Polémica no São Luiz. Ator substituído afirma-se "violentado e castrado"
André Patrício recomenda a ativistas transexuais que provocaram a sua substituição em peça de teatro que aproveitem a "visibilidade" obtida para atuar de forma mais "inteligente e sensata".
Com uma nota nas stories da sua página no Instagram, o ator André Patrício afirmou que o protesto do ativista transsexual que deu origem à sua substituição numa peça em exibição do Teatro Sâo Luiz, em Lisboa, o fez sentir-se "violentado e castrado" na sua arte e no seu trabalho.
André Patrício começa na sua nota por esclarecer que a sua substituição (por uma atriz transexual) no papel de da personagem transexual Lola na peça Tudo sobre a minha mãe não significa que tenha sido completamente afastado do elenco: "Não saí da peça, como várias pessoas escrevem ou pensam. Porque faço mais três personagens. (A situação teria sido bem diferente se eu tivesse ficado desempregado)."
"Não sou a favor da violência nem da invasão de palco. Senti-me violentado e castrado na minha arte, no meu trabalho."
Depois salienta ser "totalmente a favor da igualdade de oportunidades, de direitos e da inclusão" e isto "no trabalho em geral, não só nas artes, seja na sociedade".
Porém, esclarece: "Não sou a favor da violência nem da invasão de palco. Senti-me violentado e castrado na minha arte, no meu trabalho. Também nós, trabalhadores da Cultura (cis ou trans) somos uma minoria. Não temos as devidas e igualitárias condições de trabalho na nossa área. E lutamos para sobreviver", escreveu.
"Não concordo com o boicote a um espetáculo que por si só já era uma plataforma de visibilidade e apoio à inclusão."
Para o ator, "a forma escolhida de protesto não foi a adequada" porque o "desrespeita" no seu "empenho enquanto profissional", sendo esse "exatamente o direito" pelo qual os atores transexuais lutam.
Ou seja: "Fazer-se ouvir é um direito, rasgar é uma agressão" e "não é com desrespeito e injustiça que se consegue respeito e justiça": "Não concordo com o boicote a um espetáculo que por si só já era uma plataforma de visibilidade e apoio à inclusão".
A concluir, André Patrício que tanto a sua contratação (para desempenhar uma personagem trans) como agora a sua substituição são questões que o "ultrapassam". E recomenda aos ativistas que agora usem a visibilidade obtida de forma "mais inteligente e sensata".
Na passada quinta-feira, durante uma das sessões da peça, uma ativista transexual brasileira, Keyla Brasil, invadiu o palco em protesto contra a escolha do ator cisgénero André Patrício para a personagem transexual "Lola", questionando o porquê de não ter sido contratada uma atriz trans - algo que caracterizam como "transfake".
Depois do protesto, o Teatro São Luiz anunciou que iria substituir o ator André Patrício pela atriz trans Maria João Vaz na interpretação de "Lola".
"No seguimento de vários atos de contestação pela representação de uma personagem trans por um ator cis e pela criação de condições de acesso e representatividade para pessoas trans, o Teatro do Vão decidiu alterar o elenco do espetáculo Tudo Sobre A Minha Mãe", escreveu o Teatro São Luiz numa publicação na rede Facebook.
Por sua vez, o Teatro do Vão, responsável por esta adaptação, assumiu que poderia "ter feito outra opção, no que respeita à inclusão de pessoas trans", lamentando o sucedido.
Na peça, baseada no filme homónimo do realizador espanhol Pedro Almodóvar, já existe um outro personagem transexual, "Agrado", essa sim interpretada desde o início pela atriz transexual brasileira Gaya de Medeiros.
O diretor artístico, Daniel Gorjão, já tinha dito que queria também contratar uma outra atriz transgénero para a personagem "Lola". Contudo, constrangimentos orçamentais impediram-no disso. Resolveu-se colocando-se um ator, André Patrício, a desempenhar quatro papéis (agora três, depois de ter ficado sem "Lola").