Celso da Costa, o matemático que nasceu como escritor aos 73 anos
Chama-se Celso José da Costa e é um nome familiar a quem trata a Matemática por tu, mais propriamente a disciplina de Geometria Diferencial. Mas desde esta 4.ª feira, 26 de outubro, Celso, nascido no Estado do Paraná, Brasil, há 73 anos, passou a ser também romancista, já que o Prémio Leya, na sua edição de 2022, foi atribuído ao seu original, "A Arte de Driblar Destinos". Assim o decidiu um júri presidido por Manuel Alegre, de que fizeram parte o poeta e professor Nuno Júdice, a escritora angolana Ana Paula Tavares, a jornalista e crítica literária Isabel Lucas, o editor e jornalista brasileiro Paulo Werneck, José Carlos Seabra Pereira, professor de Literatura Portuguesa na Universidade de Coimbra e Lourenço do Rosário, fundador e antigo reitor da Universidade Politécnica de Maputo.
Distinguida entre os 218 originais a concurso, provenientes de Portugal, Alemanha, Brasil, Espanha, Holanda, Inglaterra, Moçambique e Polónia, esta Arte de Driblar Destinos obteve a unanimidade do júri, que, na sua declaração de voto, realça a importância do tema: "(...) É o processo de educação de um jovem em contextos nem sempre fáceis, e joga entre o pícaro e o trágico, num equilíbrio que se mantém, desde o início, quando o narrador evoca o fascínio que sobre ele exerce, aos 5 anos, a trupe que vai montar o espetáculo de uma tourada".
Mas para esta decisão "pesou" também o tratamento narrativo que este autor-revelação deu à história que se propôs contar: "Ressalta o modo como o narrador vai encontrando o seu caminho escolar com a Matemática, ganhando um ascendente que o levará, no final, a ser encaminhado para completar os estudos na cidade de Curitiba, deixando para trás os espaços em que decorrera a infância e a adolescência."
DestaquedestaqueA história do seu romance de estreia é difícil de dissociar da do escritor, já que também ele se libertou da pobreza endémica no seu estado-natal através da dedicação ao estudo da Matemática.
Como explicou Nuno Júdice na cerimónia de anúncio do prémio, "foi decisiva para nós a maneira como o livro nos prende, desde que nele pegamos, com a introdução de personagens do mundo rural e dos seus conflitos, sem que isso faça dele um romance ruralista ou etnográfico. Cada personagem tem uma existência própria e é muito diferente das outras, o que confere uma grande densidade ao livro. Por outro lado, também nos agradou a importância que o autor confere à Educação como agente de modificação dum destino."
José Carlos Seabra Pereira e Manuel Alegre destacaram, por sua vez, a "coerência orgânica com que são desenvolvidas as várias histórias que fazem parte da história pessoal do narrador."
Uma história que, diga-se de passagem, é difícil dissociar da do escritor, já que também ele se libertou da pobreza endémica no seu estado-natal através da dedicação ao estudo da Matemática. Distinguido no Brasil com a Ordem Nacional do Mérito Científico, Celso José da Costa doutorou-se no Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) do Rio de Janeiro, com uma tese na área da Geometria diferencial.
De acordo com os especialistas, a superfície mínima descoberta na sua tese resolveu um antigo problema nesta área de estudos. Mais concretamente, ele encontrou uma quarta superfície mínima, agora denominada internacionalmente como Costa"s Surface (Superfície Costa). Atualmente, o matemático é professor titular da Universidade Federal Fluminense, onde lidera um grupo de pesquisa.
Com o valor de 50 mil euros, o Prémio Leya é o maior prémio literário para romances inéditos em língua portuguesa. Ao longo de todo o processo de leitura e avaliação, a autoria das obras é desconhecida. O nome do autor distinguido, selado em sobrescrito, apenas é conhecido depois de tomada a decisão do júri.
Instituído em 2008, o Prémio Leya já distinguiu obras de Murillo Carvalho, João Paulo Borges Coelho, João Ricardo Pedro, Nuno Camarneiro, Gabriela Ruivo Trindade, Afonso Reis Cabral, António Tavares, João Pinto Coelho, Itamar Vieira Júnior e José Carlos Barros. O prémio não foi atribuído nos anos de 2010, 2016 e 2019.
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