A região apresentou a sua candidatura ao título de Cidade Europeia do Vinho 2026, uma distinção que poderá consolidar ainda mais a sua identidade vitivinícola e impulsionar o enoturismo. Nesta entrevista, o presidente da Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo, José Santos, explica o impacto da candidatura, a união entre os municípios envolvidos e o que esta distinção poderá significar para o futuro da região.O que motivou a decisão de candidatar o Baixo Alentejo a Cidade Europeia do Vinho 2026?O Baixo Alentejo tem uma atmosfera singular, destacando-se dentro da já consagrada região vitivinícola do Alentejo. É reconhecido que os consumidores portugueses preferem os vinhos alentejanos, o que comprova a sua enorme qualidade. Dentro desta vasta região, o Baixo Alentejo distingue-se pela forma como o vinho se cruza com a história, o património e a cultura. Esta simbiose entre vinho, paisagem e identidade local é particularmente forte nesta área. Estamos a construir uma candidatura que representa os produtores de vinho e o setor do enoturismo, sem falar de toda a comunidade e o território do Baixo Alentejo.Como é que a Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo e a Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo trabalharam na construção desta candidatura?Esta candidatura assenta num programa sólido de eventos e iniciativas que irão decorrer em 2026, caso a região seja eleita Cidade Europeia do Vinho. O processo envolve auscultação dos municípios e dos produtores para integrar as suas visões e planos futuros. A ideia é criar uma programação diversificada, mantendo e aprimorando eventos já existentes, mas também introduzir novas iniciativas que impulsionem o Baixo Alentejo para uma dimensão internacional. Atualmente, o nível de internacionalização da região é inferior ao do litoral alentejano ou de Évora, e queremos mudar isso. A candidatura está praticamente concluída, e acreditamos que será forte e competitiva.A tradição da talha é um dos pilares desta candidatura. Como é que isso contribui para a valorização da região no contexto europeu?A produção de vinho de talha no Baixo Alentejo remonta há mais de dois mil anos, e mantém-se viva nas pequenas aldeias e vilas, como Vila Alva, Vila de Frades e Ervidel. Este vinho tem um significado cultural profundo e é um orgulho da comunidade, uma tradição de partilha e até de competição amigável entre vizinhos, cada um a querer produzir o melhor vinho de talha. Embora esta prática exista noutras partes do Alentejo, é no Baixo Alentejo que assume maior expressão. O vinho de talha já está inscrito no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial e foi candidatado pelo município da Vidigueira a Património Cultural Imaterial da Humanidade. Há, por tudo isto, um grande otimismo em relação a esta candidatura. Além disso, o vinho de talha tem sido um elemento central na criação de eventos temáticos que trazem produtores de outras regiões, como por exemplo a Geórgia, que também tem uma forte tradição nos vinhos de ânfora, o que estabelece pontes culturais e reforça a internacionalização da região. Este vinho, assim, um dos pilares mais fortes da candidatura do Baixo Alentejo, liga a região à sua história e ao seu património de forma intensa e muito autêntica. . A região tem conquistado vários prémios nos últimos anos nas áreas do Vinho, Turismo e Sustentabilidade… Estas distinções também fortalecem a candidatura?Sim, claro. A qualidade dos vinhos do Baixo Alentejo é inegável. O vinho desta região é, ao mesmo tempo, um reflexo da sua identidade, cultura e tradição, o que consolida ainda mais a candidatura e representa o que de melhor o Baixo Alentejo tem para oferecer. Mas além da excelência dos vinhos, destaca-se o ecossistema turístico construído ao seu redor, tornando-o num setor dinâmico, diversificado e em constante crescimento. Hoje, o enoturismo no Baixo Alentejo apresenta uma oferta de alojamento de grande qualidade. Não é por acaso que algumas das melhores unidades hoteleiras de Portugal – e até da Europa – se encontram nesta região. Mas há também espaço para formas mais intimistas e autênticas de Enoturismo, onde as atividades de animação ganham protagonismo. O Enoturismo alia-se, também, e cada vez mais, a conceitos como o bem-estar e a saúde, integrando experiências de wellness e turismo de natureza. Um exemplo inspirador é o crescimento de empresas de animação turística lideradas por mulheres, cujo empreendedorismo tem sido essencial para revelar a riqueza patrimonial do Baixo Alentejo através de tours e outras experiências envolventes. E a diversidade da região não se esgota aqui. O Baixo Alentejo é também território de pequenas adegas familiares, onde o vinho se faz entre amigos e onde os turistas encontram uma experiência genuína e cativante. E há ainda enoturismos que transcendem a tradição, transformando-se em verdadeiras galerias de arte, com espaços dedicados à arte contemporânea, que complementam a experiência vínica. Esta mescla de ofertas cria um ecossistema muito dinâmico, em que a qualidade da restauração, a riqueza das experiências e a autenticidade do ambiente atraem talentos. . E esses talentos acabam também por contribuir para essa dinâmica…Sem dúvida. Dou o exemplo de jovens e promissores chefs que escolhem o Baixo Alentejo para dar asas à criatividade, muitos deles formados em escolas de hotelaria de referência, como a de Portalegre. Eles vêm porque aqui encontram dinamismo, movimento, um cenário propício à inovação gastronómica.E em relação à sustentabilidade, o Baixo Alentejo tem correspondido às tendências atuais?É impossível falar da evolução do Baixo Alentejo sem destacar o comprometimento com a sustentabilidade. No âmbito do Plano de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo, já mais de uma dúzia de produtores aderiram e certificaram-se, tornando-o num projeto pioneiro a nível europeu e mundial. Esta aposta vem reforçar o posicionamento do Baixo Alentejo como uma grande região vitivinícola, capaz de conciliar, com mestria, empreendedorismo, sustentabilidade, hospitalidade, cultura e paisagem. E, já que falámos anteriormente de Vinho, Turismo e Sustentabilidade, a fechar este arco com força e emoção, está o cante alentejano, Património Imaterial da Humanidade, que dá alma a esta terra e ao seu povo.Tem sido um trabalho contínuo... o que falta ainda fazer?Eu diria que agora estamos numa fase em que queremos também certificar as adegas do ponto de vista turístico. Repare que esta nossa candidatura do Baixo Alentejo é enquadrada num programa estratégico de valorização do vinho que é liderado pela Entidade de Turismo do Alentejo e Ribatejo, que elegeu o vinho. O produto estratégico de desenvolvimento do Alentejo para os próximos cinco anos é o vinho e o enoturismo. E esta candidatura vai beneficiar com isso porque nós temos vários eventos, vários projetos que vão ser financiados pelos fundos estruturais da União Europeia, que vão densificar e alimentar a própria candidatura. Um projeto tem a ver com a certificação das adegas, que vai ser liderado pela Associação Portuguesa de Enoturismo, e que vai melhorar a qualidade dos eventos temáticos que já se realizam no território.Melhorar em que perspetiva?Por exemplo, a Vitifrades, que é um evento muito singular, muito interessante, mas que precisa de melhorar a qualidade da sua infraestrutura, a qualidade da sua programação, a sua própria divulgação. E, além deste tipo de eventos, projetos que tenham a ver com a internacionalização, que criem valor e ponham o turismo e o vinho do Alentejo a ser promovidos cada vez mais nos mercados internacionais. E também projetos de natureza privada ligados à criação de novos alojamentos, de mais empresas de animação turística… Tudo isto é estratégico! Esta candidatura a Cidade Europeia do Vinho tem um racional regional que a envolve e que lhe dá valor, o PROVERE (Programa de Valorização Económica dos Recursos Endógenos). Nós podíamos ter escolhido para o nosso PROVERE outro tema. Se olharmos para o país, outras regiões escolheram outras temáticas, outros recursos endógenos que são importantes para o seu desenvolvimento. Nós aqui no Alentejo e no Baixo Alentejo dissemos que o vinho e o turismo têm aba larga, onde cabe tudo, a cultura, a paisagem, a agricultura, a sustentabilidade, a literatura, a história, e isso fortalece muito a candidatura.Todas essas vertentes ajudam também a atrair mais turistas…Sim, é isso que queremos. O aumento da internacionalização é um dos nossos principais objetivos. A média de turismo internacional no Alentejo situa-se entre os 34% a 35%, enquanto no Baixo Alentejo é de cerca de 25%. Caso sejamos distinguidos, o título de Cidade Europeia do Vinho pode ser um excelente instrumento para atrair mais turistas estrangeiros, principalmente enoturistas. Outro ponto importante é gerar mais valor para os produtores, especialmente no que diz respeito ao crescimento das vendas de vinhos diretamente nas adegas, que já estão a aumentar. Por fim, é essencial continuar a impulsionar o produto enoturismo dentro das próprias adegas, onde também estamos a assistir a um crescimento significativo.Como tem sido o entendimento entre os treze municípios envolvidos nesta candidatura? A união tem sido fácil ou nem por isso…?Naturalmente, há concelhos com uma tradição vitivinícola mais forte e, inclusive, pelo menos dois não têm a mesma produção de vinho. Mas o objetivo é comum: o vinho é um motor de desenvolvimento para a região. Há um entendimento muito claro entre os presidentes de Câmara sobre o papel que o vinho desempenha no crescimento do Baixo Alentejo, e isso tem sido essencial para o processo. Existe, por isso, uma grande união, uma partilha de valores e de identidade que vai além do vinho. Estamos a falar do cante, do turismo, da valorização das comunidades locais… Esse sentimento de cooperação tem resultado num trabalho muito sólido e consistente, independentemente do peso que o vinho tem em cada concelho. Acho que todos imaginam quais são aqueles onde a produção tem maior expressão, não é preciso dizer (risos), mas o envolvimento tem sido geral. E a Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo tem tido um papel fundamental neste processo, unindo os presidentes e mantendo uma relação próxima com eles. Essa articulação tem sido essencial para a construção desta candidatura.Há outras regiões candidatas e a concorrência é forte. Acredita que o Baixo Alentejo vai vencer?Portugal é um país fortíssimo em turismo e vinho, por isso, a competição será sempre desafiante e ao mesmo tempo salutar. Estamos preparados para esta disputa e vamos encará-la com profissionalismo, e fazer o nosso melhor para garantir que no dia 30 de abril, no Alandroal, tenhamos conseguido conquistar a confiança dos 144 associados da AMPV para eleger o Baixo Alentejo. Se não vencermos, continuaremos a receber todos de braços abertos, como sempre fazemos aqui no Baixo Alentejo. No passado, já tivemos o excelente exemplo de Reguengos de Monsaraz, cidade do vinho em 2015, que projetou toda a região e nos deixou importantes aprendizagens. Inspirados nessa experiência, estamos a trabalhar com pessoas que conheceram outras candidaturas, que têm visitado diferentes cidades e regiões da Europa. O benchmarking é fundamental, e estamos a trazer para a nossa candidatura os melhores ensinamentos de projetos anteriores, tanto no Alentejo como noutras partes da Europa. Caso consigamos vencer, o mais importante nisto tudo é criar um território mais dinâmico e próspero, e essa distinção também representaria um impulso para a própria autoestima das comunidades.Que mensagem gostaria de deixar a todos aqueles que apoiam esta candidatura?Confiem em nós, estamos a trabalhar com dedicação! A atmosfera do Baixo Alentejo, o ambiente que se respira nesta região é verdadeiramente único. Quem nos visita sente isso, independentemente do seu percurso ou posição. Acreditamos plenamente que, em 2026, podemos trazer para o nosso Alentejo - Baixo Alentejo - o título de Cidade Europeia do Vinho.Este artigo é da total responsabilidade do(s) autor(es).