Autarca de Loures demite-se da presidência da Federação da Área Urbana de Lisboa do PS
O presidente da Câmara de Loures, Ricardo Leão, demitiu-se da presidência da Federação da Área Urbana de Lisboa ( FAUL) do PS, na sequência das polémicas declarações que fez sobre despejos de inquilinos de casas municipais durante uma reunião da autarquia, na qual foi aprovada uma recomendação do Chega.
Ricardo Leão defendeu o despejo "sem dó nem piedade" de inquilinos de habitações municipais que tenham participado nos distúrbios que ocorreram na Grande Lisboa, após a morte de Odair Moniz, baleado por um agente da PSP na Cova da Moura, na Amadora.
O autarca refere em comunicado que se demitiu da presidência da FAUL do PS para evitar que o partido seja prejudicado pela polémica suscitada pela aprovação de uma recomendação do Chega na autarquia.
Numa nota divulgada esta quarta-feira, Ricardo Leão agradeceu a "solidariedade e apoio" manifestado "por todos" os presidentes de concelhias da Federação da Àrea Urbana de Lisboa (FAUL) do PS e "por todos" os presidentes de câmara eleitos no distrito de Lisboa.
"Não obstante, entendi ser esta a melhor decisão para me focar no meu trabalho na Câmara Municipal de Loures e prevenir que o Partido Socialista seja prejudicado por uma polémica criada pela descontextualização de uma recomendação aprovada por 64% dos vereadores da Câmara Municipal de Loures", declarou.
Na nota em que comunica a sua demissão da estrutura socialista da área urbana de Lisboa, Ricardo Leão disse rejeitar "a associação entre criminalidade e imigração", afirmando que nunca fez essa associação, considerando que seria "atentatório dos valores humanistas do socialismo democrático e internacionalista".
"Continuarei a trabalhar no exercício do meu mandato popular como presidente da Câmara Municipal de Loures, como sempre empenhado na aplicação dos princípios do socialismo democrático e do humanismo que coloca as pessoas, em especial os mais desprotegidos, as mulheres e as crianças, no centro da ação política e das políticas públicas com direitos e deveres iguais para todos e todas", acrescentou.
Ricardo Leão adiantou que irá focar-se na recandidatura à Câmara Municipal de Loures, nas eleições autárquicas que se realizam em 2025
A demissão surge depois de o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, considerar um "mau momento" as declarações que o autarca fez e das críticas feitas por três militantes socialistas, entre os quais António Costa, num artigo de opinião, publicado esta quarta-feira.
"Quando um dirigente socialista ofende gravemente os valores, a identidade e a cultura do PS, não há calculismo taticista que o possa desvalorizar. É esse o legado do Partido Socialista que sentimos agora o dever de recordar e defender. Em defesa da honra do PS!", sublinharam, num artigo publicado no jornal Público, o ex-primeiro-ministro António Costa, o deputado e membro da Comissão Política Concelhia de Lisboa, José Leitão, e o ex-eurodeputado Pedro Silva Pereira.
Pedro Nuno diz que não quis julgar publicamente Ricardo Leão mas não desvalorizou declarações
O secretário-geral do PS recusou esta quarta-feira ter desvalorizado as declarações do autarca socialista de Loures Ricardo Leão, mas apenas evitar fazer o seu "julgamento na praça pública" e resolver a questão internamente.
Em declarações aos jornalistas na sede nacional do PS, em Lisboa, Pedro Nuno Santos foi questionado sobre a demissão de Ricardo Leão da presidência da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) do PS, salientando que, quando comentou as declarações do autarca de Loures na segunda-feira, foi claro sobre "os valores e os princípios" do seu partido.
"Eu fui muito claro quando disse que todos os eleitos do PS estão comprometidos com a lei, com a Constituição, com o objetivo da reinserção social e com os princípios do humanismo, do respeito pelo outro e da empatia", disse, frisando que é assim "que têm de estar todos os eleitos" e rejeitando que tenha desvalorizado as declarações de Ricardo Leão.
"Não há, não houve nenhuma desvalorização. Eu não posso sequer aceitar essa ideia que tenha desvalorizado uma matéria que é central e quem me conhece, e acompanha a minha intervenção na vida política, sabe que, nestas matérias, eu não hesito um milímetro", referiu.
No entanto, Pedro Nuno Santos frisou que "um secretário-geral do PS não faz julgamentos na praça pública dos seus eleitos".
"Isso não é forma, não é pelo menos a minha forma de liderar o PS, de me relacionar com aqueles que são eleitos em nome do PS e, por isso, é possível nós conciliarmos uma posição clara, firme, sobre matérias que são identitárias do PS e, ao mesmo tempo, nós sabermos lidar com estas questões, mas lidar com elas internamente", disse.
Questionado se considera que Ricardo Leão tem condições para ser o candidato do PS à Câmara Municipal de Loures nas próximas autárquicas, em 2025, o líder do PS respondeu que não foi ele que o escolheu para candidato em 2021, numa alusão ao facto de ter sido o ex-primeiro-ministro António Costa.
"Ele foi eleito pela sua população e, obviamente, o julgamento político, a avaliação política do trabalho de Ricardo Leão deve ser feita pela população de Loures", salientou, antes de acrescentar que "Ricardo Leão é o atual presidente da Câmara Municipal de Loures e obviamente tem o direito de se poder apresentar perante a sua população e aí fazer-se a avaliação do seu trabalho enquanto autarca".
Interrogado se não se corre o risco de Ricardo Leão se apresentar como independente, caso lhe seja retirada a confiança política, Pedro Nuno Santos disse que não pretendia "elaborar sobre especulações".
"Nós temos um presidente de Câmara Municipal em Loures, como em muitos outros sítios no país, e os nossos presidentes de câmara em exercício, podendo ser reeleitos, serão recandidatos", afirmou.
BE questiona se PS vai apresentar em Loures candidato que "pensa como a extrema-direita
O BE questionou entretanto se o PS se vai apresentar em Loures um candidato que "pensa como a extrema-direita", referindo-se a Ricardo Leão, e defendeu que isso obrigará a esquerda a apresentar uma alternativa política.
Em declarações aos jornalistas na Assembleia da República, o líder parlamentar do BE considerou que o presidente da Câmara Municipal de Loures, o socialista Ricardo Leão, está "na vida pública de forma que é difícil distinguir-se de um autarca do Chega".
"Nós hoje soubemos que Ricardo Leão se demitiu da FAUL [Federação da Área Urbana de Lisboa], mas vimos também nesse mesmo comunicado que Ricardo Leão já se apresentou como recandidato do PS à Câmara Municipal de Loures e a pergunta que eu faço é quantos candidatos é que a extrema-direita vai ter ao município de Loures? Porque Ricardo Leão, como se provou, pensa como pensam os militantes da extrema-direita, por isso, vai o Partido Socialista apresentar um candidato de extrema-direita à autarquia?", questionou.
Fabian Figueiredo, que concorreu à autarquia de Loures contra Ricardo Leão nas eleições de 2021, defendeu que, "se assim for, a esquerda em Loures tem uma vez mais um desafio redobrado de apresentar uma alternativa política, porque o campo do humanismo, do socialismo, dos princípios republicanos, precisa ter uma candidatura forte".
O deputado considerou que, "em várias áreas particularmente importantes na gestão autárquica, Ricardo Leão comporta-se como um autarca de extrema-direita" e disse que o BE integra a "mesma corrente de indignação no campo da esquerda, onde também se encontram muitos militantes e dirigentes do PS, que acham inaceitável que Ricardo Leão tenha estes posicionamentos e apresente essas propostas".
Questionado se este episódio poderá afetar um eventual entendimento em Lisboa, o deputado afirmou que "o debate sobre Lisboa é sobre Lisboa e o debate sobre Loures é sobre Loures".