso, importa sublinhar uma nuance que está longe de ser banal: O Atentado de 5 de Setembro não se esgota numa inventariação do que dominou as notícias desses dias, já que envolve a própria produção das notícias. 

Dito de outro modo: este é um filme em grande parte encenado num espaço fechado — os estúdios da estação televisiva americana ABC em Munique —, dando conta do misto de perplexidade e urgência com que toda uma equipa de jornalistas lidou com a tragédia que se estava a consumar. O Atentando de 5 de Setembro consegue mesmo relançar, com invulgar didactismo, as componentes de uma tradição narrativa de Hollywood em que se expõem os mecanismos técnicos e éticos que pontuam o trabalho jornalístico e, muito em particular, o direto televisivo. 

Escusado será dizer que tudo isso confere a O Atentado de 5 de Setembro um leque de ressonâncias que importa não secundarizar. Assim, por um lado, somos confrontados com as especificidades políticas e mediáticas de um contexto muito especial; ao mesmo tempo, por outro lado, mesmo sabendo que a história não se “repete”, compreendemos que as personagens dos jornalistas da ABC enfrentam um leque de questões narrativas e deontológicas cuja atualidade e pertinência não desapareceram. 

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