Há muito que ansiamos por prever a ocorrência de grandes sismos. Que explicações encontra para a ciência não revelar progressos significativos na previsão de sismos catastróficos? Durante décadas, procuraram-se fenómenos premonitórios e ainda hoje se busca, na medição de pequenos movimentos à superfície, na ionosfera, ou até no comportamento dos animais, um sinal que nos possa avisar de que um grande sismo se aproxima. Até hoje sem grandes resultados. No passado, o grande avanço no conhecimento da geração de sismos foi dado pelo modelo concetual que designamos por tectónica de placas. Na segunda metade do século XX compreendeu-se que a camada sólida exterior do nosso planeta se poderia aproximar, como um conjunto de placas quase rígidas que se movimentariam com uma velocidade aproximadamente constante, umas em relação às outras, como cascas sólidas na camada exterior do planeta. E que os sismos eram essencialmente determinados pelo movimento relativo entre os diversos blocos. O advento e generalização dos sistemas de posicionamento global por satélite permitiram determinar as velocidades e as fronteiras desses blocos, e verificar como elas coincidiam bem com os epicentros dos sismos que as redes de observação já estavam a determinar com precisão desde há quase um século. A Física tem demonstrado uma grande capacidade de olhar para um sistema complexo, identificar os seus elementos fundamentais, e representá-lo como um conjunto de regras que permitem muitas vezes determinar de forma bastante precisa a sua evolução futura. Sempre que um grande terramoto destrói vidas e bens, em qualquer parte do mundo, a sua interpretação em termos de tectónica de placas circula abundantemente nos media. Quem não sabe que o continente português é afetado pelo movimento relativo entre a África e a Eurásia? Claro que os puristas diriam “entre a placa Núbia e o bordo sudoeste da placa Euro-asiática”. Este modelo foi muito importante, mas não explica tudo. E não permite prever..A previsão não beneficia de novas abordagens que envolvam a Inteligência Artificial? Não existem verdades científicas definitivas e a ciência envolve sempre uma margem importante de controvérsia. No caso dos sismos esta margem é grande, porque a região onde os sismos são formados não é diretamente acessível, a sua constituição é muito heterogénea, e a relação entre a dinâmica profunda e os processos de rutura que libertam a energia que nos impacta ainda é pouco compreendida, pelo menos ao ponto de a podermos simular com realismo. Mesmo as novas abordagens baseadas no que se designa por Inteligência Artificial e que prometem simular os processos naturais “sem os compreender” tropeçam na falta de conjuntos de dados da geologia profunda suficientemente densos e frequentes para poderem alicerçar a inferência do seu comportamento futuro..Não obstante todas as dificuldades que elenca, estamos hoje mais bem preparados para estudar a dinâmica profunda da Terra? Há uma crescente capacidade europeia e nacional neste domínio. Sendo absolutamente necessário estudar os processos profundos nas regiões oceânicas, e no nosso caso, do Atlântico, é hoje possível construir sensores sísmicos capazes de operar a milhares de metros de profundidade, distribuí-los de forma a melhor captarem as ondas sísmicas que todos os dias atravessam o globo, processar de forma sofisticada o sinal sísmico e, a partir dele, caracterizar os fluxos que ocorrem no manto e que determinam, em grande parte, a morfologia e o vulcanismo à superfície. Portugal é um país onde o risco vulcânico é muito significativo nas ilhas atlânticas, e que pode também ser afetado por fenómenos eruptivos com origem nas Canárias, que em condições extremas incluem o risco de geração de tsunamis..Pode um sistema de alerta precoce ser eficaz no caso dos sismos? Incapazes de prever os acontecimentos sísmicos extremos, o esforço virou-se para a possibilidade de ser utilizado o período durante o qual ocorre a rutura, que pode atingir dezenas de minutos, para comunicar rapidamente a todos os locais que vão ser atingidos, utilizando o facto de as ondas eletromagnéticas que transmitem a informação serem muitíssimo mais rápidas do que as ondas sísmicas. Estes sistemas de alerta precoce que se tornaram conhecidos na área dos tsunamis ainda não são operacionais na maioria dos países. São grandes os avanços obtidos na utilização crescente dos cabos submarinos como sensores sísmicos. As conferências da Academia mostraram que a comunidade nacional está atenta a estes desenvolvimentos e existem capacidades e vontades suficientes para o seu desenvolvimento. Estamos, assim, muito perto do desenho e operação de um sistema eficiente de alerta precoce de sismos. Sismos cuja magnitude seja semelhante à do evento de 26 de agosto, com epicentro no mar, poderiam dar-nos alguns segundos de grande importância para os sistemas automáticos de controlo de infraestruturas críticas e, num futuro - que queremos próximo -, dos comboios de alta velocidade. Sismos de maiores magnitudes e epicentro na região onde se pensa terão nucleado os maiores acontecimentos históricos poderiam dar-nos alguns minutos, de importância fundamental. Contudo, sismos em terra, em áreas populosas, serão sempre altamente destruidores.