Paul Simon. O pequeno grande criador

África, Brasil, América Latina, folk e jazz - cabem nas suas canções. Chega hoje aos 75 anos, em plena forma e 13 discos editados. Um regresso à história do músico e compositor
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O "lado lunar" de Paul Frederic Simon, que hoje completa uns gloriosos 75 anos e se prepara para uma digressão europeia (começa em Amesterdão no próximo dia 17 e faz escala "aqui ao lado", em Madrid, a 18 de novembro, com bilhetes acima dos 50 euros), regista duas sombras maiores, se mantivermos a conversa no domínio profissional. A primeira pertence a Bob Dylan, que tomou conta da cena folk e dos palcos de Greenwich Village quando Paul estava ainda em fase de afirmação. Há memória de um concerto de Simon, com Garfunkel, num dos cenários improvisados em que Nova Iorque era fértil, em que a presença na plateia de um Dylan muito falador desencadeou uma raiva que demorou décadas a esbater. Resta ao autor de Late in the Evening uma consolação: com uma produção menos constante do que a do "rival", os seus discos venderam mais, desde os tempos do duo até aos nossos dias.

A segunda ganha, paradoxalmente, o rosto de Art Garfunkel. Durante muito tempo, as entrevistas a Paul incidiam sobretudo nos passos do duo, que, com tudo somado, não chega a 15 anos de atividade, já incluindo a fase Tom & Jerry, os nomes artísticos adotados pelos dois, subvalorizando uma cruzada solitária que, agora, chega aos 45 anos. Ainda por cima, parecia não haver respeito pela enorme contribuição de Simon, autor de quase todas as canções que imortalizaram a sociedade.

Para esconjurar de vez os "fantasmas", quase pode dizer-se que a vida pessoal de Simon também teve direito a assombrações próprias: um primeiro divórcio conturbado, de Peggy Harper; uma relação infernal, antes, durante e depois do casamento, com a atriz Carrie Fisher (a Princesa Leia, d"A Guerra das Estrelas), momento mais intenso do recurso a psicanalistas e psiquiatras por parte do cantor; um terceiro matrimónio, com a cantora Edie Brickell, que os mais chegados descrevem como uma "montanha-russa", o que dispensa mais explicações. Felizmente - para ele e para nós -, Simon sempre se mostrou capaz de excelentíssimos "exorcismos" através das canções, muitas vezes adotadas nas "terapias" de terceiros.

Com 13 discos de estúdio editados em nome próprio, Paul, do "alto" do seu metro e 57, nunca virou a cara a desafios: One Trick Pony (1980) contém as canções da banda sonora de um filme, em que foi o autor da história e o ator principal, depois de uma experiência muito aplaudida em Annie Hall, de Woody Allen, para muitos o seu "gémeo"... no cinema. Já Songs from the Capeman (1997) reúne os temas que cantou numa obra mais vasta, The Capeman, um espetáculo musical que criou para a Broadway e que a crítica resumiu, secamente, como um "West Side Story atrofiado". Simon terá perdido, na ocasião, cerca de um milhão de dólares.

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Onde Simon não se perde é na sua vocação de viageiro, não se fechando nas estéticas de rock, folk e jazz norte-americanos. Desde os primeiros discos a solo, sempre se mostrou empenhado em assimilar e reciclar influências das mais diversas origens - de resto, este costume já vem dos tempos de Simon & Garfunkel, como mostra El Condor Pasa, que foi buscar ao Peru e para a qual escreveu a letra em inglês.

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África, as Américas a sul daquela que o viu nascer, mais recentemente a Índia e a Espanha, integram a sua lista de "visitas" (os pormenores seguem perto daqui). Chega - e deveria sobrar... - para que Simon tenha sido considerado pela revista Rolling Stone o oitavo maior criador da música popular, desde sempre. Politicamente ativo - esteve, em julho, na convenção dos democratas que escolheu Hillary Clinton como candidata, cantando Bridge Over Troubled Water, não sendo difícil quem escolhe para "fazer a ponte" e a quem reserva o papel de "águas turbulentas" -, socialmente empenhado, pode estar a despedir-se, como vimos, dos palcos europeus. Mas hoje é só dia de festa, para mais um distinto representante da "classe de 1941", cujo currículo se alarga a Otis Redding, Richie Havens, Harry Nilsson, Tim Hardin (todos já desaparecidos), mas também David Crosby, Neil Diamond e Joan Baez. E, para fecharmos o círculo, também Art Garfunkel e... Bob Dylan, o tal que está em toda a parte.

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