"Já me habituei à ideia de não ganhar prémios. Tenho o mais importante, o público"
Dia 5 de março de 1988. António Antunes era um entre oito cantores que subiam ao palco do Casino Peninsular da Figueira da Foz para participar no Prémio Nacional de Música, de onde sairia um tema para participar no Festival da Canção - que se juntaria às canções dos compositores convidados da RTP. Uma Noite ao Teu Lado não vingou - seria Dora (Déjà Vu) a avançar. Trinta anos depois dessa estreia em palcos portugueses, Tony Carreira esgota salas - aqui como em França, para onde foi viver com os pais, emigrantes, quando tinha 11 anos. Longe dos tempos em que o pai julgava que estava a criar um mecânico, Tony conta como chegou aqui, fala sobre a família e o preconceito que continua a haver em relação a si. E sobre o caso de plágio que está a correr na justiça portuguesa.
Está a celebrar 30 anos de carreira. De Pampilhosa da Serra até aqui vão muitas vidas.
Sabes que eu partilho aquela máxima do Herman José de que uma vida não chega. Quando vivemos a vida intensamente, o tempo é sempre pouco, mas também quando a vida é vivida dessa forma numa vida só cabem muitas. E eu acho que já vivi duas ou três. Isso é muito bom.
É muito diferente hoje do rapaz de 7 anos que ficou sozinho com os avós quando os pais emigraram e depois se lhes juntou em Paris, aos 11, sem sequer falar francês?
Claro que sim. Acredito que nos transformamos nas pessoas que acabamos por ser muito influenciados pelo meio e pelas coisas que vivemos. Eu claramente sou hoje uma pessoa diferente da que seria se tivesse tido outro percurso. Mas o que acho importante e o que mantenho dessa altura são os meus valores.
Ainda há alguma coisa de António Antunes.
Sim, os valores. Ajudar o próximo, a humildade, o respeito, a gratidão. E provavelmente estão hoje muito mais apurados.
Foram tempos muito difíceis, esses primeiros anos como emigrante?
Foram, mas isso é normal. E eu era feliz, sempre fui um rapaz muito feliz. A dificuldade do momento existe, mas tudo passa quando somos miúdos. E eu sou uma pessoa positiva, sempre fui.
Depois veio o trabalho na fábrica de enchidos, o casamento. O seu pai queria que fosse mecânico. Mas nessa altura teve a primeira banda, com um irmão e os primos, os Irmãos 5.
Os Beatles lá do sítio [risos]. Essa foi uma fase fantástica, porque foi numa altura em que queríamos conquistar tudo, nessa idade achamos que tudo é possível. A força, a vontade e a energia são de tal forma grandes que acreditamos. Foi uma das fases mais bonitas da minha vida, por mais dificuldades que houvesse, e recordo-as... não com saudade, porque não sou muito assim; sei que não se pode voltar atrás, por isso não vale a pena estar preso a isso.
Mais alguém da banda teve uma carreira na música?
O meu irmão, que ainda hoje trabalha comigo. E também com outros artistas, como agente de concertos.
Em que fase é que o seu pai se conciliou com o facto de que iria ser cantor - e não mecânico, como ele queria?
Acho que o meu pai ainda hoje está para perceber. Ele pensa qualquer coisa como: pronto, ele canta... Ainda vive isso dessa maneira. Já percebeu que é uma carreira, mas é outra geração, é outro género, claramente há coisas desta profissão que ele não percebe. Mas acho que o momento mais feliz para ele, aquele em que deixou de se preocupar, foi quando percebeu que eu até era capaz de pagar as contas com este trabalho. E acho que já o conseguia fazer há muito tempo quando ele percebeu mesmo que eu não ia morrer à fome.
Participou numa pré-eliminatória do Festival da Canção em 1988, na Figueira da Foz (até houve uma menção no DN).
E depois tentei de novo em 1990. Repeti a experiência.
Reviu recentemente a sua atuação nesse festival?
Essa atuação estava esquecida e claro que com o sucesso e uma coisa maravilhosa que se chama internet... Eu cá no meu íntimo até pedia que nunca descobrissem aquilo. E cheguei a convencer-me de que não seria descoberto. Mas depois também me ri daquilo. E ao mesmo tempo vejo-o com muito orgulho. Até porque aquela foi uma semana muito marcante na minha vida, entre os ensaios e a final, entre tudo o que ia acontecendo, os sonhos, a possibilidade de ganhar.
Estava a viver em França ainda, nessa altura. O festival era uma porta de regresso possível?
Estava em França, sim, e era uma porta que se abria ali. E as emoções foram todas positivas até ao momento do veredicto, em que percebi que não tinha passado. As emoções são uma coisa importante e eu vivi de tudo naquela semana. Hoje, onde estou, recordo aquilo com muita ternura. Não sei como recordaria se o meu percurso tivesse sido outro. Podia ter sido o momento mais alto da minha carreira. E, se ainda hoje estivesse na fábrica de enchidos, podia dizer à malta: vejam, eu fui aquilo! É muito provável que acontecesse.
Gostava de participar no Festival da Canção hoje?
Acho que sim. Nestas semanas foi ótimo ver como há pessoas novas a acreditar num festival que é da minha geração - não só, mas sobretudo - e que voltou a ganhar uma dinâmica em Portugal que já não tinha há muitos anos. E isso é graças ao Salvador Sobral, que irá ficar para sempre na história como o primeiro português a vencer o Festival. Não sei como ele vê isso, provavelmente não sente da mesma maneira que eu, mas eu fico muito feliz que tenham sido ele e a irmã a trazer essa vitória a Portugal.
Gosta do tema Amar pelos Dois?
Gosto, sim! É uma grande canção e ele é um grande intérprete. E, do que vi nestas eliminatórias - agora as opiniões são muitas, e ainda bem, porque o festival está em alta -, fico muito feliz por haver ali putos novos de qualidade que se calhar não iriam participar se não tivesse acontecido o que aconteceu no ano passado.
Estava disposto a candidatar-se agora, ou aceitaria se fosse convidado?
Não sei... O que eu gostava era de escrever uma canção para participar e escolher uma cantora para interpretar o tema. E até tenho uma pessoa em mente, que trabalha comigo há muitos anos.
Quem?
Não posso dizer. E nem sequer lhe falei nisso nunca, mas, se ela aceitasse, era capaz de fazer isso. Porque não? Era um desafio bonito em que valia a pena apostar. E também era uma montra fantástica para o mundo.
Acha que seria encarado com preconceito, se isso acontecesse?
Tenho a certeza.
Ainda há muito preconceito em relação a si?
Há muito. Mas não é por aí que desanimo. A música já me deu tanto, como é que posso desanimar?
Mas deve custar-lhe que o governo francês o condecore como personalidade nas Artes e de Portugal não haja sequer abertura para a embaixada ser palco dessa homenagem.
Sabes, eu nessa altura tive uma conversa com o Rudy Pérez e ele respondeu-me: "Tu também queres tudo! Queres que o público goste de ti e os críticos também?! Não podes querer tudo!" E temos de nos rir... É claro que custa, fico magoado, mas o que é que eu posso fazer? É continuar com aquilo que faço.
E também recebe muita atenção dos fãs.
Recebo, sim, e isso é o mais importante. Também teria gostado, nestes anos todos, de ganhar um ou outro prémio - não posso mentir, gostava -, mas vivo bem com isso, já me habituei à ideia. E tenho o mais importante. Entre ser distinguido com prémios ou ter um público, prefiro o público.
E porque é que acha que existe esse preconceito? Já deve ter-se questionado.
Existe porque... eu ouvi dizer - não sei se é verdade - que o disco do Rui Veloso Mingos & os Samurais foi totalmente arrasado pela crítica quando saiu. E depois chegou a seis platinas e ainda hoje é uma referência na carreira dele, foi precisamente o disco dele que mais vendeu.
Os críticos estão demasiado afastados do que as pessoas ouvem?
Há um músico francês que eu oiço muito, que é o Jean-Jacques Goldman, que escreveu para a Céline Dion e outros assim pequeninos... nos primeiros dez anos de carreira ele foi arrasado pelos críticos. Dez anos depois, lançou um best of e fez uma coisa que eu acho maravilhosa: pegou em todos os artigos de quem escrevia coisas do tipo "este só dura seis meses" ou "este tem uma voz que parece uma cabra aos saltos" e assim, e fez uma capa para o disco do best of.
O Tony tem uma biografia autorizada que é um best-seller, consegue esgotar noites seguidas no Coliseu, no Olympia de Paris, na Altice Arena. Tem 20 álbuns, 60 platinas e mais de quatro milhões de discos vendidos. Como é que se constrói uma carreira assim?
Com alguma sorte e muito trabalho. Acredito que há uma parte de sorte, mas sem dúvida também é preciso muito trabalho e respeito por aquilo que se faz.
Tem muitas preocupações técnicas, prepara tudo com cuidado?
Eu acho que qualquer género de música, se for bem feita, merece respeito. E na minha cabeça não entra essa coisa de música comercial. Se o público adere é porque há ali qualquer coisa.
Qual é o seu género preferido de música?
Tudo. Adoro AC/DC, Bryan Adams, Luís Miguel, Roberto Carlos. E acho que ouvir só um género pode tornar-se chato, aborrecido e triste. É muito limitativo. Eu gosto de tudo mesmo, depende dos dias.
É um perfeccionista?
Sou, porque acho que a vida me deu uma coisa que eu tenho de respeitar, que é a possibilidade de escolher. Quando compram os meus discos e vão aos meus concertos, dão-me a possibilidade de tentar fazer bem ou assim-assim. Na vida não há heróis, se não há opção faz-se com o que temos, mas quando há... E eu tenho essa opção desde o primeiro disco de sucesso.
Esse primeiro disco de sucesso vem precisamente de uma teima, que foi escolher trabalhar com o Ricardo Landum.
Sim, eu rapidamente achei que a pessoa com quem queria trabalhar era ele e até hoje trabalhamos juntos, ainda ontem estivemos às voltas com uma canção a pensar que será a melhor que fizemos - e ele está como todos sabem de saúde [o compositor sofre de esclerose múltipla] mas continua a acreditar e a ter fé que vamos fazer do próximo o melhor disco de sempre.
O carinho que dá aos fãs é também fundamental. Fala com eles fora dos concertos?
Onde me encontrar com uma fã, falo com ela, sim. A minha ligação é através dos concertos, sessões de autógrafos, mas cruzo-me fora disso com imensas pessoas na rua, desde as que compram os meus discos às que me dizem que não gostam das minhas canções mas acham que eu sou um tipo fantástico.
O seu público ao vivo - e imagino que também dos discos, porque as pessoas cantam as letras nos concertos - tem mudado. No Casino Estoril, há um ano, tinha na plateia Lili Caneças, Bibá Pitta, Assunção Cristas, Miguel Relvas, o ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, entre outras caras bem conhecidas. Acha que estavam ali só porque eram convidadas?
Não, acho que já há uns tempos que o meu público vem de todas as classes sociais. Ali, realmente aconteceu o que não acontece nos concertos de estrada, e é uma coisa que eu já vivi nos últimos dois/três anos através dos concertos nos casinos e agora nestes dez acústicos que temos dado - e que têm corrido muitíssimo bem; foi uma estreia e tem sido fantástico. Mas claro que achei imensa graça àquela situação, a ter aquelas pessoas ao lado das minhas fãs que vinham do país inteiro para o concerto. Mas faz sentido, a vida é isto: não tem lógica haver uma sala para o Alfredo e outra para o Manel. E eu que ia para esse concerto com algumas reticências...
Ia?
Ia, porque não sabia que ambiente iria encontrar, era a primeira vez que cantava naquele espaço. Mas achei fantástico e teve muita piada. Não mudou em nada a minha forma de estar em palco e achei imensa piada à situação.
A sua vida pessoal foi afetada pela carreira? Com os miúdos pequenos...
Sim, sem sombra de dúvida que foi. Daí a decisão de termos vindo para Portugal muito mais cedo do que pensámos. Além disso, eu optei por ser figura pública, os meus filhos também, logo não havia grande espaço para tentar que a comunicação social não invadisse as nossas vidas. E houve momentos em que foram escritas coisas que nos feriram a todos, por não serem verdade. Há sempre aquele dilema: respondo e crio uma bola de neve ou deixo passar? E eu sempre preferi deixar, mas depois passa uma semana e lá vem outra história. Enfim, mas faz parte, temos de engolir e seguir em frente. Mas há coisas que se escreveram sobre mim e a minha família que hoje estão no conhecimento global como sendo verdades e não são.
Ter dinheiro ajuda ou prejudica?
Eu não conheço ninguém que diga que não gosta de dinheiro. Mas esse não pode ser o motor de coisa nenhuma, porque aí já vamos por um campo que eu condeno. Não faz sentido viver só para o dinheiro. Agora, é claro que o dinheiro é importante e faz parte da vida, a partir do momento em que seja gerido para ajudar na nossa vida e nas de quem quisermos ajudar. Para termos uma vida melhor. Tenho pena das pessoas que veem nele o alvo principal - e conheço algumas assim.
Não o Cristiano Ronaldo, de cuja família é amigo.
Não, não, não. O Cristiano tem uma relação maravilhosa com o dinheiro. Eu gosto de carros, por isso gostava de ter os carros que ele tem. Há quem condene, mas se ele tem dinheiro para comprar o Ferrari de que gosta, porque é que há de andar de Fiat Punto?! Ainda assim, o que acho maravilhoso na relação dele com o dinheiro não passa pelos carros mas pela forma como trata a família. Não conheço muitos a ter essa atitude com a família, é supergeneroso, ajuda causas que ninguém sabe.
O Tony também ajuda?
Ajudo instituições, amigos, os meus filhos, mas nem digo. Porque o lado bom do dinheiro é esse, é poder-se ajudar quem precisa.
Passando ao tema que tem sido mais quente nos últimos tempos, as acusações de plágio. Voltou a ser adiada a audição, houve acordo, desfez-se o acordo. Isto tudo vem de onde?
Eu já nem sei como tratar esse assunto. Basta pesquisar na internet para perceber que o caso dos plágios aconteceu em 2008 e em 2010 ficou tudo resolvido. Tudo.
Tudo?
Tudo.
E não rejeitou que houvesse plágio?
Nunca. Eu assumi, isso resolveu-se, pagou-se a quem de direito e inclusivamente hoje trabalho com esses autores. Um deles, o mais conhecido, vou estar com ele em abril 15 dias em estúdio, que é o Rudy Pérez. Entretanto, há um senhor - que de senhor não tem quase nada - que aparece por uma questão de uns covers que ele fez, muito mal feitos, de uns temas meus, a induzir o público em erro porque o meu nome aparecia de um tamanho que parecia a Torre Eiffel e o do cantor que interpretava os covers quase nem aparecia. Esses covers foram proibidos pela minha editora e ele três vezes foi a tribunal comigo e três vezes perdeu. Por uma questão de vingança - aquela empresa tem um nome muito pomposo, mas não tem nada que ver com proteção de conteúdos editoriais de música, aquilo é uma editora [a Companhia Nacional de Música], que pertence a alguém, e esse alguém, por uma questão de vingança, por não aceitar não poder comercializar aquele cover, decidiu pôr aqui canções que eu nunca assinei. O meu nome não está nessas canções, é só ir ver.
Não está?
Não está. E nas que estava já foi resolvido. Não há aqui questões de plágios nenhumas.
Mas então qual é a base disto?
A base é que eu não lhe vou pagar um euro do que ele quer. Isso está mais do que claro.
Se não há nada, porque é que o Ministério Público dá seguimento ao processo?
Repara, o acordo é feito em 2009-2010. Entre esse ano e o ano em que a canção foi gravada, a pessoa dessa editora considera que há crime. Mas se eu lhe tivesse dado os 30 mil euros que ele queria, ele já considerava que estava tudo sanado. Basta refletir sobre isso.
Nessa altura em que isso aconteceu - são músicas antigas -, teve consciência do que estava a fazer?
Eu realmente sou um homem com muita sorte. Uma coisa pega-se em mim e dura dez anos. Um plágio dos U2, da Madonna, fala-se e a notícia acaba...
Ainda agora no Festival também houve acusações de plágio...
Há cantores nacionais que falam de mim e se calhar deviam olhar bem para a obra deles. Mas não vou entrar por aí.
Já foi plagiado?
Já.
E como reagiu?
Não liguei. Não é assunto sequer.
Os seus filhos, em géneros totalmente diferentes, também escolheram uma carreira na música. Gostava que eles tivessem escolhido outra vida?
Pelo menos um que fosse médico ou enfermeiro, para tratar de um futuro idoso... [risos] Não, eu só gostava que eles não tivessem esta profissão para não serem comparados com o pai. Mas acho que eles já ultrapassaram essa fase. Acima de tudo, queria era que fossem felizes, e eles são equilibrados, são pessoas maravilhosas e são felizes no que fazem.
E são bons profissionais?
São, são!
E tem noção de os ter ajudado?
Não sei se os ajudei ou se desajudei. Da rotulação que eu sofro, eles também sofreram. Acho que é um pouco dos dois. No primeiro disco que eles gravaram, já toda a gente sabia quem eles eram, mas também é verdade que tiveram de trabalhar em dobro e mostrar duas vezes mais porque iam ser julgados de outra maneira. Mas tudo isso é normal. Portanto, acho que onde eles estão merecem estar. Porque há uma janela que se abre mais rápido, mas de forma muito mais dura. Eu sou pai, sou suspeito, mas acho que o Mickael e o David merecem estar onde estão.
E a sua filha Sara vai continuar na faculdade ou acha que também ela vai acabar por se virar para a música?
Eu acho que vamos acabar por fazer um rancho folclórico.
Já comprou o acordeão?
Já. Vamos ser o novo conjunto de pai e filhos [risos].
E com a sua ex-mulher a desempenhar aqui também um papel?
Sem dúvida, um papel importantíssimo, ela é a melhor agente do mundo. Sem a Fernanda, sem o talento dela, no que me diz respeito, não teria feito todo o trabalho que fiz.
Tem ideia de quanto dinheiro faz em merchandising?
Não faço ideia.
Nem da percentagem que vem dali?
O merchandising não é relevante em Portugal.
Então porque é que tem alargado, lançou perfumes...
Ainda é cedo para ter noção do resultado do perfume, porque foi lançado há pouco tempo. Mas no merchandising não se faz dinheiro, nem um artista aqui em Portugal terá enriquecido com isso, não acredito.
Onde é que se faz dinheiro?
Nos concertos. Aqui como na China.
E em publicidade?
Também não. E não faço - nem gostava de fazer.
Associou-se ao Continente.
Mas é totalmente diferente, porque isso permitiu-me fazer projetos fantásticos. No top 10 dos concertos mais bonitos que eu dei, há uma percentagem que foi através do Continente. Não é propriamente ir para a televisão vender iogurtes.
Isso não gostava de fazer?
Se fosse queijos ou presunto... Não, foi diferente porque a música está sempre presente. E fizemos projetos maravilhosos, como aquele com a Av. Liberdade, que teve 500 ou 600 mil pessoas. Dou graças à vida por ter-me cruzado com aquela instituição, à qual ainda estou ligado hoje.
Ter as suas músicas à venda no Spotify não é um projeto?
Não faço ideia do que é que estás a falar [risos].
Continua a preferir os discos?
Quando assinei com a Sony, com quem estou há um ano, a minha abordagem foi: eu não quero saber de percentagens, quero é trabalhar com vocês. Porque já percebi que é impossível ganhar dinheiro com os discos, já só rezo para não perder porque gasto muito nas produções. Não me parece, mas não sou o artista certo para falar sobre isso - que as fontes de rendimento para o mercado português venham pelo Spotify ou afins. Mesmo assim, acho que ainda não há nada à altura de substituir o disco físico. Eu ainda vendo muitos, mas tenho a noção de que ano após ano tenho uma quebra de 20% a 25%. Chegará o tempo em que só hei de vender um disco. Nessa altura... Mas não tenho noção dos lucros, não sou eu que trato disso.
Tem noção de quanto ganha e gasta num concerto?
Mais do que gasto do que de quanto ganho, porque está sempre toda a gente a alertar-me no escritório, a chatear--me a cabeça para controlar os gastos quando programo as produções. Mas confio nas pessoas com quem trabalho e quando tenho um budget mais ou menos aceite por todos parto do pressuposto de que se ganha dinheiro. Só não sei valores.
Sabe quanto gasta por concerto?
Isso sei, mais ou menos. Na Altice Arena, por exemplo, foram cerca de 300 mil euros.
Quantas pessoas tem a trabalhar num concerto desses?
O máximo, entre filmagens, técnicos, músicos, foram à volta de 250 pessoas.
E gosta mais de tocar num Coliseu, na Altice Arena, nos concertos de verão?
Gosto de tudo. Um dos sítios onde tive mais prazer a cantar em Portugal foi provavelmente a Altice Arena. E esta tournée acústica por teatros que estamos a fazer tem-me dado muito gozo.
Agora está em tournée internacional.
Sim, já demos metade dos 20 concertos que temos agendados em França e agora em maio prosseguimos.
Como está a correr? Tem noção de se no público tem mais portugueses ou estrangeiros?
Desde que eu gravo com a Sony e vou a mais programas de televisão como um artista do mercado francês, a minha percentagem de público francês subiu muito. Neste momento diria que as salas têm 70% portugueses e 30% franceses. E, desde que gravo para lá, quando há aqui concertos carismáticos há muita gente que vem de lá para assistir.
Onde é que ainda gostava de cantar?
Em tantos sítios, há tantas salas tão bonitas, tinha de viver mais 200 anos.
Mas um especial.
No Albert Hall em Londres, onde nunca cantei.
É religioso? Porque é que se benze antes dos concertos?
Tenho a minha fé, os meus hábitos, mas não sou muito religioso. Sou por educação crente, um católico não praticante. A minha maior fé, que está muito no meu percurso, é Fátima.
Já lá foi a pé?
Tenho uma promessa para ir, já comprei os ténis e irei em breve.
E que tal é ser avô?
Isso é um problema... está a ser fantástico, porque ela é linda e ri-se muito, sempre que estou com ela é ótimo, ela é muito alegre.
Tem uma disponibilidade diferente da que tinha para os seus filhos?
Não, estou sempre muito ocupado, tenho muito trabalho. Mas uma menina e assim pequenina, ficamos rendidos.
O que é que ainda gostava de fazer ou de ver acontecer?
A vida tem-me dado tanto, vou trabalhando para que as coisas aconteçam mas não tenho assim grandes objetivos. Aliás, nunca fiz projetos a longo prazo.
Mas gostava de ser reconhecido no seu país?
E sou.
Oficialmente?
Sou por quem é importante sê-lo. Sobre isso não tenho dúvidas. Só tenho bem a dizer sobre Portugal, é um país maravilhoso, que amo de verdade e quanto mais viajo mais amo Portugal. Os portugueses são maravilhosos comigo, mesmo os que não gostam das minhas canções, e sinto que faço parte da família de muita gente. Esse reconhecimento já o tenho há muito tempo. O dos governos e dos prémios, houve uma altura em que senti que era um bocadinho injusto não ter, mas já me passou, já lá vão muitos anos. Estou completamente pacificado com isso.