Cinco policiais para as cinco semanas de agosto
Até há pouco tempo, o escritor irlandês John Banville utilizava o pseudónimo Benjamin Black para os seus livros policiais, protagonizados pelo patologista Quirke. Agora, assume esses policiais com o próprio nome, talvez porque deixou de aspirar ao Nobel da Literatura, - a Academia Sueca não premeia este género literário. Portanto, passou a sujeitar-se ao julgamento dos leitores e põe de lado o júri que poderia conceder-lhe o prémio pela sua literatura de grande qualidade de décadas.
O seu mais recente policial traduzido para português tem como título Abril Em Espanha e retoma as aventuras de Quirke, que viaja contrariado para San Sebastián, onde descobre um motivo para investigar e, principalmente, ocupar o tempo livre a que as férias obrigam. Em muito, o registo é do romancista e não o do autor de policiais, pois conjuga a arte de John Banville com o propósito de Benjamin Black. Nada que obste a uma leitura apaixonada do princípio ao fim de uma narrativa onde os intrincados meandros do policial são aligeirados para caracterizar os personagens como os de um romance onde, não havendo um crime, existe um mistério que puxa pelo leitor.
Na contracapa desvenda-se um pouco da história: Quirke vê uma mulher que lhe faz lembrar outra que foi assassinada em Dublin e não descansa enquanto não descobre a solução. É daí que vem o título, um bom trocadilho, e que alimenta a investigação do patologista, que conta com um bom espécime de bandido e uma filha que o auxilia na descoberta do mistério que lhe veio animar as férias. São quase quatrocentas páginas em capítulos que alternam a titularidade dos personagens, com desvios frequentes destinados a enganar o leitor, que só respira de alívio mesmo na reta final.
John Banville
Minotauro
373 páginas
UM POLICIAL SOCIOLÓGICO
Álvaro Filho já publicou outros romances com cenários de crime e de investigação, como Alojamento Letal, em que a simbologia protagonizava um importante papel. Desta vez, em O Mau Selvagem, a história tem três tempos: inicialmente, tudo indicia ser mais uma análise sociológica da xenofobia nacional para com os imigrantes brasileiros do que a antecipação de uma investigação – talvez a melhor caracterização desse sentimento sempre presente e continuadamente negado na sociedade portuguesa. A meio, o cenário da livraria, onde a maioria dos funcionários é de origem brasileira, serve aos propósitos do autor para criar um mistério que é necessário o protagonista esclarecer. A terceira fórmula, sustenta-se na adaptação da técnica do policial noir para continuar e completar a investigação.
O livro está repleto de situações de vida e de citações literárias que se encaixam na perfeição, desde logo com um título que resulta na perfeição e que vem do mito ingénuo e insensato de Rousseau do Bom Selvagem, fazendo com que o leitor participe também na descoberta da solução para o que acontece ao protagonista. Um romance passado em Lisboa e no qual se reveem muitas paisagens urbanas apropriadas para a ação da história enquanto vão surgindo questionamentos sociais que, conforme a trama avança, o autor torna a sua crítica social mais abrangente, e coloca a par da xenofobia nacional também a questão de classe no Brasil. Chegados ao fim, o mistério é resolvido, com uma solução própria de Raymond Chandler. De referir a existência de um prefácio de Gonçalo M. Tavares que abençoa O Mau Selvagem de uma forma inesperada.
Álvaro Filho
Urutau
178 páginas
CRIME COM QUEIJO DE CABRA
Na senda dos novos autores de policiais britânicos, os que marcam presença na televisão, vem um policial pouco cómico do comediante Ian Moore. Após Morte e Croissants, o autor muda a ementa para Morte e Fromage, continuando a situar as histórias no Vale de Follet, na região do Loire, onde um dos protagonistas administra uma pequena pensão. Apesar de pouco ou nada acontecer naquele recanto perdido, Richard vê-se envolvido na investigação que uma das suas hóspedes inicia após o aparente suicídio de um fornecedor de queijo para um restaurante próximo que acabara de perder uma das três estrelas Michelin do estabelecimento. Como diz o autor, os franceses levam o queijo muito a sério, e o autor imita-os na sua recriação neste policial.
Ian Moore
Porto Editora
367 páginas
POLICIAL NÓRDICO
O nome do escritor nórdico Jorn Lier Horst é sempre significado de mais um policial desta região da Europa que foi catapultada para o interesse dos leitores do resto do continente pelo sucesso da trilogia Millennium de Stieg Larsson. Já com vários livros editados em língua portuguesa, desta vez Horst surge acompanhado em Perto do Abismo de um parceiro, Thomas Enger. A trama não foge ao habitual suspense que existe nos livros de ambos, com uma detetive morta, uma ameaça de assassínio pendente, e uma corrida desenfreada para que um responsável da polícia e um jornalista impeçam novas tragédias. Se Horst sozinho já era sedutor na escrita dos seus thrillers, agora na companhia de Enger ainda torna a leitura mais elétrica para quem se sente atraído com os bastidores mais negros da sociedade norueguesa.
Jorn Lier Horst & Thomas Enger
D. Quixote
390 páginas
MAIS POLICIAL NÓRDICO
Da Islândia vêm sempre uns autores de nome complexo e a nova estrela do policial daquele país, Eva Björg Aegisdóttir, não foge ao habitual. O título é simples, O Ruído Na Escada, mas não a intriga que movimenta este primeiro thriller que a autora publica. Que deverá ter continuação pois tem a indicação de ser o primeiro volume da série Islândia Proibida. Tudo começa com o corpo de uma mulher que aparece num farol, crime para que uma detetive e dois colegas têm de encontrar a causa e o responsável pelo acontecido. Bem definida como uma história claustrofóbica, beneficia-se em muito da personalidade da protagonista principal, que irá revolver o passado da vítima e do local, encontrando respostas indesejadas.
Eva Björg Aegisdóttir
Quetzal
368 páginas