O encontro de Portugal e Japão nos azulejos Haru Ishii

Museu Nacional do Azulejo mostra as obras de Haru Ishii nas quais a artista nipónica recria o encontro entre os dois países.
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O interesse pelos azulejos portugueses já existia - descobertos por acaso numa revista de viagens - colando-se à sua vontade de interligar arquitetura e as obras de cerâmica que produzia. E um outro acaso acabou por trazer Haru Ishii a Portugal, com passagem por um resort turístico na ilha de Okinawa. Foi aí que conheceu o embaixador português João Salgueiro, encontro que acabou por a ajudar a concretizar o desejo de vir aprender a arte do azulejo português. "Completamente diferente dos azulejos árabes", faz questão de sublinhar, com ajuda da intérprete Maho Kinoshita. Das Sombras de Quioto à Luz de Lisboa, que ocupa as duas salas de exposições temporárias do Museu Nacional do Azulejo, em Lisboa, o claustrim e o coro alto da Igreja da Madre de Deus, é o resultado dessa aprendizagem.

Haru Ishii recorda ao DN essa primeira experiência em Palmela, onde há 21 anos vê os fornos do Espaço Fortuna fixarem a forma final das suas criações. "Foi totalmente diferente do que tinha pensado." "Apesar da ajuda do Sr. Sebastião [na altura proprietário do Espaço], fazia exatamente o mesmo que os outros, mas as peças saiam sempre disformes. Completamente diferentes do que tinha pensado."

Juntar os pigmentos de tinta que usava com a técnica do vidrado do azulejo português foi "uma luta". E depois de muitas experiências frustradas, o encontro entre Portugal e Japão voltou a acontecer. Quase 500 anos depois, é esse acontecimento histórico que Haru Ishii evoca na exposição que apresenta no museu lisboeta, ao qual chama "a catedral do azulejo", deixando pressentir a pressão que sentiu na conceção desta mostra, apesar de a proposta ter partido de si, em 2015. "Primeiro escrevi um texto, vim ao museu muitas vezes, vi muitas exposições neste espaço. E às vezes ficava preocupada a pensar se [a exposição] iria resultar", diz com uma simplicidade desarmante.

Na sala do rés-do-chão, aponta para as mais de 600 linhas verde-água expostas nas paredes laterais: "Nesta sala estão as obras mais ligadas ao Japão. Primeiro tive a ideia destas linhas, que representam a chuva presente na natureza. Depois surgiu este tatami", diz apontando para a peça ao centro da sala que recria em azulejo o típico tapete japonês, preparado para a cerimónia do chá. Para além da peça que representa a água, elemento essencial nas salas das casas japonesas, a parede do fundo parece transformada num fundo de mar. Repleto de peixes. É aí que se encontram 285 peixes, colados em pedaços de madeira revestidos com papel japonês.

Na sala do primeiro andar, a homenagem da artista ao encontro entre Portugal e Japão. Do lado direito, as ondas sulcadas pelos portugueses na viagem que os levou até ao outro lado do mundo, e do lado esquerdo os pensamentos dos portugueses durante a difícil e longa viagem de ida. Já os pensamentos enriquecidos pelos conhecimentos adquiridos na viagem surgem refletidos nos 120 azulejos que ocupam a parede do fundo. A viagem continua no claustrim, onde cubos revestidos a azulejos, imagem de marca do seu trabalho, são uma alusão à carga que os portugueses traziam, com os sentimentos a derramarem-se pelo chão.

No coro alto da Igreja Madre de Deus, a última peça: uma linha que parece flutuar em direção ao altar. "Era uma ideia antiga", revela. "Queria mostrar a coragem que é precisa para ter esta vida entre Portugal e o Japão". Já lá vão 21 anos e, para Haru, esta exposição é o seu "cabo da Boa Esperança".

Das Sombras de Quioto à Luz de Lisboa

Museu Nacional do Azulejo, Lisboa

Até 31 de dezembroDe terça a domingo, das 10.00 às 18.00

Bilhete: 5 euro (entrada no Museu)

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